terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Teatro/AULAS

Lionel Fischer

Como acho que já mencionei em artigo inserido neste blog, trabalho improvisação com meus alunos, no Tablado, a partir de reflexos, de respostas imediatas aos estímulos propostos – depois, evidentemente, conversamos sobre os resultados. Mas antes de passarmos às oito aulas que se seguem, com um número variável de exercícios, acho importante falar sobre o procedimento padrão que as antecede.
As aulas começam com todos os alunos deitados no palco, literalmente embolados, mas numa posição confortável. Todos têm que estar em contato. Então, coloco uma música, que eles escutam de olhos fechados e podem cantar baixinho, se quiserem.
Em seguida, e em absoluto silêncio, todos se levantam sem pressa e fazendo o menor esforço físico possível. Uma vez que todos já estejam de pé, formamos pares – do mesmo sexo, inclusive – e entra uma nova música, bem lenta. Ela não é para ser dançada: sua finalidade é que os pares permaneçam colados, como se fossem uma só pessoa – isso facilita a perda de timidez, pois o contato físico, no teatro, é essencial.
Finalmente, coloco uma música bem rápida, seja qual for o gênero, e aí os alunos dançam como quiserem, juntos ou separados – o objetivo é soltar o corpo e relaxar se divertindo.
Depois, fazemos uma roda, todos de mãos dadas, pé direito na frente e um aluno puxa o que denominei de “Oração do Teatro” – o aluno fala uma frase e todos a repetem.

“Eu ponho minha mão na sua
Eu junto meu coração ao seu
Para que eu possa conseguir com você
O que eu jamais conseguiria sozinho.
M E R D A!!!” – essa palavra, no teatro, é sinônimo de SORTE!

Então, iniciamos a aula.

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Aula 1

Confiança - Os alunos caminham pelo espaço durante um certo tempo, um deles de olhos fechados e o outro servindo de guia. Depois, trocam de função.

Na parede - Vir até a frente e executar imediatamente o pedido. Sem palavras, apenas uma postura. Em seguida, congelar – esse exercício, obviamente, é uma brincadeira, praticamente impossível de ser materializada corretamente. Mas todos em geral se divertem muito tentando o “impossível”.
1) Sapo apaixonado
2) Eu sou mais eu!
3) Águia troncha
4) Me dá outra chance!
5) Gato gay
6) Nossa, como é grande!?
7) Hipopótamo charmoso
8) Me deixa em paz!

Reação instantânea – eu digo a frase e o aluno deve justificá-la, com toda a seriedade, no prazo máximo de 1 minuto. Por exemplo:

Pagar boquete dá cárie!

Quem come jaca solta puns pavorosos!

Fazer teatro é coisa de veado!

Se chifre fosse flor, a cabeça do Lionel era um jardim!

Quando a jabuticaba é pouca, a gente engole o caroço!

Mesmo quando descansa, o Diabo amola as moscas com o rabo!

O mentiroso, quando diz a verdade, adoece!

Os apaixonados sofrem mais que sovaco de aleijado!

Ida e volta - dois atores, sentados, bem perto. Ofensas em ritmo bem rápido, corpo recua. Depois, voltar proferindo palavras gentis, amorosas, num ritmo lento. Os atores falam um de cada vez.

História de amor - atores lado a lado, em fila. O primeiro começa a relembrar um encontro amoroso que teve com aquele que está ao seu lado. Este retruca. Em seguida, os dois vão para o final da fila. Cada ator só pode usar uma frase, de preferência curta. E o assunto deve evoluir. Mas não vale criar frases disparatadas. A história tem que fazer sentido, mesmo que sua conclusão seja completamente inesperada com relação ao início. Normalmente, rodamos a fila três vezes.

Cantando um trecho de uma música - quatro atores. Cada um canta um trecho de uma música. Depois, cada um repete o trecho cantado como se fosse o texto de uma peça. Na parte falada, variar totalmente as emoções.

Fazendo um jingle - 4 atores no palco. A cada um eu digo um nome. O aluno deve imediatamente fazer uma música curtíssima.

Criando uma história - dois atores iniciam uma cena. No sinal, congelam. Outros dois os substituem e assim por diante. Os que substituem repetem as duas últimas frases. Os alunos escolhem o tema. A cena tem que ter princípio, meio e fim, este determinado pela última dupla. Cada dupla tem que participar pelo menos duas vezes.

Aula 2

Frase que aumenta - 4 duplas, uma de cada vez. A primeira e a última palavra não podem mudar. Exemplo: “Você é muito burra”. “Você, desde ontem, é muito burra”. “Você, desde ontem, depois de negar o que eu pedi, é muito burra”. “Você, desde ontem, depois de negar o que eu pedi, e eu pedi com tanta delicadeza, é muito burra”. E etc. Objetivo: construir a maior frase possível. No final, cada um repete a frase toda com uma intenção diferente (amor, ódio etc.)

Quem sou eu - duplas. O que entra sabe quem ele é, quem é o outro e onde eles estão. O que já está em cena, não. Se o ator que não sabe quem ele é achar que, num dado momento, já sabe, interrompe o exercício e fala. Se errar, é substituído por outro e a cena segue deste ponto em diante.

Cortando palavras – Dou um tema. Por exemplo: separação. Então, quatro duplas fazem a cena, só que a primeira só pode utilizar 4 palavras por fase. A segunda, 3, e assim até chegarmos a um diálogo em que cada aluno só pode dizer uma palavra.

Desfazendo um sonho – individual. Uma jovem de 15, 16 anos, está diante de um espelho, acabando de se arrumar. Vai sair, pela primeira vez, com aquele que julga ser o menino da sua vida. O telefone toca. Ela atende e nada fala, só escuta o rapaz dizer que não poderá vir. Ela volta para o espelho, começa a tirar a maquiagem etc., sem jamais pronunciar uma única palavra.

Aula 3

Strippers - Três homens. Chegam lentamente, ao som de uma música sexy. Se exibem. São os mais famosos e gostosos do planeta. Relação com a platéia.

Strippers - Três mulheres. Coladas no fundo do palco, de costas p/ platéia. Entra uma música sensual e elas começam a se exibir. São as mais famosas e gostosas do planeta.
Relação com a platéia.

Conquista em versos – exercício para duplas. O texto é uma quadrinha e a última palavra da segunda frase tem que rimar com a última da quarta frase. Exemplo:

Quando eu te conheci,
Era inverno,
Você estava linda,
E eu também, de terno.

Memória – duplas. O exercício termina quando algum dado for omitido na seqüência de frases. Exemplo:

Qual o seu nome? Meu nome é Paulo / Mentira. Seu nome é Henrique/ Tem razão. Meu nome é Henrique/ Quantos anos você tem?/ 35 / Mentira. Seu nome é Henrique e você tem 23 anos./ Tem razão. Meu nome é Henrique e eu tenho 23 anos/ Qual a sua profissão?/ Engenheiro/ Mentira. Seu nome é Henrique, você tem 23 anos e é personal training / Tem razão. Meu nome é Henrique, tenho 23 anos e sou personal training/ Você tem namorada?/ Tenho / Mentira. Seu nome é Henrique, você tem 23 anos, é personal training e não tem namorada/ Tem razão. Meu nome é Henrique, tenho 23 anos, sou personal tyraining e não tenho namorada/ Onde você mora?/ Leme/ Mentira. Seu nome é Henrique etc...

Criação em trincas – dividir a turma em grupos de três. Cinco minutos para preparar uma cena que tenha como tema uma frase. Por exemplo: “Nunca mais”. Em algum momento essa frase tem que ser dita. Cenas curtas.

Aula 4

O que está acontecendo? – algo de muito grave está acontecendo fora de cena. Os personagens vão entrando individualmente, sempre que seus nomes são mencionados. E a cada entrada a gravidade do problema aumenta, com o acréscimo de novos dados. A ação se passa na Idade Média, por exemplo, em um castelo que está prestes a ser invadido. Detalhe: os atores têm que lidar com as novidades trazidas como se estivessem totalmente conscientes do perigo que representam. Clima de total seriedade, embora seja muito difícil mantê-lo, já que os personagens que entram têm que repetir o que já foi dito e acrescentar uma nova informação, e o normal é que a partir do terceiro a “memória” comece a falhar.

Anjo – dois personagens e um Anjo, que tanto pode ser do homem como da mulher. O Anjo, necessariamente malvado, contradiz tudo o que a outra pessoa responde. Exemplo:

Ele – Por que você não gosta mais de mim?
Ela – Mas é claro que eu gosto!
Anjo - Mentira! Ela tá saindo com o Paulo!
Ele - E o Paulo?
Ela - Que Paulo?
Anjo - Não seja cínica!

E etc. Ou seja: o Ator passa a conversar seguindo as indicações do Anjo. Pode, se quiser, repetir literalmente sua frase, mas o essencial é seguir suas indicações. O Anjo não é visto nem ouvido pela Atriz. E o Ator, evidentemente, não pode ficar olhando para o Anjo, que na verdade está “dentro dele”, é seu pensamento, sua consciência.

Perdão – Amigas desde a infância, já adultas uma dela se torna amante do marido da primeira. O caso é descoberto. Rompimento. Arrependimento. Tentativas de encontro fracassadas. Anos depois, a que foi traída resolve receber a ex-amiga – começo da cena. Houve suas razões. Há possibilidade de perdão?

Confissão – Filho diante de pai agonizante. Dizer tudo que poderia ter sido dito e não foi, tudo que poderia ter sido agradecido e não foi. Enfim, uma espécie de ajuste de contas com tudo que ficou faltando.

Aula 5

Mudança – oito alunos em um determinado contexto – podem ser náufragos numa ilha, perdidos em um deserto etc. Clima depressivo, de total desesperança, todos num plano baixo. Depois de um tempo, entra o segundo movimento da “Pastoral”, de Beethoven. A depressão dá lugar à esperança (plano médio) e em seguida à euforia (plano alto). O exercício (sem palavras) é muito curto, pois a música é cortada após a terceira repetição do tema.

Encontro inesperado 1 – cafetina, pai e filha. A cafetina diz à garota que hoje ela vai conhecer seu melhor cliente, um homem riquíssimo, de São Paulo. A cafetina sai. A garota está se ajeitando diante de um espelho. O homem entra sem ser notado. Se aproxima. Acaricia a garota. Ela se vira. O homem está diante de sua filha. Falar o mínimo possível, priorizando o impacto e uma enorme dificuldade para lidar com a situação.

Encontro inesperado 2 – reencontro com um grande amor. Ela está sentada em algum lugar público – um bar, por exemplo. Ele a vê. Tiveram um romance muito tempo atrás. Ambos se casaram com outras pessoas. Mas...ele acaba se aproximando e uma grande emoção toma conta dos dois. O que fazer?

Revelação - atendente e pacientes. Todos aguardam o resultado de seus exames. O atendente entra, entrega um envelope para cada um e sai. Alguns recebem um resultado que os condena, outros o contrário. Exercício sem palavras. OBS: o resultado do exame só é conhecido quando o paciente o lê.

Eu te amo – individual. Primeiro, o aluno caminha até o proscênio e diz “Eu te amo” para alguém da platéia. Depois, recua uns passos, volta ao proscênio e torna a dizer “Eu te amo”. Aquela (aquele) a quem foi dirigida a frase pergunta “Por quê?”. O aluno/aluna tem um minuto para justificar seu amor. Em seguida, os demais alunos avaliam se foi convincente tanto o “Eu te amo” como as razões desse amor.

Canastrando no cinema - 4 alunos. Eles não se conhecem. Estão assistindo ao último capítulo de um seriado, como existia há uns 50 anos. A história é narrada por mim, um folhetim desvairado. Eu digo uma frase curta que resume a cena e os alunos reagem. Depois, resumo a cena seguinte e assim por diante. As reações têm que ser as mais exageradas e canastronas possíveis – inclusive e sobretudo corporais – mas sem perder a verdade. Todos devem agir como se estivessem realmente sentindo visceralmente todas as emoções do seriado.

Aula 6

Interpretando anúncios - Individual. O aluno abre um jornal numa página, escolhe qualquer anúncio e o lê de três maneiras diferentes, variando as emoções.

Trios – chamar nove alunos, eles se dividem em três grupos. Cada grupo escolhe uma letra. Os grupos têm três minutos para bolar uma cena que gire em torno das três palavras e a cena deve obedecer a ordem das palavras. OBS: os alunos não podem saber a sequencia de uma determinada letra.

A (angústia/alívio/amor)
B (busca/bondade/beijo)
C (carência/carícia/crítica)
D (dívida/dádiva/dúvida)
E (esperança/espera/escrotice)
F (fuga/fartura/felicidade)
G (gozo/graça/gruta)
H (história/histeria/habitação)
I (intriga/incólume/imitação)
J (jogo/justiça/jaca)
L (liberdade/luxúria/limite)
M (mocidade/mania/mistura)
N (negação/novidade/nudismo)
O (orgasmo/organização/obsoleto)
P (pecado/penúria/pena)
Q (querer/queimadura/queijo)
R (raiva/rosto/rumo)
S (sonho/saudade/solidão)
T (teimosia/tesão/tempo)
U (único/última/ultimato)
V (vitória/ vontade/ volúpia)
X (xuxu/ xepa/xispa)
Z (zona/zodíaco/zero)

Ampliando a cena – duas duplas. A primeira entra, ator/atriz, cada um de um lado. No sinal, correm e se abraçam. Depois, trocam duas ou três palavras. Congelam. A segunda dupla entra, mesma posição, prossegue com o diálogo. A 1ª dupla desarma e assiste. No sinal, a 2ª dupla congela e a primeira continua a cena a partir do ponto em que a 2ª dupla chegou. E assim por diante. Quando a cena chegar ao final, repetir tudo que foi feito com cada uma das duplas, tentando manter mais ou menos o mesmo texto e as mesmas posições.

Escultura – oito alunos. Ao som de uma música triste, todos vão formando a escultura movidos pelo mesmo sentimento. O resultado deve estar em sintonia com a dramaticidade da música. Depois de pronta a escultura, saem um a um, na ordem inversa. O último que entra é o último que sai.

Aula 7

Encontro bizarro - um processo de conquista. Num bar. Um casal não consegue completar uma frase, ou porque um deles é interrompido ou porque efetivamente não sabe concluir o que iniciou.

Criando uma história – cinco atores no palco, isolados. Outros cinco bem próximos. O primeiro diz sua frase, alguém entra com outra, a pessoa retruca e o que entrou diz mais uma. Congelam, mantendo o clima. Quando as cinco duplas tiverem terminado, voltamos à primeira. Eles repetem o diálogo e avançam mais duas frases. Na terceira rodada, com mais duas frases para cada um, a cena termina. Todas as frases são curtas. Exemplo:

Você me acha engraçado.
Ele nunca mais foi visto.
Na primavera eu volto.
São coisas que acontecem.
Teu sorriso é tão lindo.

Uma pessoa no meio – de pé ou sentados (os três lado a lado), os dois intérpretes das extremidades contam, alternadamente, histórias à pessoa do meio, valendo-se de frases curtas. O trabalho do ouvinte é dar a mesma atenção aos dois contadores e reter na memória o máximo que conseguir das duas histórias. No final, a pessoa do meio deve tentar resumir as duas histórias que lhe foram contadas.

Aula 8

Carona com atitude – Motorista e passageiros. O primeiro que entra o faz com um sentimento muito claro. O segundo entra, também com um sentimento muito claro. O primeiro assume este sentimento. Entra um terceiro, sentimento claro. Os outros dois passam a adotar o mesmo sentimento do terceiro e assim por diante. Sem palavras.

Aborrecimento – Sem palavras. Dois desconhecidos estão sentados lado-a-lado em uma apresentação (palestra, concerto ou uma peça). Um deles começa a aborrecer o outro ao demonstrar um hábito ou traço irritante, como bater os pés no chão, chupar os dentes com a língua, pigarrear etc. O incômodo deve começar com sutileza e ir aumentando. O que chateia faz de propósito, mas tenta ao máximo que o outro não perceba isso.

Pecados capitais – Grupos. Cada grupo terá 5 minutos para bolar uma cena sobre um determinado pecado (Luxúria, Avareza, Soberba, Gula, Inveja, Ira e Preguiça). Detalhe: todas as cenas terão que ser cômicas.

Linha cruzada 1 – um casal está brigando no telefone. Uma terceira pessoa tenta ligar para alguém, mas a linha cruza e ela passa a ouvir a conversa. Começa a interferir, o casal se irrita. Mas o intrometido não desiste e suas intervenções acabam contribuindo para que o casal se separe.

Linha cruzada 2 – a mesma proposta. Só que agora, as intervenções do abelhudo acabam fazendo com que o casal se reconcilie.

Efeito contrário – seis machões estão na super suíte de um motel à espera de seis super garotas de programa. É a despedida de solteiro de um deles. Ele incentiva os outros a tomar um novo medicamento, importado da Noruega, e ainda não disponível no mercado, cujo efeito seria três vezes superior ao do Viagra. Todos tomam, animadíssimos. Mas logo começa a se notar uma curiosa mudança no comportamento no grupo. De super machões, eles passam a exibir, pouco a pouco, evidentes sinais de boiolice. Ir num crescendo e quando eu disser “congela”, todos se imobilizam. O quadro final deve ser a antítese do que os atores passavam no início da cena.

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