segunda-feira, 3 de junho de 2013

Teatro/CRÍTICA

"Manuscritos de Leonardo"


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O fluxo das águas e a dinâmica da vida


Lionel Fischer



Um dos maiores gênios da história da humanidade, Leonardo da Vinci (1452-1519) foi artista e cientista e no campo da ciência dedicou especial atenção ao estudo das águas. Para o artista e historiador Marcelo Guimarães Lima, a água é o símbolo da renovação e renascimento, de purificação, de transformação e de fluxo; da memória e do esquecimento e, principalmente, do tempo.
Ainda segundo Guimarães Lima, "A água pode ser encarada como elemento do ciclo da vida e da morte, como símbolo de destruição e renovação".

Como o presente espetáculo não foi concebido para prestar didáticas informações à plateia sobre as pesquisas do gênio italiano, suponho que a proposta tenha sido a de estabelecer analogias entre o fluxo  das águas e a dinâmica da vida - em ambos os casos, há que se levar em conta obstáculos, pesos, volumes, transparências e obscuridades, o manso fluir alternando-se com imprevistas tempestades etc. E todas essas alternâncias devem ser encaradas como inerentes tanto à ciência como ao ato de viver. Contestá-las seria tão inócuo como condenar o oceano pela inconstância de suas marés.

Com criação e direção assinadas por Regina Miranda e textos de autoria de Leonardo da Vinci, "Manuscritos de Leonardo" acaba de estrear na Sala Multiuso do Espaço Sesc. No elenco, Marina Salomon e Patrícia Niedermeier.

Como já dito, e embora a cenografia nos mostre o laboratório de Leonardo, assim como no chão possamos contemplar a reprodução de alguns de seus desenhos, o que está em causa é a relação entre ciência e vida. E esta se dá através de um desenho cênico que encontra maravilhosa correspondência entre, digamos, alguns estudos geométricos de Leonardo e a performance das atrizes, baseadas no método de Laban.

Em poucas palavras, este consiste na utilização de figuras geométricas para dar suporte à movimentação do ator-dançarino, analisando o movimento e suas combinações e propondo uma escala dimensional respeitando a relação entre altura, largura e comprimento, assim obtendo organicidade, limpeza gestual e possibilitando ao intérprete uma ampliação de seu próprio espaço cênico.

E sendo Regina Miranda nossa maior especialista em Laban, nada mais natural que seja da mais alta expressividade a dinâmica que impõe à cena, com todas as marcações executadas de forma irrepreensível por Marina Salomon e Patrícia Niedermeier, também impecáveis no que concerne ao texto articulado. Estamos, portanto, diante de um espetáculo que foge por completo ao que está acontecendo na cena carioca e que merece ser prestigiado de forma incondicional pelo público - ao menos por espectadores que acreditem que o teatro não pode ser estático e que deve fluir por caminhos não convencionais.

Na equipe técnica, considero irretocáveis as contribuições de todos os profissionais envolvidos nesta mais do que oportuna empreitada teatral - Luiz Paulo Neném (iluminação), Regina Miranda e Elisabete Reis (cenografia), Carolina Herszenhut (figurinos), Naira Santana (pintura de arte) e Cavil Borges (direção dos vídeos), sendo a trilha sonora de autoria de compositores anônimos do Renascimento italiano.

MANUSCRITOS DE LEONARDO - Texto de Leonardo da Vinci. Criação e direção de Regina Miranda. Com Marina Salomon e Patrícia Niedermeier. Sala Multiuso do Espaço Sesc. Sexta e sábado, 20h. Domingo, 18h.







   


Um comentário:

  1. Grande LIONEL!!! Obrigada pelo Lindo olhar que sempre expande nossa maneira de ver a Arte e a vida!!! "o grande amor nasce do grande conhecemento do objeto amado" Faço Minhas, as palavras de Leonardo...Suas criticas sempre nos fazem conhecer e amar mais o Teatro. Muito Honrada e feliz com suas Palavras.Beijos. Patricia Niedermeier.

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