quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

Tchékhov e o Teatro de Arte de Moscou
Jovan Hristic*

Comecemos por alguns fatos bem conhecidos. A 17 de Setembro de 1896, A Gaivota conhece um estrondoso insucesso em
São Petersburgo. É o terceiro drama de Tchékhov representado num teatro. O primeiro, Ivánov, teve um certo sucesso em Moscou, no ano de 1887. O segundo, O Selvagem, levado à cena em 1889, só teve três representações. Tchékhov não era, portanto, um autor dramático principiante. 

A Gaivota não foi montada por amadores, nem por uma companhia fabricada às pressas num teatro comercial em São Petersburgo. Foi encenada no Teatro Imperial, por atores famosos na época. O papel de Nina Zaretchna era interpretado por Vera Kommissarjévskaia, uma jovem atriz que a seguir se tornará uma das mais célebres atrizes russas. Além disso, ao que parece, conseguiu ser a melhor Nina de todas as que pisaram os palcos da Rússia.

Se deixarmos de lado as consequências psicológicas que terá para o autor, este fracasso de A Gaivota é interessante por dois motivos. A acreditar nos testemunhos que nos restam, A Gaivota foi encenada como se encenava qualquer drama realista do fim do século XIX: ou seja, como um enredo de amores entre uma rapariga, um escritor famoso, amante de uma atriz famosa e mais velha, e o filho desta última que pretende, também ele, tornar-se escritor. Não admira que a peça tenha sido vaiada: A Gaivota constituía um passo decisivo rumo a uma dramaturgia absolutamente nova, para a qual o teatro da época não estava, é mais do que óbvio, ainda preparado. É preciso lembrar também que Tchékhov não era um autor particularmente apreciado nos meios intelectuais da Rússia.
Sobretudo no seio dos intelectuais de São Petersburgo, que se queriam liberais. A seu ver, ele não se comprometia suficientemente.

Encontramos em Tchékhov um testemunho acerca do modo como na altura se concebia o engajamento literário. No seu conto No Carrinho de Bebé, de 1883, o barão Donkel (Tchékhov gostava de colocar afirmações na boca da qual menos se esperavam) diz, a propósito de Turguéniev: “Ontem, fui expressamente buscar os Relatos de um Caçador à biblioteca; li-os duma ponta à outra e não encontrei nada de especial... Nem consciência de si, nem liberdade de imprensa... nem ideias de nenhuma espécie! E nem sequer se aprende nada sobre a caça!”. A crítica russa dos anos 80 e 90 do século XIX comparava frequentemente Tchékhov com Turguéniev: eram ambos considerados artistas inúteis à sociedade. É tudo isto
que devemos ter em conta quando falamos das relações entre Tchékhov e o Teatro de Arte de Moscou.

O Teatro de Arte de Moscou encenou A Gaivota dois anos mais tarde, com estreia a 17 de Dezembro de 1898. Foi o primeiro
sucesso de um teatro que acabara de ser fundado e, diga-se o que se disser acerca das relações com Tchékhov, uma coisa pelo menos é certa: com essa representação, um escritor encontrara finalmente o seu teatro e um teatro encontrara o seu escritor. O Teatro de Arte de Moscou estava pois fundado, como o antigo Khoudojestvienni opchedostoupni Teatr, sendo que o termo “opchedostoupni” (universalmente acessível) deve ser compreendido no sentido que atualmente atribuímos à palavra “popular”. O que tem grande relevância para o que vou dizer a seguir.

Podemos perguntar-nos se Stanislavski e Nemiróvitch-Dántchenko, fundadores e encenadores do Teatro de Arte, percebiam bem os dramas de Tchékhov. Neste ponto, as opiniões divergem, mesmo na Rússia soviética, onde a teoria idílica de um acordo perfeito entre o grande encenador Stanislavski e o grande escritor Tchékhov é, digamos, uma versão oficial. Assim, A. Roskine afirma, no seu estudo As Três Irmãs no Palco do Teatro de Arte, que Tchékhov e o Teatro de Arte “se encontraram no mesmo caminho, mas seguindo em direcções diferentes. Numa época em que o teatro de Stanislavski ia do pathos teatral para o realismo de todos os dias, Tchékhov, pelo seu lado, dirigia-se da vida de todos os dias para uma poesia e uma utilização mais livre da matéria da vida”. 

Hoje, a maioria dos críticos subscreveriam a opinião de Roskine. Em todos os debates sobre Tchékhov, a seguinte constatação transformou-se num lugar-comum: o naturalismo de Stanislavski era demasiado estreito para abarcar a visão da vida humana com que nos deparamos nos dramas tchekhovianos. No entanto, as coisas não são tão simples como por vezes podem parecer. Por isso, convém recordar alguns outros fatos. 

Antes de mais, Tchékhov estava longe de se sentir entusiasmado com as representações que vira das suas peças no Teatro de Arte. Só assistira à representação de A Gaivota na Primavera de 1899, quando os médicos o autorizaram a deixar Ialta para uma curta estada em Moscou. E, como escreve Stanislavski no seu livro A Minha Vida na Arte, “a cada fim de ato, Anton Pávlovitch subia ao palco e o seu rosto andava longe de refletir uma satisfação intensa”. Alguns dias depois da representação, Tchékhov escreve a Máximo Górki que “A Gaivota estava horrivelmente representada” e que Trigorin (papel desempenhado por Stanislavski) “percorria o palco a falar como um paralítico”. No conjunto “não está mal, achei interessante”, mas aqui e ali “não conseguia acreditar que fosse eu o autor”.

Quando, em 1900, o Teatro de Arte monta As Três Irmãs, Tchékhov escreve emocionado e como que ofegante a Olga Knipper: “Preciso ir assistir aos ensaios, preciso! Não posso deixar a Alexeev [Stanislavski] a responsabilidade de quatro papéis femininos, quatro jovens mulheres inteligentes, por muito grande que seja a minha confiança e a sua inteligência”. Mas o verdadeiro conflito rebenta em torno de O Cerejal. Tchékhov estava convencido de que tinha escrito uma comédia, e mesmo um vaudeville, quando o Teatro de Arte representava a peça como um drama. Assim, escreve ele a Olga Knipper (que então já era sua esposa): “Manifestamente, o Nemiróvitch e o Alexeev vêem algo na peça que lá não está e eu era capaz de jurar que não a leram atentamente”.

Todavia, os testemunhos não são concordantes. Uns dias depois de ver a representação de A Gaivota e de ter escrito a Górki que lhe custava a acreditar ser o autor da peça, Tchékhov escreve a Iordanov, médico de Taganrog, que “a representação foi excelente”. Claro que as declarações dos autores acerca das representações das suas próprias peças nem sempre devem ser tomadas à letra; mas isto mostra, em todo o caso, que as relações de Tchékhov com o Teatro de Arte não eram simples.

Embora teime em escrever que Alexeev e Nemiróvitch atraiçoam os seus dramas, não os confia a nenhum outro teatro; além disso, o seu período de criação mais intenso começa precisamente após o sucesso de A Gaivota no Teatro de Arte de Moscou: em menos de quatro anos, escreve dois dos seus dramas maiores, As Três Irmãs e O Cerejal. Até aí, as fases em que não escrevia para teatro eram muito mais longas. O que tende a provar que, apesar dos desacordos e dos mal-entendidos, Tchékhov sabia perfeitamente que o Teatro de Arte era a companhia que melhor podia interpretar os seus dramas e exprimir melhor o que distinguia a sua dramaturgia do drama realista clássico.

Obviamente que o Teatro de Arte tinha uma postura marcadamente naturalista e que Stanislavski gostava de sobrecarregar a encenação de detalhes que hoje podem parecer-nos ridículos. Assim, por exemplo, no início de A Gaivota – a acreditar num diário de bordo de Stanislavski – ouve-se uma série de sons destinados a fazer com que o espectador se sinta à beira de um lago rodeado de propriedades rurais: o canto de um bêbedo, o ladrar de um cão, o grasnar das rãs, o grito de um pássaro dos pântanos, os sinos de uma igreja, a queda de uma faísca, o ribombar de um trovão... Stanislavski prepara- se para oferecer ao público uma orgia de sons realistas semelhante, no segundo ato de O Cerejal; Tchékhov escreve-lhe ironicamente: “A colheita dos fenos teve lugar entre 20 e 25 de Junho; nesse período, as águas pararam de cantar e as
rãs também perderam o pio. Já só resta o verdelhão”.

No mesmo ato de O Cerejal, Stanislavski quer fazer passar um comboio ao fundo da cena. Tchékhov aceita o comboio, “se
o comboio puder passar sem fazer barulho”. No primeiro ato de O Tio Vânia, a personagem de Voinítski [Vânia] tem de usar uma espécie de rede de mosquiteiro na cabeça, enquanto as outras personagens devem estar sempre a dar palmadas na cara e nas mãos, a coçar-se, a fumar e bufar nuvens de fumo em seu redor para se protegerem dos insetos invasores. Graças a Nemiróvitch-Dántchenko, os mosquitos deixam de atormentar os heróis de Tchékhov, que podem finalmente entregar-se a tarefas mais importantes.

Por outro lado, com o seu gosto pelos efeitos e pela sobrecarga, Stanislavski arrastava por vezes os dramas tchekhovianos para o terreno do melodrama. Na encenação de A Gaivota, Trigorin era um dandy elegante, um grande sedutor melodramático, devastador dos corações femininos. Tchékhov lembrou a Stanislavski que o seu Trigorin usava umas calças aos quadrados e tinha um buraco na sola. Stanislavski confessa em A Minha Vida na Arte que precisou de vários anos para perceber o sentido da intervenção de Tchékhov: Trigorin é um medíocre e anda desajeitadamente vestido; a ingênua e provinciana Nina não se apaixona por um playboy irresistível, mas sim pela sua visão idealizada de um escritor famoso.

No quarto ato de As Três Irmãs, Stanislavski queria que carregassem com o cadáver em cena; isso provocou um verdadeiro
conflito com Tchékhov, que acabou por triunfar – o cadáver não apareceu em palco. O terceiro ato de O Cerejal também era encenado à maneira do melodrama por Stanislavski: uma Ranévskaia desesperada, um Gáev despreocupado, um Lopákhin grosseiro e fanfarrão que derrubava um candelabro, num gesto de teatralidade já caído em desuso.

Que poderíamos, hoje, censurar a Stanislavski? Decerto o fato de ter, no nosso entender, socializado (para não dizer politizado)
exageradamente os dramas de Tchékhov. Tornou-os muito mais comprometidos politicamente do que o são, transformou-os não apenas numa crítica aberta da sociedade como numa espécie de melodramas sociais repletos de ideias progressistas. Nos dramas de Tchékhov, Stanislavski viu sobretudo indivíduos excepcionais, confrontados com uma vida quotidiana sufocante, com uma realidade brutal aniquiladora dos bons sentimentos e das ambições nobres; homens de valor, vítimas de um meio que não permite a plena realização das suas aspirações. E, em O Cerejal, a visão de uma vida nova que advirá e já emerge nos escombros do velho mundo. 

Numa palavra, dir-se-ia que Stanislavski ignorou completamente todas as ambiguidades e as nuances que hoje descobrimos nos dramas de Tchékhov, tudo aquilo que o incitou – e ele sabia
muito bem o que fazia – a chamar “comédias” a A Gaivota e a O Cerejal. Se é verdade que os heróis tchekhovianos se encontram minados por uma vida cinzenta e monótona e por uma sociedade estéril, não é menos certo que Voinítski nunca teria chegado a ser um Schopenhauer ou um Dostoievski, assim como o mano das três irmãs nunca teria chegado a ser um sábio; as questões levantadas por estes dramas não dizem respeito às qualidades de uma determinada sociedade, são inequivocamente problemas da existência humana.

Tudo isto é verdade. Há no entanto outra coisa que não deve ser negligenciada. Com efeito, não há dúvida que Stanislavski
e Nemiróvitch-Dántchenko encontraram a verdadeira chave do jogo dos dramas tchekhovianos. Durante os ensaios de A Gaivota, no Teatro Imperial de São Petersburgo, Tchékhov dizia que, em cena, não se devia representar, devia-se viver. Ora, isso tornar-se-á precisamente a ideia-chave da representação das peças no Teatro de Arte, o imperativo do método seguido por Stanislavski nas suas encenações. Claro que o “viver em cena” de Tchékhov só pode ser compreendido num contexto histórico perfeitamente preciso; o que o Teatro de Arte pretendia era descobrir umas tantas verdades psicológicas e outros tantos valores humanos que não podiam ser expressos pelo velho teatro. 

Na maneira como Stanislavski encenava Tchékhov, hoje vemos um naturalismo psicológico e cênico disseminado numa infinidade de pormenores que já não se nos afiguram indispensáveis. E os tempos de pausa, demasiado longos, parecem-nos lentidões inadmissíveis mais do que propriamente a expressão eficaz de emoções profundas. 

Porém, acho que esta maneira de representar, com todos os seus limites, hoje evidentes, fez precisamente compreender, pelo menos em parte, a verdadeira natureza da dramaturgia de Tchékhov.
Também não há dúvida de que o naturalismo do Teatro de Arte se revelou um quadro demasiado estreito para os dramas tchekhovianos, em que a imagem da vida não passa de um primeiro nível de leitura, um princípio e de modo nenhum um fim. Mas não é menos certo que, nos finais do século XIX, o teatro naturalista era o único teatro que discutia seriamente o homem, a sua vida e os seus valores. Os dramas de Tchékhov não eram bem compreendidos nesse teatro, mas convém não esquecer que no teatro que precedeu o naturalismo, e contra o qual este foi uma reação inevitável, o eram ainda menos. 

Por último, as representações teatrais não se fazem no espaço vazio da análise literária ou estética, fazem-se no espaço que aqueles que vão ao teatro esperam. O Teatro de Arte fora fundado com a intenção de ser um teatro popular que oferecesse aos espectadores não apenas uma imagem mas também uma crítica da vida. Uma das primeiras peças que Stanislavski e Nemiróvitch-Dántchenko tinham inscrito no seu repertório era Hanneles Himmelfahrt, de Gerhart Hauptmann, que não chegou a estrear-se por ter sido proibida pela censura. Se A Gaivota de Tchékhov entrou para o repertório do Teatro de Arte, foi porque Nemiróvitch-Dántchenko achou que “nela batia a pulsação da vida russa”. De resto, teriam os dramas de Tchékhov podido ser diversamente encenados, num clima em que a necessidade de mudanças sociais radicais roçava a explosão? 

Se hoje criticamos o naturalismo do Teatro de Arte e o seu desejo de nos mostrar os dramas de Tchékhov como sendo mais engajados do que realmente são – mediante uma espécie de simplificação da sua dramaturgia, que todavia contém verdades mais profundas e mais importantes –, não devemos perder de vista que, na época, um Tchékhov diferente, mais complexo, mais irônico e mais ambíguo, pura e simplesmente não teria sido percebido. E é bem possível que tivesse sido vaiado, como foi vaiado o Tchékhov melodramático de São Petersburgo, em 1896.

Atualmente, vemos outra coisa em Tchékhov e julgamos ter razão. Em O Cerejal, a cerejeira tornou-se para nós um símbolo, tal como o armário centenário ao qual Gáev dirige o seu célebre discurso. Mas o Teatro de Arte representava os dramas tchekhovianos numa época em que nem a cerejeira nem o armário eram puros símbolos, já que se tratavam de realidades palpáveis: todos os dias se vendiam cerejeiras, tal como centenas de velhos armários. Não será inútil pois recordar as palavras de T.S. Eliot: “A propósito de um escritor tão grande como Shakespeare, provavelmente nunca teremos razão; por conseguinte, talvez seja preciso mudar, de vez em quando, a nossa maneira de não termos razão”.
* “Tchekhov et le Théâtre d’Art de Moscou”. Théâtre en Europe. Nº 2 (Avr. 1984). p. 26-30.
Trad. Regina Guimarães.
Publicado em:
O Tio Vânia: [Programa]. Porto: Teatro Nacional São João, 2005. (Cadernos Tchékhov; vol. 1

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

A tortura:
o que é e como evoluiu na História

“A tortura deixou, para sempre, de existir”, dizia Victor Hugo, em 1874. Infelizmente, o século XX demonstra que o escritor francês se equivocou. Segundo dados da Anistia Internacional, a tortura física, moral e psicológica é hoje sistematicamente aplicada – ou pelo menos tolerada – por governos de 60 países.
A 10 de dezembro de 1948, A Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) aprovou a Declaração Universal dos Di­reitos Humanos, cujo artigo 5º reza:

Ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante.

Atualmente, em mais de um terço dos países signatários da Carta Magna dos Direitos Humanos, a tortura é parte substancial dos métodos interrogatórios da polícia e das forças militares, sendo praticada para se obter informações, humilhar, intimidar, aterrori­zar, punir ou assassinar prisioneiros políticos e comuns.

O que é a tortura

A tortura foi definida pela Associação Médica Mundial, em assembléia realizada em Tóquio, a 10 de outubro de 1975, como:

“a imposição deliberada, sistemática e desconsiderada de sofrimento físico ou mental por parte de uma ou mais pessoas, atuando por própria conta ou seguindo ordens de qualquer tipo de poder, com o fim de forçar uma outra pessoa a dar informações, confessar, ou por outra razão qualquer”.

O psicanalista Hélio Pellegrino observa que “a tortura busca, à custa do sofrimento corporal insuportável, introduzir uma cunha que leve à cisão entre o corpo e a mente. E, mais do que isto: ela procura, a todo preço, semear a discórdia e a guerra entre o corpo e a mente. Através da tortura, o corpo torna-se nosso inimigo e nos persegue. É este o modelo básico no qual se apóia a ação de qualquer torturador. (...) Na tortura, o corpo volta-se contra nós, exigindo que falemos. Da mais íntima espessura de nossa própria carne, se levanta uma voz que nos nega, na medida em que pre­tende arrancar de nós um discurso do qual temos horror, já que é a negação de nossa liberdade. O problema da alienação alcança, aqui, o seu ponto crucial. A tortura nos impõe a alienação total de nosso próprio corpo, tornando estrangeiro a nós, e nosso inimigo de morte. (...) O projeto da tortura implica numa negação total – e totalitária – da pessoa, enquanto ser encarnado. O centro da pessoa humana é a liberdade. Esta, por sua vez, é a invenção que o sujeito faz de si mesmo, através da palavra que o exprime. Na tortura, o discurso que o torturador busca extrair o torturado é a negação absoluta e radical de sua condição de sujeito livre. A tor­tura visa ao avesso da liberdade. Nesta medida, o discurso que ela busca, através da intimidação e da violência, é a palavra aviltada de um sujeito que, nas mãos do torturador, se transforma em objeto”.

Enfim, é tortura tudo aquilo que deliberadamente uma pessoa possa fazer a outra, produzindo dor, pânico, desgaste moral ou desequilíbrio psíquico, provocando lesão, contusão, funcionamento anormal do corpo ou das faculdades mentais, bem como prejuízo à moral.

No Brasil, no período compreendido por este estudo (1964-1979), a tortura foi sistematicamente aplicada aos acusados de atividades consideradas “subversivas”. Entretanto, a incidência retratada nos procedimentos judiciais é bem menor que a sua real extensão e intensidade. Isso porque os Conselhos de Justiça Militar, via de regra, evitavam que as denúncias de torturas fossem consignadas aos autos das ações penais. Quando toleravam incorporá-las, o faziam de forma superficial, simplificada, genérica, demonstrando, assim, conivência com o comportamento criminoso dos órgãos de segurança do Estado. Raros os juizes-auditores que fizeram consig­nar nos autos a descrição pormenorizada das sevícias sofridas pelos réus e os nomes de seus algozes.

Muitas vezes as vítimas da tortura, por sua própria vontade ou aconselhadas por familiares, agrupamentos políticos ou advogados de defesa, optaram por silenciar, em seus interrogatórios na Justiça, sobre as torturas que padeceram, temendo, como a muitos sucedeu, que a denúncia induzisse a uma condenação antecipada. Muitos não falaram de seus sofrimentos com medo de retornarem às sessões de tortura, como ocorreu inúmeras vezes. No entanto, os que ousaram descrever os suplícios de que foram vítimas, os modos e os instru­mentos de tortura, os locais, a assistência médica e os nomes dos torturadores, e tiveram suas palavras consignadas nos autos pro­cessuais pela própria voz autorizada do Tribunal Militar, permitiram constatar que, no Brasil de 1964 a 1979, a tortura foi regra, e não exceção, nos interrogatórios de pessoas suspeitas de atividades con­trárias aos interesses do Regime Militar. Tal prática generalizada encontra amparo e fundamento ideológico na Doutrina de Segurança Nacional.

Evolução histórica da tortura

Ao longo dos séculos, a tortura era um direito do senhor sobre os escravos, considerados coisas, ou foi aplicada como pena advinda de sentenças criminais, O apedrejamento, o chumbo derretido na pele, a decepção de órgãos, eram penas impostas a infratores ou supostos infratores das leis e visavam obediência ao princípio do Talião, resumido pelo célebre axioma “olho por olho, dente por dente”, e tinham como fundamento o ressarcimento do mal causado através da aplicação do mesmo mal a quem o causara. Já o Código de Hamurabi, ordenamento legal do século 18 antes de Cristo, ado­tado na Babilônia, previa para os criminosos a empalação, a fo­gueira, a amputação de órgãos e a quebra de ossos.

A lei mosaica, do Antigo Testamento, defendia os escravos das arbitrariedades: “Se alguém ferir o seu escravo ou a sua serva com uma vara, e o ferido morrer debaixo de sua mão, será punido” (Êxodo 21,20). Entretanto, o livro do Eclesiástico admite a tortura dos escravos (“Jugo e rédea dobram o pescoço, e ao escravo mau torturas e interrogatório”, 33,27), embora defenda a dignidade deles (“Tens um só escravo? Trata-o como a um irmão, pois necessitas dele como de ti mesmo”, 33,32).

No Novo Testamento, o açoite aparece como a sevícia mais comum aos acusados de delitos, O apóstolo Paulo chega a apelar à sua cidadania romana para livrar-se da tortura (Atos dos Apósto­los 22,24). O Direito romano admitia a tortura, pois o processo baseava-se na auto-acusação e na confissão dos suspeitos, e não nas provas e nas testemunhas.

Em fins do século II, Tertuliano, na obra De Coruna, exorta os soldados convertidos ã fé cristã a evitarem praticar torturas. Dois séculos depois, Lactâncio, em sua Divinae Institutiones, escreve elo­quentes páginas contra a tortura, “por ser contra o direito humano e contra qualquer bem”. Já Santo Agostinho, na De Civitate Dei, escrita entre os anos 412 e 416, não chega a condenar a inclusão da tortura no Direito Romano, mas repudia sua aplicação, por tratar-se de pena imposta a quem não se sabe ainda se é culpado.

Pouco antes de Agostinho, em 382, o Sínodo Romano, presidido pelo Papa Dâmaso, remete alguns cânones aos bispos da Gália, entre os quais se declara expressamente que não são livres de pecado os funcionários civis que “condenaram pessoas à morte, deram senten­ças injustas e exerceram a tortura judiciária”. Apenas vinte anos após aquele sínodo ocorre uma virada no pensamento do magistério pontifício da Igreja. O Papa Inocêncio I (401-417) escreve em sua Epístola VI: “Pediram-nos a opinião sobre aqueles que, após have­rem recebido o batismo, tiveram cargos públicos e exerceram a tortura, ou aplicaram sentenças capitais. A este respeito nada nos foi transmitido”. Iniciava-se, pois, o consentimento implícito às normas processuais romanas, apesar da suposta cristianização do Império. Entendia-se que a Igreja não podia reprovar o uso da espa­da no Direito penal, uma vez que isso decorria da própria “vontade de Deus”. E considerando que o Estado, após Constantino, contava com um número sempre maior de funcionários cristãos, exigir que se mantivesse frente a ele a mesma atitude critica de Tertuliano, de Lactâncio, de Agostinho e de todos que sentiram de perto a per­seguição, significava – aos olhos da nova teologia do poder – impedir a justiça penal de seguir o seu curso “normal”.

Com as invasões bárbaras, a tortura diminuiu e as fontes conhe­cidas só retomam o tema por ocasião da conversão dos búlgaros, em 866. A eles escreve o Papa Nicolau I, para esclarecê-los sobre questões dogmáticas e morais, entre as quais o costume que tinham, antes de abraçar a fé cristã, de torturar os criminosos. O Papa insiste na supressão da tortura, acentuando que a confissão deve ser espontânea, pois a tortura não é admitida “nem pela lei divina e nem pela lei humana”. Recomenda ainda que, em lugar de suplícios, apele-se às testemunhas e exija-se o juramento sobre os Evangelhos.

A reintrodução da tortura aos processos penais

No século XII, o Direito penal do Ocidente retoma princípios do Direito Romano imperial e reintroduz a tortura judiciária, apesar de, à mesma época, afirmar o Decretum Gratiani: “A confissão não deve ser obtida pela tortura, como escreve o Papa Alexandre”.

No século seguinte, a tortura passa a fazer parte dos códigos processuais, especialmente nos Estados centralizados, como Castella de Afonso X, a Sicília de Frederico II e a França de Luis IX. Simul­taneamente a Igreja passa a admitir o uso processual da tortura. Em 1244, o Papa Inocêncio IV aprova a legislação penal de Fre­derico II e, em 1252, em seu Ad Extirpanda, aceita que “os hereges, sem mutilação e sem perigo de vida podem ser- torturados a fim de revelar os próprios erros e acusar os outros, como se faz com os ladrões e salteadores”. fl o retomo oficial ao sistema penal ro­mano, fundado na auto-acusação e na confissão do réu. Essa trágica involução reflete-se na obra do maior pensador medieval, Tomás de Aquino. Em fins do século XIII, ao tratar das injúrias contra as pessoas, na parte moral da Suma Teológica (questão 64), ele se refere à mutilação, à flagelação dos filhos e dos servos e ao encar­ceramento. Mas não menciona a tortura, exceto em sua Expositio super Job: “Sucede às vezes que, quando um inocente é acusado falsamente perante um juiz, este, para descobrir a verdade, o sub­mete à tortura, agindo segundo a justiça; mas a causa disso é a falta de conhecimento humano”) São Tomás admite pois que, não havendo outro recurso para se apurar a verdade, é justa a aplica­ção da tortura, mesmo sobre um inocente. Tal posição inaugura, na Igreja, a adoção da tortura como prática sistemática de preser­vação da disciplina religiosa. Ela passa a ser oficialmente aceita nos processos de heresia, não obstante não se recomende sua apli­cação direta por religiosos, padres e bispos.

A Inquisição e a Doutrina de Segurança Nacional

A mais notória obra sobre o uso da tortura pela Igreja é O Manual dos Inquisidores, de Nicolau Emérico (1320-1399). No capítulo 3, “Sobre o interrogatório do Acusado”, o inquisidor reco­menda: “aplicar-se-lhe-á a tortura, a fim de lhe poder tirar da boca toda a verdade”. O capítulo 5 traz como título “Sobre a tortura”, e tem como frase introdutória: “Tortura-se o Acusado, com o fim de o fazer confessar os seus crimes”. Quem tortura, os eclesiás­ticos ou o braço secular? A esta indagação responde o frade ita­liano que comandou a Inquisição na região espanhola de Aragón:

“Quando começou a estabelecer-se a Inquisição, não eram os Inquisidores quem aplicavam a tortura aos Acusados, com medo de incorreram em irregularidades. Esse cuidado incum­bia aos juizes leigos, conforme a Bula Ad Extirpanda, do Papa Inocêncio IV, na qual esse Pontífice determina que devem os Magistrados obrigar com torturas os Hereges (esses assassi­nos das almas, esses ladrões da fé cristã e dos sacramentos de Deus) a confessar os seus crimes e a acusar outros hereges seus cúmplices. Isto no princípio; posteriormente, tendo-se verificado que o processo não era assaz secreto e que isso era inconveniente para a fé, achou-se que era mais cômodo e salutar atribuir aos Inquisidores o direito de serem eles mesmos a infligir a tortura, sem ser preciso recorrer aos juizes leigos, sendo-lhes ainda outorgado o poder de mutua­mente se relevarem de irregularidades em que às vezes, por acaso, incorressem.

“De ordinário utilizam os nossos Inquisidores cinco espécies de tormentos no decorrer da tortura. Como isso são coisas sabidas de toda a gente, não irei deter-me neste assunto. Podem consultar-se Paulo, Grilando, Locato, etc. Já que o Direito Canônico não prevê particularmente este ou aquele su­plicio, poderão os juizes servir-se daqueles que acharem mais aptos para conseguirem do acusado a confissão de seus cri­mes. Não se deve, porém, fazer uso de torturas inusitadas. Marcílio menciona catorze espécies de tormentos: acaba por afirmar que imaginou ainda outros, como seja a privação de sono, também referida e aprovada por Grilando e Locato. Mas, se me é permitido dizer a minha opinião, isso é mais trabalho de carrascos do que tratado de Teólogos.

“É por certo um costume louvável aplicar a tortura aos cri­minosos, mas reprovo veemente esses juizes sanguinários que, por quererem vangloriar-se, inventam tormentos de tal modo cruéis que os Acusados morrem durante a tortura ou acabam por perder alguns dos membros. Também Antônio Gomes condena violentamente esse procedimento”.

No Brasil, de 1964 a 1979, os métodos de interrogatórios e o sistema processual baseados na Doutrina de Segurança Nacional pa­recem advir da Inquisição medieval. Esta também instigava a dela­ção entre parentes (“em matéria de heresia, o irmão pode teste­munhar contra o irmão e o filho contra o pai”), reduzia o número de testemunhas (“bastam dois testemunhos para condenar definiti­vamente em matéria de heresia”), aceitava delações anônimas (“não deverão tornar-se públicos os nomes das testemunhas, nem dá-los a conhecer ao Acusado”). Compare-se ainda o modo de se proceder ao interrogatório de presos políticos às “principais manhas que o Inquisidor deve empregar contra as manhas dos hereges:

1. Através de repetidas interrogações, obrigá-los a responder claramente e de forma precisa às questões formuladas.

2. Se se vier a presumir que um Acusado, acabado de prender, tem intenção de esconder o seu crime (o que é fácil de desco­brir antes do interrogatório, seja por meio dos carcereiros, seja por pessoas mandadas para espiar o Acusado), será então necessário que o Inquisidor fale com muita doçura ao Herege, lhe dê a entender que já sabe de tudo.

3. Se um Herege, contra o qual não foram ainda fornecidas provas suficientes de culpa, mesmo que haja bastos indícios, continuar a negar, fará o Inquisidor com que ele compareça e far-lhe-á perguntas ao acaso. Logo que o Acusado haja ne­gado qualquer coisa, lançará mão da Ata em que se contêm os interrogatórios precedentes. Poderá folheá-los e dirá: “É muito claro que me estás a esconder a verdade, deixa de estar a dissimular”. Tudo de forma a que o Condenado julgue estar já reconhecido como culpado e que na Ata estão con­tidas provas contra ele. (...).

4. Se o Acusado teimar em negar o seu crime, deverá o In­quisidor dizer-lhe que vai partir brevemente para longe, que não sabe quando virá, que lhe desagrada o ter que se ver obrigado a deixá-lo apodrecer nas prisões, que bem desejava tirar a limpo toda a verdade de sua boca, a fim de o poder mandar embora e dar por findo o processo. Mas, já que ele se obstina em não querer confessar, que o vai deixar a ferros até o seu regresso, que tem pena dele por lhe parecer de saúde delicada, que possivelmente irá adoecer, etc.

5. Se o Acusado continuar a negar, multiplicará os interrogatórios e as interrogações. E desta forma, ou o Acusado há de confessar, ou há de dar respostas diversas. Se der várias res­postas diferentes, é o bastante para o conduzir à tortura.

6. Se o Acusado persistir na negação, pode o Inquisidor falar-lhe com doçura, tratá-lo com um pouco mais de atenções no respeitante à comida e à bebida, fazer também com que algu­mas pessoas de bem o vão visitar e conversem com ele, ins­pirando-lhe confiança, aconselhando-o a confessar, prometen­do-lhe que o Inquisidor lhe há de fazer mercês, fingindo-se (de) mediadores entre este e o Acusado. (...)

7. Uma outra artimanha do Inquisidor será chamar um cúm­plice do Acusado, ou pessoa a quem este estime e em quem acredite, a fim de a enviar repetidas vezes para falar com o Prisioneiro e conseguir o segredo. (...) Numa palavra, devem ser utilizadas todas as artimanhas que não tragam em si apa­rência de mentira”.

Os tribunais de Inquisição não seguiam ordem jurídica alguma os processos não obedeciam às formalidades do Direito. Estimu­lava-se a delação, que formalizava a peça acusatória. A denúncia oral fazia-se com as mãos sobre o Evangelho, como juramento e, a partir daí, o inquisidor tramitava o processo, mantendo oculta a identidade do denunciante. A obrigação de denunciar os hereges era permanente. Mesmo quando a acusação intentada era completamente desprovida de verdade, o inquisidor não era obrigado a apagar de seu livro de registros processuais os dados referentes aos supostos hereges. Isso porque, dizia-se, “aquilo que não se descobre em certa altura, pode vir a descobrir-se noutra”.

Os próprios inquisidores davam buscas gerais à procura de he­réticos. De tempos em tempos, nas paróquias escolhiam-se alguns padres e leigos, “pessoas de bem”, a quem se fazia prestar jura­mento, e que promoviam buscas frequentes “e escrupulosas em todas as casas, nos quartos, celeiros, subterrâneos, etc.”, a fim de se cer­tificarem se porventura não havia hereges escondidos por ali.

A progressiva rejeição da tortura

Com a evolução dos tempos, a Igreja, envolvida pelas idéias humanistas, procurou minorar tais procedimentos medievais, afas­tou-se dos centros de poder e estabeleceu a igualdade de todos perante a Justiça, restringindo sobremaneira a prática de torturas e de detenções preventivas. Foram suprimidos o uso da água fer­vente, do óleo quente e do ferro em brasa. Aboliu-se também o principio de que “em qualquer julgamento Deus estará presente para dar razão a quem tiver”. Pois o “poder divino” submetia o acusado a provas. Se saisse ileso, era inocente. Se a ferida não infeccionasse, se a pele não formasse bolhas, não era considerado culpado e sua inocência era proclamada. Caso contrário, se não resistisse à dor, era obrigado a confessar sua culpa e, portanto, incriminado.

Ainda que no século XVI se tenham publicado os ordenamentos criminais de Carlos V, favoráveis a todo tipo de crueldade, o huma­nista cristão João Vives, em seu comentário a De Civitate Dei, de Santo Agostinho, rejeita decididamente a tortura: “Como podem viver tantos povos, inclusive bárbaros, como dizem os gregos e lati­nos, que permitem torturar durissimamente um homem de cujos delitos se duvida? Nós, homens dotados de todo senso humanitário, torturamos homens para que não morram inocentes, embora tenha­mos deles mais piedade do que se morressem: muitas vezes os tor­mentos são, de longe, piores do que a morte... Não posso e não quero alongar-me aqui sobre a tortura... é um lugar comum, entre os retóricos, falar pró e contra ela. Enquanto o que dizem contra é fortíssimo, os argumentos a favor são fúteis e fracos”.

Em 1624, João Graefe ou Grevius, pastor armeniano holandês, publicou em Hamburgo o seu Tribunal Rejormatum, verdadeiro tra­tado de teologia moral a respeito da tortura. Segundo ele, esta não pode ser justificada pelas Escrituras, é contra a caridade cristã e o direito natural. A esta obra seguem-se outras de autores católicos, von Sppe (Cautio criminalis, 1631), I. Schaller (Paradoxon de tor­tura in christiana republica non exercenda, 1657), A. Nicolas (Si la torture est un moyen súr à vérijier les crimes secrets, 1682). A de maior importância, porém, foi a dissertação de C. Thomasius, De tortura ex joris christianorurn proscribenda, publicada em Halle, em 1705, na qual ele defende a exclusão da tortura dos processos penais, por ser uma pena desproporcional e contra a justiça em geral, bem como por ser contra o senso cristão de justiça e de proporção. Aconselha ao príncipe a considerar sua abolição pela ótica mera­mente política, uma vez que teologicamente e segundo o direito na­tural ela é insustentável.

A partir da famosa obra de C. Beccaria, Dei delitti e delle (Livorno, 1764), os iluministas retomam os argumentos de Thoma­sius e conseguem introduzir a proibição da tortura na legislação vigente, a começar pela Suécia e pela Prússia de Frederico II. No entanto, o mesmo não ocorre na Igreja Católica. A 3 de fevereiro de 1766, o Santo Ofício inclui no Index de livros proibidos a obra de Beccaria. E Santo Afonso de Ligório, na edição de 1785 de sua Teologia Moral, ainda se pergunta: “O que é lícito ao juiz em ques­tão de tortura?”. O único moralista que se coloca ao lado de Tho­masius é o capuchinho alemão R. Sasserath, em seu Cursus Theolo­giae Moralis, de 1787.

Também a Revolução Francesa, trouxe significativos avanços no tratamento da questão, impondo às autoridades o respeito à inte­gridade física dos detidos e, consequentemente, proibindo a tortura.

A partir do século XIX, nenhum manual de Teologia Moral recoloca a questão da tortura, pois, já no século XVII, fôra consi­derada prática “moralmente censurável” e, no século XVIII, erigida em crime. Contudo, no Brasil colônia, o Código Criminal estipulava para os escravos a pena de açoite e, por vezes, a sentença punha o escravo a ferros. A única atenuante era o impedimento legal de o negro receber mais de 50 chibatadas diárias... Para os delitos graves havia o emparedamento e a possibilidade de quebra dos dentes e de ossos do culpado.

É no século XX, após a Primeira Guerra Mundial, que a tortura volta como método privilegiado de interrogatório policial e militar em dezenas de países, embora excluída da legislação. Na Segunda Guerra, ela é usualmente aplicada aos prisioneiros de guerra, em especial nos campos de concentração nazistas, vitimas inocentes de um genocídio programado que, após o conflito mundial, fez emergir na consciência dos povos de todo o mundo a exigência de se ter um estatuto que objetive e defenda os valores essenciais da vida humana. Assim, os países membros da ONU assinaram, em 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, onde as torturas e os maus-tratos são definitivamente condenados.

Poucas normas jurídicas foram tão aceitas no mundo das nações civilizadas como aquelas proclamadas pela ONU.

Sua influência fez com que quase todos os países adotassem em seus ordenamentos jurídicos, regras de proibição terminantes com tais práticas.

Apesar disso, a humanidade assiste ao alastramento endêmico da tortura.

O Concílio Vaticano II (1963-1965), em sua Constituição Gau­dium et Spes, declara que “tudo o que viola a integridade da pessoa humana, como as mutilações, as torturas físicas ou morais e as ten­tativas de dominação psicológica.., são efetivamente dignas de cen­sura, (pois) contradizem sobremaneira a honra do Criador” (nº 284).

Em 1977, as Igrejas Protestantes e Ortodoxas, através do Con­selho Mundial de Igrejas (CMI) também reprovaram, em importante declaração, a prática ignominiosa da tortura:

“Dadas as trágicas dimensões da tortura em nosso mundo, ins­tamos as igrejas a usarem este ano do trigésimo aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos como ocasião especial para tornarem públicas a prática, a cumplicidade, e a propensão à tortura existentes em nossas nações. A tortura é epidêmica, é gerada no escuro, no silêncio. Conclamamos as igrejas a desmascararem a sua existência abertamente, a que­brarem o silêncio, a revelarem as pessoas e as estruturas de nossas sociedades responsáveis por estas violações dos direi­tos humanos que são os mais desumanizantes”.

Nos últimos anos, a tortura foi prática disseminada especial­mente em países governados sob a égide da Doutrina de Segurança Nacional, prática que subverte o objeto essencial do Estado, que é o resguardo das liberdades individuais e a promoção do bem comum. À luz da Segurança Nacional, a tortura não decorre apenas do sadis­mo dos torturadores; ela é parte integrante do sistema repressivo montado pelo Estado, a fim de sufocar os direitos e as liberdades de seus opositores. É parte da estratégia de manutenção do poder. Acreditando em sua eficácia e rapidez, as investigações policiais e militares passaram a adotá-la como método exclusivo de apuração de fatos considerados crimes contra a segurança nacional. Para tanto, a tortura tornou-se matéria de estudo teórico e prático em academias militares e em centros de instrução policial.


Improvisação, uma necessidade

Marcelo LAZZARATTO1
Universidade Estadual de Campinas - Unicamp

A improvisação me interessa como o lugar do encontro
de um objeto estrangeiro, exterior ao jogador, com o imaginário deste.
Ela provoca o sujeito a reagir, seja no interior da proposta que lhe é feita,
seja em torno da proposta, explorando amplamente a zona que se
desenha para ele, segundo o modo como sua imaginação é convocada.
(RYNGAERT, 2009, p. 90)

Os artistas envolvidos na criação teatral, principalmente atores e diretores, utilizam em alguma etapa do processo criativo a Improvisação. Para a desinibição dos atores, para o estímulo à espontaneidade, para a análise ativa das relações e dos objetivos dos personagens, para a descoberta de possível material criativo que não é oferecido a priori pelo texto a ser encenado, para conquistar interação entre os atores envolvidos no jogo teatral, para desenvolver rapidez de raciocínio e prontidão, para colocar-se em uma situação buscando envolvimento, para oferecer aos atores a possibilidade de descoberta pessoal, para verificação das características dos personagens e para tantas outras coisas que a lista seria quase que infindável.

A Improvisação se presta a qualquer momento do processo. Cabe aos artistas envolvidos perceberem a sua utilidade a partir de suas necessidades. De Stanislavski a Peter Brook, passando por Brecht, Barba, Viola Spolin, Stela Adler, Michail Checov, Boal e Grotovski, todos em algum momento de suas criações e de seus sistemas de trabalho usam a Improvisação de acordo com suas teorias. Cada um ao seu modo propõe aos atores que improvisem oferecendo limites seja de linguagem, de objetivos, ou de traços estilísticos que pertençam à sua proposta estética.

Assim, nunca se falou e nem é possível falar em um método de Improvisação, pois traria em si uma contradição incontornável. Um método traz em sua essência uma ideia de finitude, acabada, uma fórmula pela qual se chega a um resultado já comprovado e verificado. Ora, a Improvisação é exatamente o oposto. Ela nunca será um fim e sim um meio. Não é possível dizer que se você fizer de tal e tal maneira num improviso você chegará a tal resultado, pois ela abre, durante seu acontecer, inúmeras possibilidades, que uma vez desenvolvidas, podem chegar

1 Marcelo Lazzaratto é ator, diretor, pesquisador teatral e Doutor em Artes. Leciona no Depto. de Artes Cênicas da Unicamp e é diretor artístico da Cia. Elevador de Teatro Panorâmico. Publicou em 2011 o livro O campo de visão: exercício e linguagem cênica. E-mail: marevi@uol.com.br.
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a resultados diversos, tantas vezes quantas for realizada. Nunca se saberá ao certo qual será o fim de um Improviso. Ele dependerá de inúmeras variantes subjetivas que dizem respeito somente aos artistas que o executam.

É por isso que cada artista, cada diretor de teatro, estimula seus atores a sua maneira e encontra na Improvisação uma aliada que se adequa muito bem às suas características. Um diretor nem sempre se adequa à Improvisação, mas a Improvisação sempre se adequa ao diretor. Essa adequação ocorre devido ao fato de a Improvisação, além de ser um procedimento de treinamento, se constituir também como linguagem. Assim, ela cabe muito bem, por ser tão maleável, às exigências estéticas da encenação.

Mas os autores de maneira geral não se dedicam em seus textos à Improvisação como poderiam ou deveriam. Em seus livros se preocupam em conceituar princípios estéticos inovadores que tragam uma nova luz à cena, sentindo a necessidade do ponto final e da comprovação de sua investigação; e a Improvisação, por ser um meio e não um fim, não se presta a essa finalidade. Por ser muito difundida, utilizada por todos em todos os processos, é como se fosse um lugar-comum óbvio demais (a redundância aqui é necessária) para se prestar à inovação pretendida.
Ao contrário, creio que é por isso que deva ser valorizada e muito.

Mas como falar de Improvisação, oferecer seu real valor se ela em si é efêmera? Usar que metodologia para destrinchá-la?

Se o Teatro é efêmero, o Improviso é sua potencialização máxima. Tanto que requer muita disciplina e concentração para que os artistas recuperem momentos enriquecedores descobertos em uma Improvisação. Não há registro, como no improviso jazzístico. O vídeo, como todos sabem, não guarda sensorialidades que somente o calor da execução oferece. Sensorialidades advindas de um processo intuitivo de apreensão.

A intuição, além de ser algo extremamente valioso para qualquer artista, já que se refere a um conhecimento existente, imediato, mas não elaborado como discurso, traz à luz percepções apreendidas em algum momento que, ao se tomar partido delas, o ator lança-se em um terreno movediço que certamente será transformador. O ator, por ser alguém que encontra na prática sua razão de ser, seu entendimento, necessita da experimentação para compreender seus processos criativos. Ele não é um teórico que encontra unicamente no pensar a chave de seu ofício: não é somente o conhecimento lógico-racional que é válido para ele. Ele também está sujeito à experiência, levando em conta os sentimentos e as vontades frentes a ela. Seu
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conhecimento não é, portanto, somente do tipo racional-discursivo, mas também, do tipo irracional-intuitivo. A experiência o transforma, pois o desequilibra. É no desequilíbrio que se descobre novos prumos, novas possibilidades inventivas. A Improvisação promove um desequilíbrio do “já conhecido”, já que opera, e muito, segundo e seguindo a intuição. Faz com que o ator ande na corda bamba em busca de um novo eixo, que se estabelecerá a cada dia e sempre sendo um novo eixo, sujeito às necessidades e variáveis da criação.

Na questão metodológica o problema se mostra com muita clareza, mas com pouca resolução. Que método abarcará as inúmeras variáveis proporcionadas por um procedimento que traz em sua essência processos intuitivos? Como já dito acima, a Improvisação não se adequa a um método. Brincando com termos da Física Quântica, ela está mais para onda do que para partícula. Pode estar nesse e/ou naquele registro. Servir a tal e/ou tal estilo. É capaz de multifacetar-se, está mais para reticências do que para ponto final.

Então, como demonstrá-la, como dar validade científica?

Se levarmos em consideração que a Improvisação é uma prática e os atores seres humanos que querem e sentem em busca do conhecimento, a intuição será sua grande aliada. Johannes Hessen em seu livro Teoria do conhecimento ao discutir sobre os problemas do intuicionismo diz:
(...) devemos fazer uma distinção. Trata-se da distinção entre o comportamento teórico e o prático. No campo teórico, a intuição não pode reclamar o direito de ser um meio de conhecimento autônomo, emparelhado ao conhecimento racional – discursivo. Nesse campo, o intelecto está com a palavra final. Toda intuição deve, aqui, legitimar-se perante o tribunal da razão. O opositor do intuicionismo está certo em fazer essa exigência. Mas as coisas já não se passam do mesmo modo no campo prático. A intuição possui, nesse terreno, uma importância autônoma. Enquanto seres que sentem e querem, a intuição é, para nós, o verdadeiro órgão do conhecimento. Se o que o intuicionismo ensina não é nada mais do que isso, a razão está do seu lado. (HESSEN, 2000, p. 110)

Acredito que o melhor método para investigar a Improvisação não é um método e sim um sistema, um sistema dinâmico que leva em conta as variáveis. Tal sistematização leva em conta a ideia de repetição, não fechando portas, mas permitindo a existência de lacunas originadas nas repetições, detectando e analisando as variáveis para que ocorra nova sistematização, num processo constante e ininterrupto. É por isso que há a necessidade de treinamento, elaboração e reflexão constantes.
Em uma época onde a ideia de arquétipo e inconsciente coletivo já tem mais de meio século e a ciência através da Física Quântica leva em conta a incerteza como dado científico, a
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probabilidade como certeza, o insight quântico como um dado inerente à criatividade, acredito que a Improvisação no teatro é o meio potencial para a verificação dessas características: lugar onde a incerteza é benéfica e transformadora, onde o a priori não tem espaço, as probabilidades verificadas, a sensorialidade estimulada até o insight e, em sintonia, a coletividade criadora instaurando uma atmosfera poética para trazer à luz ideias latentes no inconsciente.

Improvisar é alcançar a liberdade. Não uma liberdade utópica, romântica, mas sim, instaurar-se em um plano poético onde a impossibilidade não existe. A sensação dessa possibilidade leva o ator a conectar-se com prazeres até então não revelados, abrindo potencialidades de significação e compreensão que não advêm necessariamente da racionalidade. Improvisar faz o corpo pensar. Abole a divisão corpo/mente. Razão e sensibilidade juntas processando os mais variados estímulos e respondendo a eles de maneira criativa; pois nesse estado (corpo pensando), não há certo e errado, não há juízo de valor, muito menos maniqueísmos e dicotomias; o que há é o processo da dualidade, constante, entrelaçando-se em espiral como o DNA, como o anel de Moebius, onde figura e fundo coexistem, significando e dependendo um do outro.

Improvisar é abrir-se à inspiração e ao acaso. Inspiração no sentido de conexão, conexão com uma supra-consciência geradora da qual fazemos parte e que nos tira do estado de consciência cotidiano, banal e viciado para nos colocar em um estado poético de consciência, transgressor e atuante. Sentir-se inspirado é perceber a inexistência de obstáculos. É perceber a fluência em lugar do tranco. Ou melhor, levar em consideração o tranco como fluência.

Fayga Ostrower, em seu livro Acasos e criação artística, relacionando acaso e inspiração, nos diz que os acasos de alguma forma são esperados ainda que numa “expectativa inconsciente” e continua dizendo que:

é importante levar em consideração este ponto: o de uma expectativa latente em nós, em termos de mobilização psíquica e receptividade. Iluminará certas questões de inspiração. Mostrará a distinção a ser feita entre passividade e receptividade. As pessoas não são passivas frente aos estímulos – e não é qualquer estímulo que poderá tornar-se “acaso” ou “inspiração”. As pessoas estão é receptivas; receptivas, a partir de algo que já existe nela de forma potencial e que encontra no acaso como que uma oportunidade concreta de se manifestar. Por mais surpreendentes que sejam os acasos, eles nunca surgem de modo arbitrário e sim dentro de um padrão de ordenações, em que as expectativas latentes da pessoa e os termos de seu engajamento interior representam um elo vital na cadeia causa e efeito. (OSTROWER, 1999, p. 4)
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Somente nesse ponto é que chegamos ao estado de improviso. E para chegar a ele é necessário improvisar. Chega-se ao estado de improviso improvisando. Improvisação é matéria vivida. Ela faz com que não nos esqueçamos que o homem é constituído de carne, ossos, sangue e emoções. Ela nos alia, nós, atores e espectadores, novamente a forças vitais, reinstaurando-nos Dioniso. Canal aberto para o entusiasmo, no sentido que a Antiguidade nos legou: arrebatamento extraordinário daqueles que estavam sob inspiração divina. Caminho da espontaneidade que nos leva ao humor e à leveza, alargando e aprofundando as possibilidades criativas.

Por outro lado o “vale tudo” da Improvisação pode nos levar ao “qualquer coisa”. Um dos motivos pelos quais a Improvisação cai em descrédito é essa sua queda pela falta de rigor quando utilizada com incompetência. Por ser algo dinâmico, repleto de variáveis, que não visa exatamente um fim, mas entende que o caminho é a questão, a Improvisação exige que os atores e diretores processem seu fazer operando de uma outra forma. Uma reflexão mecanicista não suporta as variáveis do Improviso. Esse tipo de pensamento tende a querer resultados específicos e imediatos, tende a equacionar todas as coisas visando finais certeiros e reprodutíveis. A Improvisação exige uma mudança de paradigma. Ela nos ajuda a compreender que a arte do ator não é fixa, que a ação que ele fará amanhã em cena não é (mesmo) a mesma de hoje. Que sua reprodução é dependente de variáveis ao mesmo tempo objetivas e subjetivas, racionais e sensoriais, previstas e irremediavelmente ligadas ao acaso. Por isso deve-se adquirir uma nova forma de processar a Improvisação tanto no momento de seu acontecimento quanto no momento de sua reflexão.

O compositor, regente e educador Hans-Joachin Koellreutter a respeito da Improvisação em música e que se estende a qualquer Improvisação artística diz:

Não há nada que precise ser mais planejado do que uma Improvisação. Para improvisar é preciso definir claramente os objetivos que se pretende atingir. É preciso ter um roteiro, e a partir daí trabalhar muito: ensaiar, experimentar, refazer, avaliar, criticar, etc.. O resto é vale-tudismo! (BRITO, 2001, pp. 45-6)

Acrescentaria ao planejamento que os artistas envolvidos em uma Improvisação devam também estar abertos a compreenderem/sentirem a ideia/sensação de fluência, dinâmica, mobilidade, impregnação, aleatoriedade. Planejar para lançar-se. Saber que planejamos a vela, o mastro, as cordas, mas não o vento. Prevemos o vento, mas não o dominamos. A Improvisação
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ensina-nos a controlar sem controle. Por isso sua potência. Por isso ela desestabiliza e oferece o inesperado, o “novo”.

Improvisação é coisa séria. Não pode ser entendida apenas como “gambiarra”, como mascaramento de um erro, mas sim como meio de acesso à criatividade. É através dela que o ator encontrará o meio pelo qual expressará suas necessidades e desejos. O ator que não se lança ao improviso deixa de perceber que é através dele que sua necessidade de expressão pode se manifestar. Porque a Improvisação é o seu território, um território vivo. Ele pode, assim, subjugar-se à necessidade do autor e do diretor. Deixa de estabelecer um diálogo com tais necessidades. Ele deixa de ser artista e passa a ser um mero executor de tarefas. Ele perde contato consigo, deixa de perceber-se como homem inserido em um contexto em que todas as vozes devem ser ouvidas e compartilhadas. Impede seu grito.

Michael Chechov, em seu livro Para o ator, a respeito de Improvisação diz que:

Pensadores profundos, impelidos a expressarem-se, criaram seus próprios sistemas filosóficos. Do mesmo modo, um artista que se esforça por expressar suas convicções mais íntimas trata de aperfeiçoar seus próprios instrumentos de expressão, sua forma particular de arte. O mesmo, sem exceção, deve ser dito da arte do ator: seu desejo irrefreável e seu mais alto propósito também só podem ser satisfeitos por meio da livre Improvisação (CHECOV, 1986, p. 39).

Embora a Improvisação seja um procedimento que sempre existiu, às vezes com mais intensidade, como nos autos medievais e na Comédia dell’arte, outras vezes de maneira mais sutil como no Classicismo francês, é no século XX, com a modernidade, que ela ganha espaço definitivo nas manifestações artísticas: na música dita erudita de Stravinsky a Koellreutter passando por Cage; na popular com o aparecimento do Jazz nos Estados Unidos, onde a Improvisação é o próprio jazz, ou nos repentes nordestinos; nas artes plásticas através do conceito de Instalação levando em conta o visitante, relacionando-se com a obra de maneira improvisada e aleatória, os Parangolés de Hélio Oiticica sendo um exemplo próximo; e no teatro, a ideia de Performance Teatral advinda dos anos 60 com o Living Theatre.

Na contemporaneidade, neste momento em que o ator passa a ser o centro das atenções, onde o conceito ator-criador é amplamente divulgado (embora o considere uma redundância), em que o diálogo ator/encenador se dá de maneira mais franca e democrática, a Improvisação é o melhor instrumento de pesquisa para que esse ator possa se manifestar,

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