quarta-feira, 7 de maio de 2014

Teatro/CRÍTICA

"Desalinho"

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Belíssimo tributo ao amor



Lionel Fischer



"A peça é inspirada nos poetas portugueses Florbela Espanca e Fernando Pessoa e traz de volta ao palco o lirismo de uma história fadada à tragédia: o amor entre dois irmãos. Mariana está num hospital psiquiátrico após ter matado seu irmão, num crime passional. Ela se envolve profundamente com a enfermeira, diante de quem delira, trazendo fragmentos do passado vivido e imaginado."

Extraído do release que me foi enviado, o trecho acima resume o enredo de "Desalinho", em cartaz no Espaço Sesc. De autoria de Marcia Zanelatto, a peça chega à cena com direção de Isaac Bernat e tem elenco formado por Carolina Ferman (Mariana), Gabriel Vaz (Irmão) e Kelzy Ecard (Enfermeira).

Não sei em que medida Marcia Zanellato se inspirou nas trajetórias pessoais de Florbela Espanca e Fernando Pessoa - tudo que sei é que a poeta nutria uma paixão incondicional por seu irmão Apeles, tragicamente falecido em um desastre de avião; quanto a Pessoa, pouco se sabe a respeito de suas paixões, se é que as nutriu.

Assim, enquanto espectador, posso tanto imaginar que a autora se inspirou efetivamente na relação entre Florbela e seu irmão como supor que, mesmo partindo de um fato real, objetivou transcendê-lo, criando uma trama que objetiva um olhar mais libertário sobre questões amorosas. Esta segunda hipótese me agrada mais.

Portanto, apreendi o belíssimo texto, impregnado de doses equivalentes de lirismo e desespero, como um poderoso alerta contra todas as regras que, em nome da moral e dos bons costumes, nada mais fazem do que cercear nossas fantasias e castrar nossos impulsos mais vitais, sejam eles de natureza amorosa ou não. E se efetivamente houve um crime, se realmente Mariana matou seu irmão, ainda assim continuo achando que um crime ainda maior é cometido diariamente pelos detentores do poder contra aqueles que ousam afrontar muitos de seus dogmas, alguns deles absolutamente execráveis.

Com relação ao espetáculo, Isaac Bernat impõe à cena uma dinâmica em total sintonia com o material dramatúrgico, lançando mão de marcas que traduzem, com extrema sensibilidade, todos os conteúdos em jogo - neste particular, cabe ressaltar a passagem em que Mariana caminha sobre livros que vai colocando à sua frente, maravilhosa metáfora do permanente desequilíbrio inerente a todos aqueles que acreditam no poder avassalador e imprescindível da poesia.

No tocante ao elenco, Gabriel Vaz exibe desempenho seguro e convincente, com Carolina Ferman demonstrando, uma vez mais, ser uma das melhores atrizes de sua geração, tanto por seus vastos recursos expressivos como pela inteligência de suas escolhas, afora sua notável capacidade de entrega. Na pele da enfermeira, Kelzy Ecard ratifica o que dela sempre esperamos e invariavelmente obtemos: uma atuação irretocável, tanto do ponto de vista vocal como corporal. Trata-se, sem dúvida, de uma das mais brilhantes atrizes do teatro carioca.

Na equipe técnica, destaco com o mesmo entusiasmo as preciosas colaborações de todos os profissionais envolvidos nesta mais do que oportuna empreitada teatral - Doris Rollemberg (cenografia), Desirèe Bastos (figurinos), Aurélio de Simoni (iluminação), Alfredo Del-Penho e João Callado (direção musical) e Marcelle Sampaio (direção de movimento).

DESALINHO - Texto de Marcia Zanelatto. Direção de Isaac Bernat. Com Carolina Ferman, Gabriel Vaz e Kelzy Ecard. Espaço Sesc. Terças e quartas, 20h30.




  





2 comentários:

  1. Lionel, sua paixão pelo teatro é comovente!!! muito obrigada por olhar sempre de forma tão carinhosa, generosa e apaixonada. Você é uma joia!

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  2. Kelzy amiga,

    te agradeço as palavras tão gentis. Mas me permito uma pequena retificação: se joia existe, essa joia é você.

    Beijos,

    Eu

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