sexta-feira, 9 de maio de 2014

Teatro/CRÍTICA

"Relações aparentes"

.....................................................
Deliciosa comédia no Ginástico



Lionel Fischer



De uns tempos para cá, no primeiro parágrafo de minhas críticas, tenho apresentado um resumo do enredo ou as premissas que lhe deram origem. Aqui, no entanto, e após várias tentativas, me vi forçado a renunciar, pois sempre acabava fornecendo pistas que haveriam de privar o espectador de deliciosas surpresas. 

Posso, no máximo, adiantar o seguinte: temos, de um lado, o jovem casal de namorados Greg e Ginny, sendo que ela possui um segredo; e de outro, os esposos Sheila e Philip - mas é ele que detém um segredo, se bem que....Enfim...a prudência e o bom senso me sugerem parar por aqui.   

De autoria de Alan Ayckbourn, "Relações aparentes" chega ao palco do Teatro Sesc Ginástico com direção de Ary Coslov e Edson Fieschi, estando o elenco formado por Tato Gabus Mendes, Antonia Frering, Giselle Batista e Frank Borges.

Com um currículo de 74 peças, o inglês Alan Ayckbourn é o dramaturgo inglês de maior prestígio na atualidade. E sendo sua especialidade escrever comédias sofisticadas, ferinas e contundentes críticas à classe média/alta britânica, em nada me surpreende que o presente texto atinja todos os objetivos pretendidos pelo autor, já que criou ótimos personagens e uma trama que prende a atenção do espectador desde o início.

Com relação ao espetáculo, antes de mais nada gostaria de festejar a plena recuperação do excelente ator e diretor Ary Coslov, que teve que se afastar da direção por algum tempo - esta ficou a cargo de Edson Fieschi - e quando a ela retornou, e certamente por julgar de ótimo nível o trabalho de Fieschi, decidiu que a direção deveria ser assinada por ambos. E, como se verá em seguida, foi uma sábia decisão.

Impondo à cena uma dinâmica em total sintonia com o material dramatúrgico, Fieschi e Coslov criam marcas muito criativas, trabalham os tempos rítmicos de forma exemplar e evidenciam pleno domínio deste gênero tão difícil que é a comédia - e por comédia, que fique bem claro, entenda-se não procurar o riso do espectador através de clichês ou baixarias, mas levando em conta sua inteligência e sensibilidade.

Com relação ao elenco, no primeiro segmento da montagem Frank Borges faz desnecessário esforço para ser engraçado, como se pretendesse conquistar a plateia desde o início. Sugiro, portanto, que imponha mais leveza à sua atuação neste segmento, já que na segunda parte o ator exibe ótimo desempenho, evidenciando ser um excelente comediante. 

Giselle Batista também valoriza ao máximo sua dúbia personagem, em especial na segunda parte da montagem, quando é forçada a enfrentar situações delicadíssimas. Como de hábito, Tato Gabus Mendes nos brinda com seus vastíssimos recursos expressivos, em especial quando os mesmos estão a serviço de uma comédia como esta. Possuidor de ótima voz, excelente trabalho corporal e forte presença cênica, ao ator agradeço os incontáveis risos que me gerou.

Finalmente, Antonia Frering. Tendo nascido em berço esplêndido e estando casada desde sempre com um homem riquíssimo, Antonia poderia dedicar-se a atividades inerentes à sua classe - que não sei exatamente quais sejam. No entanto, decidiu que gostaria de ser atriz e isso deve ter causado um certo espanto em seus pares. Ainda assim, manteve-se firme e este é seu segundo espetáculo, no qual também atua como produtora. Nada mais natural, portanto, que seja menos experiente que seus colegas de cena. Mas isso não a impede de sair-se muito bem na personagem que interpreta, exibindo, inclusive, um nada desprezível tempo de comédia. Além disso, quando de perfil, Antonia nos remete a deusas egípcias e, como se não bastasse, escreveu o seguinte no programa:

"Quero agradecer carinhosamente a meu marido 
por tanta paciência que teve comigo durante 
esse processo". Ah, o amor...

Na equipe técnica, Marcos Flaksmann assina uma cenografia realista e linda, sendo igualmente irrepreensíveis a iluminação de Maneco Quinderé, os figurinos de Marília Carneiro e a tradução de Alexandre Tenório. E antes que me esqueça: após os corriqueiros avisos referentes a não fumar, não comer ou beber no teatro, não filmas ou fotografar, manter os celulares desligados etc., surge uma voz que lembra aos espectadores que na época em que se desenrola a peça, os anos 60, celulares ainda não haviam sido inventados. Sacada absolutamente genial!

RELAÇÕES APARENTES - Texto de Alan Ayckbourn. Direção de Ary Coslov e Edson Fieschi. Com Tato Gabus Mendes, Antonia Frering, Giselle Batista e Frank Borges. Teatro Sesc Ginástico. Quinta a domingo, 19h.






Nenhum comentário:

Postar um comentário