quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Pra você, que está amando...

...e gosta de poesia, aí seguem três sonetos do maravilhoso poeta chileno Pablo Neruda, extraídos do livro Cem sonetos de amor.

XXXVII

OH AMOR, oh raio louco e ameaça purpúrea,
me visitas e sobes por tua viçosa escada
o castelo que o tempo coroou de neblinas,
as pálidas paredes do coração fechado.

Ninguém saberá que só foi a delicadeza
constuindo cristais duros como cidades
e que o sangue abria túneis inditosos
sem que sua monarquia derrubasse o inverno.

Por isso, amor, tua boca, teu pé, tua luz, tuas penas,
foram o patrimônio da vida, os dons
sagrados da chuva, da natureza

que recebe e levanta a gravidez do grão,
a tempestade secreta do vinho nas cantinas,
a chama do cereal no solo.


XLV

NÃO ESTEJAS longe de mim um só dia, porque como,
porque, não sei dizê-lo, é comprido o dia,
e te estarei esperando como nas estações
quando em alguma parte dormitaram os trens.

Não te vás por uma hora porque então
nessa hora se juntam as gotas do desvelo
e talvez toda a fumaça que anda buscando casa
venha matar ainda meu coração perdido.

Ai que não se quebrante tua silhueta na areia,
ai que não voem tuas pálpebras na ausência:
não te vás por um minuto, bem-amada,

porque nesse minuto terás ido tão longe
que eu cruzarei toda a terra perguntando
se voltarás ou se me deixarás morrendo.


LI

TEU RISO pertence a uma árvore entreabeta
por um raio, por um relânpago prateado
que do céu tomba quebrando-se a copa,
partindo em duas a árvore com uma só espada.

Nas terras altas da folhagem com neve apenas
nasce um riso como o teu, bem-amante,
é o riso do ar desatado na altura,
costumes de araucária, bem-amada.

Cordilheirana minha, pequena raposa evidente,
corta com as facas do teu riso a sombra,
a noite, a amanhã, o mel do meio-dia,

e que saltem ao céu as aves da folhagem
quando como uma luz esbanjadora
rompe teu riso a árvore da vida.

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