Teatro/CRÍTICA

"2 x Matei"

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Impecável montagem de dois ótimos textos



Lionel Fischer



Autor de mais de 30 textos teatrais, o romeno (naturalizado francês) Matéi Visniec começa a ter sua obra traduzida para o português, lançada pela Editora É Realizações. Por muitos críticos europeus considerado um novo Ionesco, Matéi Visniec chega ao Rio de Janeiro com duas peças curtas: "O último Godot" e "O rei, o rato e o bufão do rei", em cartaz no Teatro Poeirinha. Gilberto Gawronski assina a direção da montagem (com supervisão de Amir Haddad), estando o elenco formado por Gawronski e Guida Vianna.

Em "O último Godot", o autor nos presenteia com um quadro insólito: expulso de um teatro, Samuel Beckett se encontra com o célebre personagem que, inconformado por não aparecer em cena ("Esperando Godot"), reivindica ao menos uma fala. Os dois travam um breve e cáustico diálogo, não isento de ácido humor, durante o qual refletem sobre o papel do teatro e sua possível extinção.

Já em "O rei, o rato e o bufão do rei", tudo acontece numa cela, onde o rei e seu bufão estão confinados e tudo leva a crer que serão executados na guilhotina no dia seguinte. O contexto sugere uma revolta popular, quem sabe nos moldes da Revolução Francesa - tal suposição se deve ao fato de que a filosofia iluminista de Diderot é mencionada. Frequentemente contestado pelo bufão, o rei padece de fortes dores de cabeça e no final tem um tumor extirpado pelo súdito. Politizada, crítica e não raro engraçadíssima fábula, aqui o tema central são as contradições inerentes ao poder.

Contendo reflexões mais do que pertinentes sobre os temas que aborda, ambas as obras receberam irretocável versão cênica de Gawronski. E por irretocável entenda-se que, sem abrir mão de grande teatralidade, o encenador teve a sabedoria de perceber a enorme importância da palavra em todas as peças de Visniec. E aqui as palavras são extremamente valorizadas pelos dois intérpretes, tanto no que diz respeito à sua elocução quanto à clareza expositiva dos conteúdos em jogo. Além disso, Guida Vianna e Gilberto Gawronski exibem maravilhosa contracena e grande domínio dos tempos rítmicos, o que confere às suas atuações um grau de excelência realmente notável.

Na equipe técnica, Antonio Medeiros responde por deslumbrantes figurinos, em especial na peça ambientada na cela. Igualmente irretocáveis a cenografia de Gawronski, a luz de Vilmar Olos, os vídeos de Jorge Neto e as traduções de Roberto Mallet ("O último Godot") e Pedro Sette-Cãmara ("O rei, o rato e o bufão").

2 X MATEI - Textos de Matéi Visniec. Direção de Gilberto Gawronski. Com Gawronski e Guida Vianna. Teatro Poeirinha. Quinta a sábado, 21h. Domingo, 20h.