Teatro/CRÍTICA
"Como posso não ser Montgomery Clift?"
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Conturbada jornada de um ícone do cinema
Lionel Fischer
"A peça se passa no momento em que, exausto do assédio e pressão dos meios de comunicação e da indústria cinematográfica, Clift decide abandonar o cinema para voltar ao teatro e realizar o sonho de montar A Gaivota, de Tchecov. Monty, como era conhecido na intimidade, enfrenta as sequelas do acidente de carro que desfigurou seu rosto, além dos conflitos com a sua homossexualidade, a conturbada vida familiar e as relações com os colegas de profissão".
O trecho acima, extraído do release que me foi enviado, explicita o contexto em que se dá "Como posso não ser Montgomery Clift?", de autoria do espanhol Alberto Conejero López. Após cumprir temporada em São Paulo, a montagem está em cartaz no Espaço Cultural Municipal Sérgio Porto. Fernando Philbert responde pela direção, estando a interpretação a cargo de Gustavo Gasparani - Claudio Gabriel, Cesar Augusto e Isaac Bernat fazem ótimas participações em áudio.
Possuidor de grande talento, Montgomery Clift exibiu atuações primorosas em filmes como "Um lugar ao sol", "A um passo da eternidade", "Os deuses vencidos" e "Julgamento em Nuremberg", dentre outros. Além disso, era um homem belíssimo. Reunia, portanto, os predicados essenciais não apenas para triunfar em Hollywood, mas também para trilhar uma longa e bem sucedida carreira.
No entanto, dois outros "predicados" agiram no sentido inverso. O primeiro, até certo ponto tolerável, era o ocasional excesso de bebida. Já o segundo, a homossexualidade, era encarada como gravíssima doença. Muitos atores, inclusive, escondiam suas preferências sexuais para poderem continuar trabalhando. Não foi o caso de Montgomery Clift.
O texto nos mostra o ator na fase final de sua vida. Dentre suas muitas recordações, às vezes vivenciadas, destacam-se sua conturbada relação com a mãe, a grande amizade com Elizabeth Taylor e o desejo de voltar ao teatro interpretando Treplev, personagem de "A Gaivota", de Tchecov. Mas a potência maior do texto reside na capacidade do autor de empreender pertinentes reflexões sobre a profissão do ator, sobretudo quando inserido na indústria cinematográfica.
Com relação ao espetáculo, Fernando Philbert impõe à cena uma dinâmica em total sintonia com o material dramatúrgico, cabendo destacar a maestria com que explora a ótima cenografia de Natália Lana - uma banheira, ao centro, sugere um túmulo e em torno dela estruturas de spots remetem a um estúdio cinematográfico - e também sua parceria com Gustavo Gasparani.
Para aqueles que me acompanham (se é que alguém me acompanha) ao longo desses 35 anos de exercício da crítica teatral, é bem provável que já tenham se deparado com os muitos elogios que venho dedicando a Gustavo Gasparani. Portanto, para não correr o risco de ser ou parecer monótono, limito-me a agradecer à vida o privilégio de ter assistido a mais uma ótima performance deste ator de exceção.
No complemento da ficha técnica, destaco com o mesmo entusiasmo as preciosas colaborações de Fernando Yamamoto (tradução), Marieta Spada (figurino), Márcio Mello (visagismo), Vilmar Olos (iluminação) e Marcelo Alonso Neves (trilha sonora). Gostaria também de parabenizar Thiago Tafuri (operador de som) e Denys Lima (operador de luz) pela precisão e sensibilidade com que executam suas funções.
COMO POSSO NÃO SER MONTGOMERY CLIFT? - Texto de Alberto Conejero López. Direção de Fernando Philbert. Com Gustavo Gasparani. Espaço Cultural Municipal Sergio Porto. Sexta e sábado, 20h. Domingo, 19h.
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