Teatro/CRÍTICA
"Família Lyons"
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Humor e tragédia no Glaucio Gill
Lionel Fischer
"Ben está em um hospital em estágio terminal de câncer, com a família ao redor: Rita, sua mulher, e seus filhos Lisa e Curtis. Ben já perdeu o senso de educação e diz o que lhe vem à cabeça. Rita, presa a um casamento de 40 anos sem amor, imagina agora o futuro sem Ben, e planeja redecorar a casa. Lisa é alcoólatra e acaba de sair de um casamento abusivo; Curtis, homossexual, tem muito pouco em comum com o pai. A família se reúne no hospital e aproveita os últimos momentos de vida do pai para um acerto final".
Extraído do release que me foi enviado, o trecho acima resume o contexto de "Família Lyons", do norte-americano Nicky Silver, em cartaz no Teatro Glaucio Gill. Marcos Caruso assina a direção da montagem, estando o elenco formado por Suzana Faini (Rita), Emilio Orciollo Netto (Curtis), Zulma Mercadante (Lisa), Pedro Osório (Brian, corretor de imóveis), Rose Lima (Enfermeira) e Rogério Fróes (Ben).
Com obras já encenadas com sucesso no Brasil ("Pterodátilos", "Os altruístas" e "Criados em cativeiro"), Nicky Silver explicitou, em uma entrevista, algumas premissas essenciais de seu trabalho: "Eu parto do princípio de que existe humor em tudo, pois, sem isso, certamente não existiria a espécie humana. Mas, a fronteira entre a graça e a tragédia depende muito do tipo de família de que estamos tratando".
No presente caso, de que tipo de família o autor está tratando? De uma família obviamente desestruturada, cujos membros parecem desconhecer totalmente sentimentos como amor, parceria ou solidariedade. Estamos, portanto, diante de um universo trágico. No entanto, em função das peripécies criadas, essa tragicidade é contrabalançada por irresistíveis momentos de humor, sempre desconcertante e ácido, daí resultando um texto em que a amargura e o deboche caminham de mãos dadas.
Certamente sabedor de que um texto como este não comporta mirabolâncias formais de qualquer espécie, Marcos Caruso impõe à cena uma dinâmica despojada e simples, e que por isso mesmo permite a total apreensão de todos os conteúdos propostos pelo autor. Mas tal mérito, evidentemente, também é fruto da ótima colaboração de todo o elenco.
Na pele de Rita, Suzana Faini exibe uma vez mais sua notável capacidade de obter humor através de grande sutileza, já que consegue proferir frases atrozes como se fossem banalidades. Emílio Orciollo Netto faz muito bem o homossexual Curtis, em especial na sua relação com o corretor - só não entendi sua grande afetação na cena inicial no hospital, já que a mesma desaparece mais adiante; seria uma tentativa de afrontar a família, e em especial o pai, que é homofóbico?.
Zulma Mercadante (Lisa) materializa com sensibilidade uma personagem essencialmente parva, que nos comove por sua extrema fragilidade e desproteção. Pedro Osório também dá vida a um personagem impregnado de grande parvoice, sendo muito engraçadas as passagens em que Brian, ao sentir-se pressionado, faz um grande esforço para ativar seus poucos neurônios. Rose Lima cumpre com eficiência sua pequena participação como a enfermeira, com Rogério Fróes valorizando ao máximo o caráter intempestivo e dilacerado do pai em estado de pré-agonia.
Na equipe técnica, é muito boa a tradução de Juliana Burneiko, sendo corretas as contribuições dos demais envolvidos nesta oportuna empreitada teatral - Alexandre Murucci (cenário), Patrícia Muniz (figurino), Felipe Lourenço (iluminação) e Marcelo Alonso Neves (direção musical).
FAMÍLIA LYONS - Texto de Nicky Silver. Direção de Marcos Caruso. Com Suzana Faini, Emilio Orciollo Netto, Zulma Mercadante, Pedro Osório, Rose Lima e Rogério Fróes. Teatro Glaucio Gill. Sexta a segunda, 20h.
quarta-feira, 27 de maio de 2015
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