Teatro/CRÍTICA
"Foi você quem pediu para eu
contar a minha história"
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Clima exacerbado impede sutilezas
Lionel Fischer
"Quatro meninas brincam de inventar histórias. Elas apresentam suas memórias, mais ou menos reais, seus medos, suas vidas sonhadas. Através de um jogo, à primeira vista inocente, e a partir de temas que elas abordam como feminilidade, misoginia, status social e o corpo da mulher, observamos como essas meninas podem ser - com elas mesmas e com os outros - cruéis, perversas, bem humoradas, ambivalentes e assustadoramente lúcidas".
Extraído do release que me foi enviado, o trecho acima sintetiza o contexto em que se dá "Foi você quem pediu para eu contar minha história" (Teatro do Leblon), de autoria da francesa Sandrine Roche. Thereza Falcão assina a adaptação e Guilherme Piva a direção. No elenco, Fernanda Vasconcellos, Bianca Castanho, Karla Tenório e Talita Castro.
Como todos sabemos, é vastíssima a capacidade que as crianças possuem de inventar histórias e vivê-las momentaneamente como se fossem verdadeiras. E também ninguém desconhece o fato de que as crianças, ainda que inconscientemente, utilizam as próprias fantasias para tentar lidar melhor com tudo que as incomoda ou pretendem alcançar. Neste sentido, o presente texto oferece um retrato absolutamente pertinente do universo em questão.
E cabe também destacar a originalidade da estrutura narrativa, pois as histórias particulares de cada uma das meninas acabam sendo tomadas pelas outras e servindo de trampolim para novas e imprevistas histórias - mesmo que as individualidades sejam preservadas e as trajetórias pessoais não sejam as mesmas, é como se todas as personagens, ao menos em alguma medida, possuíssem algo em comum. No entanto, me causou uma certa surpresa a forma como o texto está materializado na cena.
Se por um lado é óbvio que a autora priorizou, em sua maioria, situações potencialmente agressivas, isso não significa que elas tenham que receber um tratamento tão exacerbado praticamente o tempo todo. Sim, pois na maior parte da montagem, o texto é proferido aos gritos e todo o gestual vem impregnado de inaudita violência. Por que será que o diretor fez esta opção? Por que será que estimulou as atrizes a atuarem, quase sempre, como se estivessem possuídas?
Sendo Guilherme Piva um ótimo ator e um encenador de recente e significativa trajetória, acredito que poderia ter encontrado uma forma menos paroxística de trabalhar alguns conflitos, em especial, como já disse, os potencialmente mais agressivos. Isso certamente haveria de propiciar às atrizes Fernanda Vasconcellos, Bianca Castanho, Karla Tenório e Talita Castro (excelentes, diga-se de passagem) maiores possibilidades interpretativas, uma alternância maior de climas e o aflorar de imprescindíveis sutilezas. Fica, portanto, a singela sugestão de que algumas passagens possam ser ao menos um pouco suavizadas, sem que isso signifique um afrouxamento das pulsões em jogo.
Na equipe técnica, não tenho como avaliar a adaptação de Thereza Falcão, pois não conheço o original - mas acredito que, como de hábito, tenha feito um excelente trabalho. Paula Santa Rosa e Rafael Pieri assinam um cenário que atende a todas as solicitações da montagem - um balanço, uma banco e um trepa-trepa. Carol Lobato veste as atrizes com convencionais e satisfatórios uniformes. Renato Machado ilumina a cena de forma a potencializar ainda mais a virulência do espetáculo, o que não deixa de ser coerente, com Marcelo Alonso Neves sendo responsável por correta trilha sonora.
FOI VOCÊ QUEM PEDIU PARA EU CONTAR A MINHA HISTÓRIA - Texto de Sandrine Roche. Adaptação de Thereza Falcão. Direção de Guilherme Piva. Com Fernanda Vasconcellos, Bianca Castanho, Karla Tenório e Talita Castro. Teatro do Leblon (Sala Fernanda Montenegro). Quarta e quinta, 21h.
quarta-feira, 10 de junho de 2015
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