terça-feira, 21 de outubro de 2014

Teatro/CRÍTICA

"Rei Lear"

......................................................................
Obra-prima em belíssima adaptação



Lionel Fischer


"A peça conta a história do velho Lear, Rei da Bretanha, que decide dividir seu reino entre suas três filhas. Ao fazer a partilha, acaba sensibilizado e ludibriado pelos discursos bajuladores das ambiciosas Goneril e Regan e renega Cordélia, a filha mais nova que, preferindo manter-se íntegra, recusa-se a bajular o pai. O tempo, no entanto, mostra que Cordélia era a única merecedora do trono e do afeto de Lear, a essa altura já enredado nas armadilhas das filhas mais velhas".

Extraído do release que me foi enviado, o trecho acima sintetiza o enredo de "Rei Lear", por muitos considerada a obra suprema de William Shakespeare. Mas aqui a tragédia, em cartaz no Teatro dos Quatro, está condensada e os 16 principais personagens foram reduzidos a seis: Lear, suas três filhas, o Bobo e Kent, assessor do rei. E todos são interpretados por um único ator, Juca de Oliveira. Geraldo Carneiro assina a tradução e a adaptação, estando a direção a cargo de Elias Andreato.

É possível, e até mesmo provável, que puristas de plantão torçam seus desgraciosos narizes diante de uma adaptação como esta - como torceriam, certamente, para qualquer adaptação. No entanto, considero brilhante o trabalho feito por Geraldo Carneiro, pois foram preservadas tanto a essência da história como algumas das falas mais sublimes da obra, através das quais o fabuloso bardo esgota os principais temas que elegeu: a cobiça e a ingratidão filial.

Com relação ao espetáculo, Elias Andreato optou por uma dinâmica cênica despojada, que tem como elemento cenográfico apenas uma cadeira. E como Juca de Oliveira usa um traje negro e
certamente foi orientado para se deslocar pelo espaço sem maiores arroubos, toda a atenção da plateia se concentra na inacreditável beleza e poesia do texto, em suas dolorosas e pertinentes reflexões, assim como na capacidade do ator de encarnar os seis personagens já mencionados.  

Neste particular, é realmente notável a performance de Juca de Oliveira. Valendo-se de sutis mudanças vocais e corporais, sem nenhum resquício de desnecessários maneirismos, o ator demonstra uma vez mais seu imenso talento. E este também pode ser aferido pela inteligência de suas escolhas, pela maestria com que domina os tempos rítmicos, pela autoridade e veracidade que confere a cada fala e, evidentemente, por sua visceral capacidade de entrega. Sem dúvida, estamos diante de um momento teatral de altíssimo nível, um verdadeiro presente para todos aqueles que amam a dificílima arte de representar.  

No complemento da ficha técnica, cabe destacar a maravilhosa tradução de Geraldo Carneiro, que contribui decisivamente para reforçar a atualidade de uma obra fadada a se perpetuar. Fabio Namatame responde pelas sábias escolhas relativas a cenário e figurino, sendo muito expressiva (ainda que discreta) a iluminação de Wagner Freire. Também essenciais as participações de Melissa Vettore (preparação corporal) e Daniel Maia (trilha sonora).

REI LEAR - Texto de William Shakespeare. Tradução e adaptação de Geraldo Carneiro. Direção de Elias Andreato. Com Juca de Oliveira. Teatro dos Quatro. Quinta a sábado, 19h. Domingo às 18h30 (outubro) e às 20h30 (novembro).   

  

  









Nenhum comentário:

Postar um comentário