Bernardo Jablonski
Sei que, em alguns momentos, as palavras são inúteis. E são inúteis porque incapazes de traduzir determinados sentimentos. Como este, de infinita dor, que toma conta não apenas de mim, mas de incontáveis pessoas que tiveram o privilégio de conviver com um homem que parece ter nascido com a expressa finalidade de gerar felicidade.
Nunca conheci alguém tão agregador, incapaz de qualquer indelicadeza, sempre tão bem humorado, com infinita capacidade de escuta, despido de qualquer arrogância, parceiro em todos os momentos.
E que lutou, durante 14 anos, contra um famigerado câncer, sempre acreditando na vida, sempre exibindo seu delicioso humor. Humor que desfrutei ao longo dos últimos 40 anos.
Mas agora ele se foi.
Agora ele já não sofre mais.
Agora ele descansa.
Eu - e certamente centenas de pessoas - estou me sentindo completamente órfão. Como administrar, meu Deus, essa perda irreparável? Como lidar com a inexorável certeza de que nunca mais nos falaremos, nos encontraremos, não jantaremos juntos, não discutiremos projetos?
Sempre que vivi momentos difíceis - e foram tantos!? - e recorri ao Bernardo, após me ouvir com sua infinita paciência e bondade, e me brindar com esclarecimentos que me aliviavam, ele sempre terminava dizendo: "Lionel...vida que segue!"
Mas agora...como assim, vida que segue?
Como seguir sem você, meu amigo e parceiro desde sempre?
Parte de suas cinzas será depositada numa jaboticabeira que existe bem na entrada do Tablado. Será um belo consolo vê-la florescer e dar frutos. E contemplá-la certamente nos servirá de amparo e nos dará ânimo para enfrentar eventuais momentos difíceis que surjam em nossas vidas.
Ontem o Tablado completou 60 anos.
Ontem morreu Bernardo Jablonski.
Certamente não foi mera coincidência...
Não sei o que existe - se é que existe - depois da morte.
Mas caso exista algo, uma outra dimensão, seja o que for, que este lugar seja encantado, digno de alguém que, ao longo de toda a sua vida, só gerou felicidade e encantamento.
Todos os beijos do mundo,
amigo tão querido!
Lionel Fischer (29/11/2011)
sábado, 29 de outubro de 2011
sexta-feira, 14 de outubro de 2011
Teatro/CRÍTICA
"Palácio do fim"
.......................................
Comoção no Poeira
Lionel Fischer
Em uma espécie de tribunal, onde a platéia é colocada, de certa maneira, no papel de júri, três personagens se confessam. O tema é o mesmo: o que fizeram (ou deixaram de fazer) durante a Guerra do Golfo, na qual os Estados Unidos e seus aliados invadiram o Iraque para destituir o ditador Saddan Hussein, teoricamente uma ameça para a paz mundial - na realidade, como todos sabemos, a posse dos poços de petróleo era o grande alvo.
Em cena, três personagens. O cientista britânico especialista em armas químicas, que optou pelo silêncio. A sargento americana que chocou o mundo torturando prisioneiros e foi fotografada a eles impondo abjetas humilhações. Uma mulher árabe, barbaramente torturada e que perde parte de sua família.
O primeiro relata o longo caminho que o levou da omissão a uma corajosa tentativa de redenção. A segunda justifica as inomináveis ações que perpetrou. A terceira faz comovente, lúcida e dilacerante reflexão sobre o regime de Hussein e a atuação deplorável dos aliados após a vitória. Eis, em resumo, o enredo de "Palácio do fim" (Teatro Poeira), da premiada dramaturga canadense Judith Thompson. Com direção assinada por José Wilker, a montagem tem elenco formado por Antonio Petrin, Camila Morgado e Vera Holtz.
Estruturada na forma de monólogos, assim excluindo qualquer contracena entre os personagens, "Palácio do fim" examina com implacável lucidez um contexto que vai muito além das individualidades retratadas. O cientista se cala por medo e conveniência, pois tornar públicas as reais motivações da guerra equivaleria a destruir a imagem de zeladores da paz mundial dos aliados. A sargento, sem dúvida portadora de gravíssima psicopatia, pode ser encarada como símbolo de uma nação (Estados Unidos) que, por julgar-se superior a todas as demais, não hesita em exercer seu abjeto imperialismo. Com relação à mulher árabe, esta nos faculta, além das reflexões já mencionadas, o acesso aos horrores da tortura, que tinham como cenário principal o famigerado palácio que dá título à obra.
Como já deve ter ficado implícito, estamos diante de uma obra poderosa, que nos gera um sem número de sentimentos, dentre eles a indignação, o asco e a solidariedade. E que nos obriga a refletir não apenas sobre os fatos retratados, mas sobretudo sobre nossa própria postura diante da realidade que nos cerca.
Nosso país está mergulhado na corrupção, que se alastra como uma peste; a fome e o desemprego imperam; a saúde pública e a educação são caóticas; as milícias constituem um fortíssimo poder paralelo. E o que fazemos? Que atitudes tomamos? Em geral, prevalece nossa indiferença e conferimos ao nosso silêncio conotações de sabedoria. Sabemos que estamos com lama até o pescoço, mas acreditamos estar a salvo porque ainda conseguimos (exceção feita aos menos favorecidos) manter limpas as unhas nas pontas dos dedos. Mas, até quando?
Com relação à montagem, José Wilker criou uma encenação que considero magistral. E não porque tenha criado marcas espetaculares, mas justamente por ter renunciado a elas e investido todas as suas fichas no trabalho dos atores. Em meio a uma atmosfera sombria e claustrofóbica, tudo fica à mercê das palavras e do trabalho dos atores. E sendo Wilker um ator de exceção, nada mais natural que tenha conseguido extrair atuações maravilhosas do elenco.
Antonio Petrin está irretocável na pele do angustiado cientista. E se de início nos incomoda a deplorável omissão do personagem, mais adiante ele nos comove com sua determinada tentativa de redenção. Vivendo a sargento, Camila Morgado nos gera inenarrável repulsa, já que esta resulta não da mera constatação da psicopatia do personagem, como já foi dito, mas sobretudo porque a atriz consegue transcender seus limites e convertê-lo num retrato da barbárie que está na essência da política externa dos EUA que, guardadas as devidas proporções, em muito se assemelha à da Alemanha de Hitler - ou será que os Estados Unidos também não se consideram uma raça superior e portanto no direito de impor seu jugo a quem lhe convier?
Finalmente, chegamos a Vera Holtz. Mencionar aqui seus vastíssimos recursos expressivos constituiria perda de tempo, já que todos sabemos ser ela uma das maiores atrizes deste país. Mas no presente caso, Vera Holtz consegue ir além de todas as expectativas. Sua performance é tão visceral e contundente que se inscreve, em minha opinião, dentre aquelas que só acontecem uma vez em cada década. E tal avaliação poderia ser fruto, apenas, do texto final que profere, quando narra as torturas de que foi vítima, assim como seus filhos. O exasperado e circular gesto que executa com a mão direita, reforçando drasticamente o impacto das palavras de que se vale para descrever a morte de seu filho de oito anos, muito provavelmente causaram fortíssima comoção em toda a platéia, que certamente jamais esquecerá este momento sublime.
No tocante à equipe técnica, considero da mais alta expressividade os trabalhos de todos os profissionais envolvidos nesta mais do que oportuna e imperdível montagem, que o público carioca haverá de prestigiar sem reservas - João Gabriel Carneiro (tradução), Marcos Flaksman (cenografia), Beth Filipecki e Renaldo Machado (figurinos), Maneco Quinderé (iluminação) e Marcelo Alonso Neves (criação musical).
PALÁCIO DO FIM - Texto de Judith Thompson. Direção de José Wilker. Com Antonio Petrin, Camila Morgado e Vera Holtz. Teatro Poeira. Quinta a sábado, 21h. Domingo, 20h.
"Palácio do fim"
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Comoção no Poeira
Lionel Fischer
Em uma espécie de tribunal, onde a platéia é colocada, de certa maneira, no papel de júri, três personagens se confessam. O tema é o mesmo: o que fizeram (ou deixaram de fazer) durante a Guerra do Golfo, na qual os Estados Unidos e seus aliados invadiram o Iraque para destituir o ditador Saddan Hussein, teoricamente uma ameça para a paz mundial - na realidade, como todos sabemos, a posse dos poços de petróleo era o grande alvo.
Em cena, três personagens. O cientista britânico especialista em armas químicas, que optou pelo silêncio. A sargento americana que chocou o mundo torturando prisioneiros e foi fotografada a eles impondo abjetas humilhações. Uma mulher árabe, barbaramente torturada e que perde parte de sua família.
O primeiro relata o longo caminho que o levou da omissão a uma corajosa tentativa de redenção. A segunda justifica as inomináveis ações que perpetrou. A terceira faz comovente, lúcida e dilacerante reflexão sobre o regime de Hussein e a atuação deplorável dos aliados após a vitória. Eis, em resumo, o enredo de "Palácio do fim" (Teatro Poeira), da premiada dramaturga canadense Judith Thompson. Com direção assinada por José Wilker, a montagem tem elenco formado por Antonio Petrin, Camila Morgado e Vera Holtz.
Estruturada na forma de monólogos, assim excluindo qualquer contracena entre os personagens, "Palácio do fim" examina com implacável lucidez um contexto que vai muito além das individualidades retratadas. O cientista se cala por medo e conveniência, pois tornar públicas as reais motivações da guerra equivaleria a destruir a imagem de zeladores da paz mundial dos aliados. A sargento, sem dúvida portadora de gravíssima psicopatia, pode ser encarada como símbolo de uma nação (Estados Unidos) que, por julgar-se superior a todas as demais, não hesita em exercer seu abjeto imperialismo. Com relação à mulher árabe, esta nos faculta, além das reflexões já mencionadas, o acesso aos horrores da tortura, que tinham como cenário principal o famigerado palácio que dá título à obra.
Como já deve ter ficado implícito, estamos diante de uma obra poderosa, que nos gera um sem número de sentimentos, dentre eles a indignação, o asco e a solidariedade. E que nos obriga a refletir não apenas sobre os fatos retratados, mas sobretudo sobre nossa própria postura diante da realidade que nos cerca.
Nosso país está mergulhado na corrupção, que se alastra como uma peste; a fome e o desemprego imperam; a saúde pública e a educação são caóticas; as milícias constituem um fortíssimo poder paralelo. E o que fazemos? Que atitudes tomamos? Em geral, prevalece nossa indiferença e conferimos ao nosso silêncio conotações de sabedoria. Sabemos que estamos com lama até o pescoço, mas acreditamos estar a salvo porque ainda conseguimos (exceção feita aos menos favorecidos) manter limpas as unhas nas pontas dos dedos. Mas, até quando?
Com relação à montagem, José Wilker criou uma encenação que considero magistral. E não porque tenha criado marcas espetaculares, mas justamente por ter renunciado a elas e investido todas as suas fichas no trabalho dos atores. Em meio a uma atmosfera sombria e claustrofóbica, tudo fica à mercê das palavras e do trabalho dos atores. E sendo Wilker um ator de exceção, nada mais natural que tenha conseguido extrair atuações maravilhosas do elenco.
Antonio Petrin está irretocável na pele do angustiado cientista. E se de início nos incomoda a deplorável omissão do personagem, mais adiante ele nos comove com sua determinada tentativa de redenção. Vivendo a sargento, Camila Morgado nos gera inenarrável repulsa, já que esta resulta não da mera constatação da psicopatia do personagem, como já foi dito, mas sobretudo porque a atriz consegue transcender seus limites e convertê-lo num retrato da barbárie que está na essência da política externa dos EUA que, guardadas as devidas proporções, em muito se assemelha à da Alemanha de Hitler - ou será que os Estados Unidos também não se consideram uma raça superior e portanto no direito de impor seu jugo a quem lhe convier?
Finalmente, chegamos a Vera Holtz. Mencionar aqui seus vastíssimos recursos expressivos constituiria perda de tempo, já que todos sabemos ser ela uma das maiores atrizes deste país. Mas no presente caso, Vera Holtz consegue ir além de todas as expectativas. Sua performance é tão visceral e contundente que se inscreve, em minha opinião, dentre aquelas que só acontecem uma vez em cada década. E tal avaliação poderia ser fruto, apenas, do texto final que profere, quando narra as torturas de que foi vítima, assim como seus filhos. O exasperado e circular gesto que executa com a mão direita, reforçando drasticamente o impacto das palavras de que se vale para descrever a morte de seu filho de oito anos, muito provavelmente causaram fortíssima comoção em toda a platéia, que certamente jamais esquecerá este momento sublime.
No tocante à equipe técnica, considero da mais alta expressividade os trabalhos de todos os profissionais envolvidos nesta mais do que oportuna e imperdível montagem, que o público carioca haverá de prestigiar sem reservas - João Gabriel Carneiro (tradução), Marcos Flaksman (cenografia), Beth Filipecki e Renaldo Machado (figurinos), Maneco Quinderé (iluminação) e Marcelo Alonso Neves (criação musical).
PALÁCIO DO FIM - Texto de Judith Thompson. Direção de José Wilker. Com Antonio Petrin, Camila Morgado e Vera Holtz. Teatro Poeira. Quinta a sábado, 21h. Domingo, 20h.
quinta-feira, 13 de outubro de 2011
O CENTRO DE RECICLAGEM DE ATORES realiza:
LABORATÓRIO PRÁTICO DE COMÉDIA
Oficina prática de comédia reunindo 5 grandes profissionais da área e abordando diversos segmentos da comédia.
De 14 de NOVEMBRO a 12 de DEZEMBRO
SEGUNDAS DAS 19H ÀS 22H – Teatro Municipal Maria Clara Machado – Gávea
PROGRAMAÇÃO:
14 de novembro – aula com Márcio Libar – Técnicas de Comicidade
21 de novembro – aula com Paulinho Serra – A Comédia em Mídias Alternativas
28 de novembro – aula com Cláudio Torres Gonzaga – Stand-up Comedy
05 de dezembro – aula com Thierry Trémouroux – Técnicas de Clown
12 de dezembro – aula com Patrícia Pinho – Treinos de Improv
VALOR: 350 reais
Preenchimento de vagas via seleção se currículo – enviar currículo para reciclagemdeatores@gmail.com
Informações: 21 9666-9954 ou reciclagemdeatores@gmail.com
Teatro Municipal Maria Clara Machado/Planetário
Av Padre Leonel Franca 240 (ao lado PUC) – Gávea – Rio de Janeiro
Conheça os ministrantes:
MÁRCIO LIBAR – Técnicas de Comicidade
Idealizador e fundador do Teatro de Anônimo, onde atuou por 18 anos e dos quais foi diretor nos primeiros sete, Marcio Libar concebeu o evento “Anjos do Picadeiro – Encontro Internacional de Palhaços”. No ano de 2003/2004 foi agraciado com a Bolsa Vitae de Artes que lhe permitiu a criação do Ateliê de Comicidade e que possibilitou a sistematização do seu processo criativo em torno da arte da palhaçaria. Considerado um dos palhaços mais importantes do Brasil na atualidade, seu trabalho como artista vai além da exploração da cena como ator. Há também o aspecto didático e pedagógico que contribui para o aprimoramento técnico desta arte. Sua oficina vem atraindo atores profissionais e iniciantes, além de artistas de vários segmentos das artes cênicas no país. Atualmente está envolvido com o lançamento nacional de seu primeiro livro “A Nobre Arte do Palhaço” que trata de seu aprendizado como palhaço dando conta de importantes personagens dessa cena. Premio Especial Cirque du Soleil - 2006(Mônaco); Nariz de Prata – 2006 (Festival de Circo de Monte Carlo); Melhor Ator – 2006 (Festival Nacional de Campos); Melhor Ator no Festival de Cinema de Paraty – 2005.
CLÁUDIO TORRES GONZAGA – Stand-up Comedy
É ator e diretor de teatro diversas vezes premiado. É redator da TV Globo, onde escreveu para os programas O Belo e as Feras, Escolinha do Professor Raymundo, Malhação, Brava Gente e Sai de Baixo. Dirigiu a peça Enfim Nós, escrita em parceria com Bruno Mazzeo. É criador e comentarista do programa de TV Paquetá Connection. Foi redator final de Sob Nova Direção e durante 5 anos comandou a redação de Zorra Total. Atualmente é redator de A Grande Família e Os Caras de Pau.
PAULINHO SERRA – Comédia em Mídias Alternativas
Ator e diretor-fundador da companhia Deznecessários, o artista fez enorme sucesso com o seu personagem Traficante Gay, campeão de acessos no youtube. O ator trabalhou no Pânico na TV e atualmente integra os programas Comédia MTV e Quinta Categoria, também na MTV. Além disso segue turnê nacional com o espetáculo Dezimprovisa, ao lado dos comediantes Tatá Werneck, Rodrigo Capella e Felipe Ruggeri.
PATRÍCIA PINHO – Treinos de Improv
PATRICIA PINHO é Improvisadora, atriz, dramaturga, graduada em Interpretação em Artes Cênicas pela UNI-RIO e Licenciatura pela Faculdade Bennett. Fundadora da CIA TEATRO DO NADA, pesquisa improvisação desde 2003. Participou da Oficina de José Sanchis Sinisterra. Recebeu o Prêmio APTR 2010 de Melhor Atriz em papel coadjuvante com a peça AS MENINAS texto de Maitê Proença e Luis Carlos Góes com Direção de Amir Haddad.
THIERRY TRÉMOUROUX – Técnicas de Clown
Ator e diretor belga radicado no Brasil, formado em psicologia, trabalhou durante 15 anos na França ao lado de artistas como Jean-Claude Carrière e Yoshi Oïda, ambos colaboradores de Peter Brook, de Zygmunt Molik, co-fundador do Teatro Laboratório de Grotowski e de Stefano Scribani do Piccolo Teatro del Milano. No Brasil desde 1994, co-fundou o grupo l’acte – Atos da Criação Teatral – realizando grandes parcerias com artistas do teatro contemporâneo da Europa. Foi membro do Laboratório do Ator/Funarte, ministrando ateliês de formação para atores e de dramaturgia no Brasil. Atualmente, além de circular com "A Inquietude" de Valère Novarina com Ana Kfouri, Thierry está em turnê internacional com a peça "Otro" do Coletivo Improviso, direção de Enrique Diaz e Cristina Moura.
Teatro/CRÍTICA
"Thérèse Raquin"
..............................................
Obra-prima em ótima versão
Lionel Fischer
"Na França do século 19, Thérèse Raquin é uma história de adultério, vingança e assassinato, baseada em livro de Émile Zola. Thérèse é casada com o fraco Camille. As coisas se complicam quando um amigo de Camille reaparece do passado para morar com o casal. Thérèse logo se interessa por Laurent, com quem passa a manter um caso extraconjugal. Vendo em Camille o único obstáculo para o amor, os dois resolvem matá-lo, mas eles não contavam com a aparição de seu fantasma, que passa a atormentar seus assassinos".
Extraído do ótimo release que me foi enviado pela assessora de imprensa Ana Gaio, "Thérèse Raquin" comemora os 20 anos de estrada da Cia. Limite 151, que já levou à cena 17 espetáculos, quase todos priorizando clássicos da dramaturgia universal.
Em cartaz na Casa de Cultura Laura Alvim, o espetáculo conta com tradução de Clara Carvalho, adaptação de Nicolas Wrigt e direção de João Fonseca, estando o elenco formado por Gláucia Rodrigues, Lucci Ferreira, Rodolfo Mesquita, Edmundo Lippi, Janaína Prado, Suzana Faíni e Márcio Ricciardi - este último substituiu, por duas semanas, o ator Rogério Fróes, sendo que o papel passará a ser interpretado, a partir do próximo sábado, pelo ator Élcio Romar.
Uma leitura apressada do parágrafo inicial pode sugerir que estaríamos diante de um dramalhão com conotações assombradas. No entanto, tendo sido escrita por um autor de exceção como Zola
(uma referência do naturalismo literário), é óbvio que a obra nada tem de sobrenatural. Muito pelo contrário, já que investiga não apenas o conturbado universo da paixão, mas sobretudo o da culpa - se os protagonistas fossem completamente amorais, ou padecessem de inegável psicopatia, levariam adiante seu romance indiferentes ao crime que haviam perpetrado. O fantasma em questão, portanto, deve ser encarado como a materialização do remorso.
Contendo ótimos personagens, diálogos fluentes e uma carpintaria teatral de excelente nível - a presente adaptação foi feita a partir da realizada pelo próprio Zola - "Thérèse Raquin" recebeu irretocável versão cênica de João Fonseca. Diretor versátil e totalmente antenado com a modernidade, neste caso Fonseca teve a sabedoria de perceber que o texto não se prestaria a modernosas recriações, que só contribuiriam para comprometer a força do original. Assim, criou uma dinâmica cena sóbria e eficiente, priorizando o que de fato importa: a beleza e contundência do texto e as relações entre os personagens.
Na pele de Thérèse Raquin, Gláucia Rodrigues exibe aqui uma das melhores performances de sua sólida carreira. De ínício trabalhando exemplarmente a desvairada paixão que sente pelo amante, mais adiante a atriz mergulha visceralmente nos aspectos trágicos do papel, valorizando de forma exemplar a culpa que dela se apossa. A mesma eficiência está presente na atuação de Lucci Ferreira, irrepreensível no papel de Laurent - assim como Gláucia, o ator de início nos convence plenamente da paixão que sente pela protagonista, e na parte final valoriza muito bem o remorso do personagem, ainda que o mesmo relute, durante um certo tempo, em aceitar a recusa de Thérèse de levar adiante o romance que gerou o crime.
Vivendo Madame Raquin, Suzana Faíni é outra fortíssima presença em cena, não apenas na primeira metade da peça, mas também - e sobretudo - quando a personagem sofre um derrame (ao que suponho) e luta desesperadamente para conseguir denunciar os artífices do crime, que por acaso descobrira. Com relação a Rodolfo Mesquita (Camille), Janaína Prado (Luxane) e Márcio Ricciardi (Michaud), todos exibem incontestável competência, ainda que em papéis com menores oportunidades.
Mas antes de passarmos à equipe técnica, quero parabenizar o grupo pela corajosa decisão de não interromper o espetáculo em função da imprevista doença (já sanada, ou ao menos minimizada) que acometeu Rogério Fróes. Quando assisti ao espetáculo, o ator Márcio Ricciardi fez o personagem com o texto na mão, que eventualmente consultava, sem jamais ocultar este fato, que ao final da sessão foi explicado para a platéia que, diga-se de passagem, não esboçou qualquer reação negativa. Parabéns ao grupo, parabéns ao ator, por esta comovente demonstração de respeito pelo teatro e pelo público.
Na equipe técnica, destaco com o mesmo entusiasmo o trabalho de todos os profissionais envolvidos nesta mais do que oportuna empreitada teatral - Clara Carvalho (tradução), Nicolas Wrigth (adaptação), Natalia Lana e Nello Marrese (cenografia), Ney Madeira, Daniela Vidal e Pati Faedo (figurinos), Wagner Campos (música original e direção musical) e Rogério Wiltgen (iluminação).
THERÉSÈ RAQUIN - Texto de Émile Zola. Direção de João Fonseca. Com a Cia. Limite 151. Casa de Cultura Laura Alvim. Quinta a sábado, 21h. Domingo, 20h
"Thérèse Raquin"
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Obra-prima em ótima versão
Lionel Fischer
"Na França do século 19, Thérèse Raquin é uma história de adultério, vingança e assassinato, baseada em livro de Émile Zola. Thérèse é casada com o fraco Camille. As coisas se complicam quando um amigo de Camille reaparece do passado para morar com o casal. Thérèse logo se interessa por Laurent, com quem passa a manter um caso extraconjugal. Vendo em Camille o único obstáculo para o amor, os dois resolvem matá-lo, mas eles não contavam com a aparição de seu fantasma, que passa a atormentar seus assassinos".
Extraído do ótimo release que me foi enviado pela assessora de imprensa Ana Gaio, "Thérèse Raquin" comemora os 20 anos de estrada da Cia. Limite 151, que já levou à cena 17 espetáculos, quase todos priorizando clássicos da dramaturgia universal.
Em cartaz na Casa de Cultura Laura Alvim, o espetáculo conta com tradução de Clara Carvalho, adaptação de Nicolas Wrigt e direção de João Fonseca, estando o elenco formado por Gláucia Rodrigues, Lucci Ferreira, Rodolfo Mesquita, Edmundo Lippi, Janaína Prado, Suzana Faíni e Márcio Ricciardi - este último substituiu, por duas semanas, o ator Rogério Fróes, sendo que o papel passará a ser interpretado, a partir do próximo sábado, pelo ator Élcio Romar.
Uma leitura apressada do parágrafo inicial pode sugerir que estaríamos diante de um dramalhão com conotações assombradas. No entanto, tendo sido escrita por um autor de exceção como Zola
(uma referência do naturalismo literário), é óbvio que a obra nada tem de sobrenatural. Muito pelo contrário, já que investiga não apenas o conturbado universo da paixão, mas sobretudo o da culpa - se os protagonistas fossem completamente amorais, ou padecessem de inegável psicopatia, levariam adiante seu romance indiferentes ao crime que haviam perpetrado. O fantasma em questão, portanto, deve ser encarado como a materialização do remorso.
Contendo ótimos personagens, diálogos fluentes e uma carpintaria teatral de excelente nível - a presente adaptação foi feita a partir da realizada pelo próprio Zola - "Thérèse Raquin" recebeu irretocável versão cênica de João Fonseca. Diretor versátil e totalmente antenado com a modernidade, neste caso Fonseca teve a sabedoria de perceber que o texto não se prestaria a modernosas recriações, que só contribuiriam para comprometer a força do original. Assim, criou uma dinâmica cena sóbria e eficiente, priorizando o que de fato importa: a beleza e contundência do texto e as relações entre os personagens.
Na pele de Thérèse Raquin, Gláucia Rodrigues exibe aqui uma das melhores performances de sua sólida carreira. De ínício trabalhando exemplarmente a desvairada paixão que sente pelo amante, mais adiante a atriz mergulha visceralmente nos aspectos trágicos do papel, valorizando de forma exemplar a culpa que dela se apossa. A mesma eficiência está presente na atuação de Lucci Ferreira, irrepreensível no papel de Laurent - assim como Gláucia, o ator de início nos convence plenamente da paixão que sente pela protagonista, e na parte final valoriza muito bem o remorso do personagem, ainda que o mesmo relute, durante um certo tempo, em aceitar a recusa de Thérèse de levar adiante o romance que gerou o crime.
Vivendo Madame Raquin, Suzana Faíni é outra fortíssima presença em cena, não apenas na primeira metade da peça, mas também - e sobretudo - quando a personagem sofre um derrame (ao que suponho) e luta desesperadamente para conseguir denunciar os artífices do crime, que por acaso descobrira. Com relação a Rodolfo Mesquita (Camille), Janaína Prado (Luxane) e Márcio Ricciardi (Michaud), todos exibem incontestável competência, ainda que em papéis com menores oportunidades.
Mas antes de passarmos à equipe técnica, quero parabenizar o grupo pela corajosa decisão de não interromper o espetáculo em função da imprevista doença (já sanada, ou ao menos minimizada) que acometeu Rogério Fróes. Quando assisti ao espetáculo, o ator Márcio Ricciardi fez o personagem com o texto na mão, que eventualmente consultava, sem jamais ocultar este fato, que ao final da sessão foi explicado para a platéia que, diga-se de passagem, não esboçou qualquer reação negativa. Parabéns ao grupo, parabéns ao ator, por esta comovente demonstração de respeito pelo teatro e pelo público.
Na equipe técnica, destaco com o mesmo entusiasmo o trabalho de todos os profissionais envolvidos nesta mais do que oportuna empreitada teatral - Clara Carvalho (tradução), Nicolas Wrigth (adaptação), Natalia Lana e Nello Marrese (cenografia), Ney Madeira, Daniela Vidal e Pati Faedo (figurinos), Wagner Campos (música original e direção musical) e Rogério Wiltgen (iluminação).
THERÉSÈ RAQUIN - Texto de Émile Zola. Direção de João Fonseca. Com a Cia. Limite 151. Casa de Cultura Laura Alvim. Quinta a sábado, 21h. Domingo, 20h
segunda-feira, 10 de outubro de 2011
Teatro/CRÍTICA
"Cartas de Maria Julieta & Carlos Drummond de Andrade"
......................................................
Humor e humanidade no Sesc
Lionel Fischer
Como já disse inúmeras vezes, sou completamente indiferente aos avanços tecnológicos no campo da informática - meu computador e eu mantemos uma relação extremamente delicada e não consigo resolver impasses que uma criança de três anos (com sono) resolve em segundos. Isto posto, cumpre declarar que sou completamente apaixonado por papel, por livros (adoro o cheiro deles) e por cartas - meus amigos costumam dizer que sou um homem, no máximo, do século 19, o que recebo como delicioso elogio.
Assim sendo, nada mais natural que a presente montagem me despertasse grande curiosidade, já que estruturada em cima de cinco décadas de correspondência trocada entre Maria Julieta e seu pai, o poeta Carlos Drummond de Andrade. Em cartaz no Espaço Sesc, o espetáculo foi idealizado por Pedro Drummond, filho de Maria Julieta e neto de Drummon. Sura Berditchevsky responde pela direção, dramaturgia e atuação - Luis Fernando Philbert assina a co-direção da montagem.
Como dito acima, o espetáculo baseia-se em cinco décadas de correspondência, o que faculta ao espectador não apenas conhecer a fortíssima, delicada, poética e enriquecedora relação entre um poeta e sua filha, mas também desnuda o homem cuja conduta foi sempre marcada pela discrição.
A partir de um material pleno de humor e humanidade, Sura Berditchevsky criou uma encenação altamente poética. São lindíssimas as projeções de cartas, fotos e em particular uma delas, que exibe modelos de vestidos. Igualmente notável a idéia da encenadora de ir transformando o espaço à medida que a narrativa se desenvolve, manipulando mesas e pequenos caixotes, a eles conferindo imprevistas funções. E no tocante à interpretação, Sura convence em todos os momentos, interpretando vários personagens em diversas idades.
Na equipe técnica, destaco com o mesmo entusiasmo as contribuições de todos os profissionais envolvidos nesta mais do que oportuna montagem - Bia Junqueira (direção de arte), Wagner Marguette (figurino), Paulo César Medeiros (iluminação), Renato Vilarouca e Ricardo Vilarouca (animação gráfica e vídeos), Alexandre Elias (trilha sonora), Rose Gonçalves (preparação vocal) e Jean Marie Dubrul (preparação corporal).
CARTAS DE MARIA JULIETA & CARLOS DRUMMON DE ANDRADE - Direção, dramaturgia e atuação de Sura Berditchevesky. Espaço Sesc. Quinta a sábado, 20h. Domingo, 18h.
"Cartas de Maria Julieta & Carlos Drummond de Andrade"
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Humor e humanidade no Sesc
Lionel Fischer
Como já disse inúmeras vezes, sou completamente indiferente aos avanços tecnológicos no campo da informática - meu computador e eu mantemos uma relação extremamente delicada e não consigo resolver impasses que uma criança de três anos (com sono) resolve em segundos. Isto posto, cumpre declarar que sou completamente apaixonado por papel, por livros (adoro o cheiro deles) e por cartas - meus amigos costumam dizer que sou um homem, no máximo, do século 19, o que recebo como delicioso elogio.
Assim sendo, nada mais natural que a presente montagem me despertasse grande curiosidade, já que estruturada em cima de cinco décadas de correspondência trocada entre Maria Julieta e seu pai, o poeta Carlos Drummond de Andrade. Em cartaz no Espaço Sesc, o espetáculo foi idealizado por Pedro Drummond, filho de Maria Julieta e neto de Drummon. Sura Berditchevsky responde pela direção, dramaturgia e atuação - Luis Fernando Philbert assina a co-direção da montagem.
Como dito acima, o espetáculo baseia-se em cinco décadas de correspondência, o que faculta ao espectador não apenas conhecer a fortíssima, delicada, poética e enriquecedora relação entre um poeta e sua filha, mas também desnuda o homem cuja conduta foi sempre marcada pela discrição.
A partir de um material pleno de humor e humanidade, Sura Berditchevsky criou uma encenação altamente poética. São lindíssimas as projeções de cartas, fotos e em particular uma delas, que exibe modelos de vestidos. Igualmente notável a idéia da encenadora de ir transformando o espaço à medida que a narrativa se desenvolve, manipulando mesas e pequenos caixotes, a eles conferindo imprevistas funções. E no tocante à interpretação, Sura convence em todos os momentos, interpretando vários personagens em diversas idades.
Na equipe técnica, destaco com o mesmo entusiasmo as contribuições de todos os profissionais envolvidos nesta mais do que oportuna montagem - Bia Junqueira (direção de arte), Wagner Marguette (figurino), Paulo César Medeiros (iluminação), Renato Vilarouca e Ricardo Vilarouca (animação gráfica e vídeos), Alexandre Elias (trilha sonora), Rose Gonçalves (preparação vocal) e Jean Marie Dubrul (preparação corporal).
CARTAS DE MARIA JULIETA & CARLOS DRUMMON DE ANDRADE - Direção, dramaturgia e atuação de Sura Berditchevesky. Espaço Sesc. Quinta a sábado, 20h. Domingo, 18h.
sexta-feira, 7 de outubro de 2011
Teatro/CRÍTICA
"Orlando ou Um impulso de acompanhar os pássaros até o fim do mundo"
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Obra-prima em excelente versão
Lionel Fischer
No dia 28 de março de 1941, após ter um colapso nervoso, Virgínia Woolf vestiu um casaco, encheu seus bolsos com pedras e entrou no rio Ouse, afogando-se. Seu corpo só foi encontrado no dia 18 de abril. Em seu último bilhete para o marido, Leonardo Woolf, escreveu:
"Querido,
Tenho certeza de estar ficando louca novamente. Sinto que não conseguiremos passar por novos tempos difíceis. E não quero revivê-los. Começo a escutar vozes e não consigo me concentrar. Portanto, estou fazendo o que me parece ser o melhor a se fazer. Você me deu muitas possibilidades de ser feliz. Você esteve presente como nenhum outro. Não creio que duas pessoas possam ser felizes convivendo com esta doença terrível. Não posso mais lutar. Sei que estarei tirando um peso de suas costas, pois, sem mim, você poderá trabalhar. E você vai, eu sei. Você vê, não consigo sequer escrever. Nem ler. Enfim, o que quero dizer é que é a você que eu devo toda a minha felicidade. Você foi bom para mim, como ninguém poderia ter sido. Eu queria dizer isto - todos sabem. Se alguém pudesse me salvar, este alguém seria você. Tudo se foi para mim mas o que ficará é a certeza da sua bondade, sem igual. Não posso atrapalhar sua vida. Não mais. Não acredito que duas pessoas poderiam ser tão felizes quanto nós fomos.V."
Escritora, ensaísta, poeta e editora, a britânica Virgínia Wollf (1882-1941) deixou uma obra vasta e diversificada, dentre elas "Orlando - uma biografia", na qual aborda a longa trajetória (três séculos) de um poeta à procura da forma perfeita para seu poema ('O carvalho'), ao mesmo tempo em que investiga a produção literária de seus contemporâneos e tenta conviver com sua dupla sexualidade.
Aqui rebatizada de "Orlando ou Um impulso de acompanhar os pássaros até o fim do mundo", esta obra magistral chega à cena (Porão da Laura Alvim) com direção e adaptação de Alexandre Rudáh, dramaturgia de Rudáh e Patrícia Niedermeier e colaboração dramatúrgica de Maíra Kesten. Interpretando o monólogo, Patrícia Niedermeier - também escutamos a voz em off de Julia Bernat e vemos em vídeos as bailarinas Fabiana Nunes, Lavínia Bizzotto e Soraya Bastos, com Joaquim Tomé fazendo uma participação especial.
Por tratar-se, como dito acima, de obra magistral, a mesma já mereceu incontáveis ensaios de renomados críticos e pensadores, certamente muito mais qualificados do que eu. Ainda assim, ouso supor que, dentre outras coisas, a autora talvez tenha pretendido empreender uma espécie de exploração dos limites da consciência humana, assim como uma reflexão sobre o efeito do tempo no Homem - trata-se apenas de uma hipótese e, como tal, sujeita a todos os enganos.
Seja como for, o espectador terá acesso a uma trama surpreendende, originalíssima, repleta de humor e humanidade. E cuja transposição cênica exibe consistência e criatividade, já que as soluções encontradas pelo jovem diretor Alexandre Rudáh não são impactantes apenas por sua originalidade, mas sobretudo porque estão em sintonia com os principais conteúdos em jogo. Sem dúvida, uma montagem que merece ser prestigiada de forma incondicional pelo público.
Na pele de Orlando, Patrícia Niedermeier evidencia mais uma vez seus vastíssimos recursos expressivos, tanto no tocante ao corpo quanto ao texto articulado. E também mais alguns predicados que merecem ser destacados, tais como sua visceral capacidade de entrega, a inteligência de suas escolhas e - fato nem sempre presente em nossos palcos - a certeza que nos transmite de saber exatamente as razões que a levam, por exemplo, a executar um gesto, prolongar uma pausa ou modular a voz de forma imprevista. Em resumo: o público tem aqui a oportunidade de apreciar um dos desempenhos mais marcantes da atual temporada.
Na equipe técnica, destaco com o mesmo entusiasmo os irrepreensíveis trabalhos de todos os profissionais envolvidos nesta imperdível empreitada teatral - Flávio Graff (cenografia), Renato Machado (iluminação), Pedro Tie (trilha sonora), Bruno Cezario (figurinos) e Alexandre Rudáh (concepção e direção dos belíssimos vídeos).
ORLANDO ou UM IMPULSO PARA ACOMPANHAR OS PÁSSAROS ATÉ O FIM DO MUNDO - Texto de Virgínia Woolf. Direção e adaptação de Alexandre Rudáh. Com Patrícia Niedermeier. Porão da Casa de Cultura Laura Alvim. Quinta a sábado, 21h. Domingo, 20h.
"Orlando ou Um impulso de acompanhar os pássaros até o fim do mundo"
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Obra-prima em excelente versão
Lionel Fischer
No dia 28 de março de 1941, após ter um colapso nervoso, Virgínia Woolf vestiu um casaco, encheu seus bolsos com pedras e entrou no rio Ouse, afogando-se. Seu corpo só foi encontrado no dia 18 de abril. Em seu último bilhete para o marido, Leonardo Woolf, escreveu:
"Querido,
Tenho certeza de estar ficando louca novamente. Sinto que não conseguiremos passar por novos tempos difíceis. E não quero revivê-los. Começo a escutar vozes e não consigo me concentrar. Portanto, estou fazendo o que me parece ser o melhor a se fazer. Você me deu muitas possibilidades de ser feliz. Você esteve presente como nenhum outro. Não creio que duas pessoas possam ser felizes convivendo com esta doença terrível. Não posso mais lutar. Sei que estarei tirando um peso de suas costas, pois, sem mim, você poderá trabalhar. E você vai, eu sei. Você vê, não consigo sequer escrever. Nem ler. Enfim, o que quero dizer é que é a você que eu devo toda a minha felicidade. Você foi bom para mim, como ninguém poderia ter sido. Eu queria dizer isto - todos sabem. Se alguém pudesse me salvar, este alguém seria você. Tudo se foi para mim mas o que ficará é a certeza da sua bondade, sem igual. Não posso atrapalhar sua vida. Não mais. Não acredito que duas pessoas poderiam ser tão felizes quanto nós fomos.V."
Escritora, ensaísta, poeta e editora, a britânica Virgínia Wollf (1882-1941) deixou uma obra vasta e diversificada, dentre elas "Orlando - uma biografia", na qual aborda a longa trajetória (três séculos) de um poeta à procura da forma perfeita para seu poema ('O carvalho'), ao mesmo tempo em que investiga a produção literária de seus contemporâneos e tenta conviver com sua dupla sexualidade.
Aqui rebatizada de "Orlando ou Um impulso de acompanhar os pássaros até o fim do mundo", esta obra magistral chega à cena (Porão da Laura Alvim) com direção e adaptação de Alexandre Rudáh, dramaturgia de Rudáh e Patrícia Niedermeier e colaboração dramatúrgica de Maíra Kesten. Interpretando o monólogo, Patrícia Niedermeier - também escutamos a voz em off de Julia Bernat e vemos em vídeos as bailarinas Fabiana Nunes, Lavínia Bizzotto e Soraya Bastos, com Joaquim Tomé fazendo uma participação especial.
Por tratar-se, como dito acima, de obra magistral, a mesma já mereceu incontáveis ensaios de renomados críticos e pensadores, certamente muito mais qualificados do que eu. Ainda assim, ouso supor que, dentre outras coisas, a autora talvez tenha pretendido empreender uma espécie de exploração dos limites da consciência humana, assim como uma reflexão sobre o efeito do tempo no Homem - trata-se apenas de uma hipótese e, como tal, sujeita a todos os enganos.
Seja como for, o espectador terá acesso a uma trama surpreendende, originalíssima, repleta de humor e humanidade. E cuja transposição cênica exibe consistência e criatividade, já que as soluções encontradas pelo jovem diretor Alexandre Rudáh não são impactantes apenas por sua originalidade, mas sobretudo porque estão em sintonia com os principais conteúdos em jogo. Sem dúvida, uma montagem que merece ser prestigiada de forma incondicional pelo público.
Na pele de Orlando, Patrícia Niedermeier evidencia mais uma vez seus vastíssimos recursos expressivos, tanto no tocante ao corpo quanto ao texto articulado. E também mais alguns predicados que merecem ser destacados, tais como sua visceral capacidade de entrega, a inteligência de suas escolhas e - fato nem sempre presente em nossos palcos - a certeza que nos transmite de saber exatamente as razões que a levam, por exemplo, a executar um gesto, prolongar uma pausa ou modular a voz de forma imprevista. Em resumo: o público tem aqui a oportunidade de apreciar um dos desempenhos mais marcantes da atual temporada.
Na equipe técnica, destaco com o mesmo entusiasmo os irrepreensíveis trabalhos de todos os profissionais envolvidos nesta imperdível empreitada teatral - Flávio Graff (cenografia), Renato Machado (iluminação), Pedro Tie (trilha sonora), Bruno Cezario (figurinos) e Alexandre Rudáh (concepção e direção dos belíssimos vídeos).
ORLANDO ou UM IMPULSO PARA ACOMPANHAR OS PÁSSAROS ATÉ O FIM DO MUNDO - Texto de Virgínia Woolf. Direção e adaptação de Alexandre Rudáh. Com Patrícia Niedermeier. Porão da Casa de Cultura Laura Alvim. Quinta a sábado, 21h. Domingo, 20h.
terça-feira, 4 de outubro de 2011
Teatro/CRÍTICA
"O incrível segredo da mulher macaco"
.................................
Imperdível comédia em Ipanema
Lionel Fischer
"A peça conta uma história desmiolada, sangrenta e absurda, recheada de revelações bombásticas e muitas piadas. É um espetáculo de comédia-terror que apresenta um leque de personagens que buscam uma sintonia inalcançável: uma heroína preocupada com os preparativos de seu casamento, um noivo milionário, uma cruel criada, um desconhecido em busca de abrigo, uma matriarca paralítica, uma atriz de cinema de identidade falsa. Seis personagens. Seis vidas. Seis segredos"
Extraído do release que me foi enviado, o trecho acima sintetiza o enredo desta desvairada e hilariante comédia, que teve como fonte de inspiração o romance inglês "O morro dos ventos uivantes", de Emilly Brontë. De autoria de Saulo Sisnando, também responsável pela direção do espetáculo, "O incrível segredo da mulher macaco" é a mais recente produção da Cia. Os Surtados, responsável por sucessos como "Surto" e "Mamãe não pode saber". Em cartaz no Teatro Candido Mendes, a montagem traz no elenco Wendell Bendelack e Rodrigo Fagundes.
Costuma-se dizer que "rir é o melhor remédio". Sendo ou não, o fato é que torna-se literalmente impossível não se deliciar com esta mirabolante trama, propositadamente repleta de clichês e uma narrativa que a todo momento nos surpreende com revelações estapafúrdias, mas em total sintonia com o contexto. Ou seja: o humor advém basicamente da materialização de situações totalmente improváveis, que colocam o espectador, digamos, no papel de um detetive que jamais conseguirá, por si próprio, destrinchar os segredos que habitam a sinistra mansão.
Bem escrito, exibindo personagens consistentes, ainda que tresloucados, e ótimos diálogos, o texto de Saulo Sisnando é encantadoramente caótico, e sua transposição para o palco absolutamente irrepreensível, cabendo registrar a criatividade das marcações e a exatidão no que concerne ao ritmo - predicado essencial quando se trata de uma comédia.
Quanto aos atores, Wendell Bendelack e Rodrigo Fagundes são excelentes comediantes, possuidores de ótimo preparo corporal e grande habilidade vocal, o que lhes permite conferir total credibilidade a todos os personagens que interpretam. Afora isso, exibem maravilhosa contracena e uma cumplicidade que só existe quando os intérpretes acreditam no que fazem e se entregam visceralmente a todas as propostas da direção - desde que com elas concordem, evidentemente.
Na equipe técnica, todos os profissionais envolvidos dão preciosa colaboração para o inegável sucesso desta divertidíssima comédia - Duda Maia (diretora assistente e direção de movimento), Paulo Roberto Moreira (iluminação), Rodrigo Fagundes (criação da trilha e efeitos sonoros), Wendel Bendelack e Lúcia Obara (figurinos), Rodrigo Fagundes, Wendell Bendelack e Edilson Risoleta (adereços), e Rodrigo Fagundes, Wendell Bendelack e Saulo Sisnando (cenografia).
O INCRÍVEL SEGREDO DA MULHER MACACO - Texto e direção de Saulo Sisnando. Com a Cia. Os Surtados. No elenco, Wendell Bendelack e Rodrigo Fagundes. Teatro Candido Mendes. Sexta e sábado, 21h. Domingo, 20h.
"O incrível segredo da mulher macaco"
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Imperdível comédia em Ipanema
Lionel Fischer
"A peça conta uma história desmiolada, sangrenta e absurda, recheada de revelações bombásticas e muitas piadas. É um espetáculo de comédia-terror que apresenta um leque de personagens que buscam uma sintonia inalcançável: uma heroína preocupada com os preparativos de seu casamento, um noivo milionário, uma cruel criada, um desconhecido em busca de abrigo, uma matriarca paralítica, uma atriz de cinema de identidade falsa. Seis personagens. Seis vidas. Seis segredos"
Extraído do release que me foi enviado, o trecho acima sintetiza o enredo desta desvairada e hilariante comédia, que teve como fonte de inspiração o romance inglês "O morro dos ventos uivantes", de Emilly Brontë. De autoria de Saulo Sisnando, também responsável pela direção do espetáculo, "O incrível segredo da mulher macaco" é a mais recente produção da Cia. Os Surtados, responsável por sucessos como "Surto" e "Mamãe não pode saber". Em cartaz no Teatro Candido Mendes, a montagem traz no elenco Wendell Bendelack e Rodrigo Fagundes.
Costuma-se dizer que "rir é o melhor remédio". Sendo ou não, o fato é que torna-se literalmente impossível não se deliciar com esta mirabolante trama, propositadamente repleta de clichês e uma narrativa que a todo momento nos surpreende com revelações estapafúrdias, mas em total sintonia com o contexto. Ou seja: o humor advém basicamente da materialização de situações totalmente improváveis, que colocam o espectador, digamos, no papel de um detetive que jamais conseguirá, por si próprio, destrinchar os segredos que habitam a sinistra mansão.
Bem escrito, exibindo personagens consistentes, ainda que tresloucados, e ótimos diálogos, o texto de Saulo Sisnando é encantadoramente caótico, e sua transposição para o palco absolutamente irrepreensível, cabendo registrar a criatividade das marcações e a exatidão no que concerne ao ritmo - predicado essencial quando se trata de uma comédia.
Quanto aos atores, Wendell Bendelack e Rodrigo Fagundes são excelentes comediantes, possuidores de ótimo preparo corporal e grande habilidade vocal, o que lhes permite conferir total credibilidade a todos os personagens que interpretam. Afora isso, exibem maravilhosa contracena e uma cumplicidade que só existe quando os intérpretes acreditam no que fazem e se entregam visceralmente a todas as propostas da direção - desde que com elas concordem, evidentemente.
Na equipe técnica, todos os profissionais envolvidos dão preciosa colaboração para o inegável sucesso desta divertidíssima comédia - Duda Maia (diretora assistente e direção de movimento), Paulo Roberto Moreira (iluminação), Rodrigo Fagundes (criação da trilha e efeitos sonoros), Wendel Bendelack e Lúcia Obara (figurinos), Rodrigo Fagundes, Wendell Bendelack e Edilson Risoleta (adereços), e Rodrigo Fagundes, Wendell Bendelack e Saulo Sisnando (cenografia).
O INCRÍVEL SEGREDO DA MULHER MACACO - Texto e direção de Saulo Sisnando. Com a Cia. Os Surtados. No elenco, Wendell Bendelack e Rodrigo Fagundes. Teatro Candido Mendes. Sexta e sábado, 21h. Domingo, 20h.
Teatro/CRÍTICA
"Um número"
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Inquietantes ambigüidades
Lionel Fischer
"Num momento em que a comunidade científica tem o orgulho de anunciar a criação de vida artificial em laboratório, a temática desse texto não poderia ser mais atual. Churchill, uma das principais dramaturgas contemporâneas, construiu uma improvável pérola sobre a natureza humana a partir desse fato".
Este fragmento, extraído do programa e assinado por Pedro Neschling, diretor do espetáculo, certamente explicita a temática do texto. Mas está aqui reproduzido dada a curiosidade que me despertou sua última frase: construiu uma improvável pérola sobre a natureza humana - mais adiante tentarei colocar em palavras a razão de tal curiosidade.
Em cartaz no Espaço Sesc, "Um número", de autoria de Caryt Churchill, chega à cena com elenco formado por Pedro Paulo Rangel e Pedro Osório - não deixa de ser curioso o fato de que a presente montagem reúne artistas com o mesmo nome, algo que jamais presenciara.
Como já dito, o tema central do texto gira em torno da vida artificial criada em laboratório. Inicialmente, estamos diante de um pai que trava com seu filho um diálogo uma tanto obscuro, truncado, pelo menos até o momento em que fica claro que o tal filho não foi gerado de forma natural. E mais: que existem outros filhos, geneticamente iguais a ele, espalhados pela cidade. Ou seja: clones.
O filho tenta desesperadamente saber as razões de ter sido concebido desta maneira, mas durante um tempo o pai só responde com evasivas. A partir de um dado momento, mais dois filhos aparecem, fisicamente iguais ao primeiro, mas de personalidades totalmente díspares. E a roda continua a girar, sempre em torno do mesmo eixo: basicamente alguém que indaga e um outro que só a muito custo vai tornando menos nebulosas suas revelações.
E agora chegamos à frase que selecionei do diretor. Não sei exatamente o que Pedro Neschling quis dizer com improvável pérola sobre a natureza humana. Mas suponho que não julgue improváveis - no sentido de pouco críveis - os fatos apresentados, posto que então não se daria ao trabalho de encená-los. Talvez seja uma sutil ironia, cujo sentido seria exatamente o oposto: tudo que nos é mostrado seria absolutamente provável.
Seja como for, o fato é que o texto, ainda que um tanto ambígüo, sugere uma realidade palpável, do ponto de vista científico. Mas me parece que seu maior interesse reside na complexidade dos relacionamentos humanos, em especial os familiares, pois em meio às muitas indagações feitas, em especial pelo primeiro filho, muitas delas estão impregnadas de carências, afetos mal resolvidos, urgente necessidade de entender o presente a partir de esclarecimentos relativos ao passado. Posso estar completamente enganado, evidentemente, mas foi assim que o texto me chegou.
Com relação ao espetáculo, Pedro Neschling impõe à cena uma dinâmica em total sintonia com o material dramatúrgico - tanto as marcações, como a contracena estabelecida pelos atores, contêm sempre uma espécie de estranhamento, uma permanente atmosfera de desconforto, que talvez tenha sido o objetivo da autora. E a mesma eficiência se verifica no trabalho dos intérpretes.
Sendo Pedro Paulo Rangel um dos maiores atores deste país, em nada me surpreende a excelência de sua performance, tanto nas passagens faladas quanto naquelas em que preenche o silêncio de múltiplos significados. Pedro Osório também convence plenamente interpretanto os três personagens, a eles impondo características completamente diversas.
Na equipe técnica, são irrepreensíveis os trabalhos de todos os profissionais envolvidos - Pedro Neschling e Vitória Frate (tradução),Gilberto Gawronski (cenografia), Antônio Medeiros (figurinos), Adriana Ortiz (iluminação) e João Paulo Mendonça (música original).
UM NÚMERO - Texto de Caryt Churchill. Direção de Pedro Neschling. Com Pedro Paulo Rangel e Pedro Osório. Espaço Sesc. Quarta a sábado, 21h. Domingo, 19h30.
"Um número"
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Inquietantes ambigüidades
Lionel Fischer
"Num momento em que a comunidade científica tem o orgulho de anunciar a criação de vida artificial em laboratório, a temática desse texto não poderia ser mais atual. Churchill, uma das principais dramaturgas contemporâneas, construiu uma improvável pérola sobre a natureza humana a partir desse fato".
Este fragmento, extraído do programa e assinado por Pedro Neschling, diretor do espetáculo, certamente explicita a temática do texto. Mas está aqui reproduzido dada a curiosidade que me despertou sua última frase: construiu uma improvável pérola sobre a natureza humana - mais adiante tentarei colocar em palavras a razão de tal curiosidade.
Em cartaz no Espaço Sesc, "Um número", de autoria de Caryt Churchill, chega à cena com elenco formado por Pedro Paulo Rangel e Pedro Osório - não deixa de ser curioso o fato de que a presente montagem reúne artistas com o mesmo nome, algo que jamais presenciara.
Como já dito, o tema central do texto gira em torno da vida artificial criada em laboratório. Inicialmente, estamos diante de um pai que trava com seu filho um diálogo uma tanto obscuro, truncado, pelo menos até o momento em que fica claro que o tal filho não foi gerado de forma natural. E mais: que existem outros filhos, geneticamente iguais a ele, espalhados pela cidade. Ou seja: clones.
O filho tenta desesperadamente saber as razões de ter sido concebido desta maneira, mas durante um tempo o pai só responde com evasivas. A partir de um dado momento, mais dois filhos aparecem, fisicamente iguais ao primeiro, mas de personalidades totalmente díspares. E a roda continua a girar, sempre em torno do mesmo eixo: basicamente alguém que indaga e um outro que só a muito custo vai tornando menos nebulosas suas revelações.
E agora chegamos à frase que selecionei do diretor. Não sei exatamente o que Pedro Neschling quis dizer com improvável pérola sobre a natureza humana. Mas suponho que não julgue improváveis - no sentido de pouco críveis - os fatos apresentados, posto que então não se daria ao trabalho de encená-los. Talvez seja uma sutil ironia, cujo sentido seria exatamente o oposto: tudo que nos é mostrado seria absolutamente provável.
Seja como for, o fato é que o texto, ainda que um tanto ambígüo, sugere uma realidade palpável, do ponto de vista científico. Mas me parece que seu maior interesse reside na complexidade dos relacionamentos humanos, em especial os familiares, pois em meio às muitas indagações feitas, em especial pelo primeiro filho, muitas delas estão impregnadas de carências, afetos mal resolvidos, urgente necessidade de entender o presente a partir de esclarecimentos relativos ao passado. Posso estar completamente enganado, evidentemente, mas foi assim que o texto me chegou.
Com relação ao espetáculo, Pedro Neschling impõe à cena uma dinâmica em total sintonia com o material dramatúrgico - tanto as marcações, como a contracena estabelecida pelos atores, contêm sempre uma espécie de estranhamento, uma permanente atmosfera de desconforto, que talvez tenha sido o objetivo da autora. E a mesma eficiência se verifica no trabalho dos intérpretes.
Sendo Pedro Paulo Rangel um dos maiores atores deste país, em nada me surpreende a excelência de sua performance, tanto nas passagens faladas quanto naquelas em que preenche o silêncio de múltiplos significados. Pedro Osório também convence plenamente interpretanto os três personagens, a eles impondo características completamente diversas.
Na equipe técnica, são irrepreensíveis os trabalhos de todos os profissionais envolvidos - Pedro Neschling e Vitória Frate (tradução),Gilberto Gawronski (cenografia), Antônio Medeiros (figurinos), Adriana Ortiz (iluminação) e João Paulo Mendonça (música original).
UM NÚMERO - Texto de Caryt Churchill. Direção de Pedro Neschling. Com Pedro Paulo Rangel e Pedro Osório. Espaço Sesc. Quarta a sábado, 21h. Domingo, 19h30.