quinta-feira, 16 de maio de 2013

AGULHA HISPÂNICA

REVISTA DE CULTURA
01

Uma conversa com Octavio Paz
Betty Milan
Entrevista

           Poeta e ensaísta, Octavio Paz foi Prêmio Nobel de Literatura em 1990. Nasceu no México em 1914 e passou a infância nos Estados Unidos com a família. De volta ao México, formou-se em Direito e fez especialização em Literatura. Lutou na Espanha, em 1937, ao lado dos republicanos, mas nunca abraçou o comunismo. De 1946 a 1951, viveu em Paris, onde se ligou a André Breton e freqentou o grupo surrealista, no qual encontrou o poeta Benjamin Peret, que viveu no Brasil e no México e foi seu tradutor para o francês. Além de escritor e tradutor, Octavio Paz foi diplomata. Demitiu-se do cargo de embaixador de seu país na Índia em protesto contra o massacre da Praça das Três Culturas (Tlatelolco, 1968), no qual morreram mais de cem estudantes mexicanos. Comentando sua morte em 1998, o escritor peruano Mario Vargas Llosa o qualificou como “a consciência viva de sua era”. É conhecido no Brasil, sobretudo, por seus ensaios, como O arco e a lira, Signos em rotação, O labirinto da solidão entre outros.

          À jornalista que perguntou a Octavio Paz se ele acaso não temia ficar colado à imagem que a notoriedade lhe dava, ele respondeu: “Não acredito nessas consagrações. A única consagração é um leitor capaz de dialogar com a gente. Não, eu não penso que esteja impressionado com os meus sucessos. A vida inteira as minhas opiniões foram minoritárias”.

          Precisamente por querer o diálogo ou o encontro, ele lançou um ensaio sobre o amor, A dupla chama, que não cessa de reenviar o leitor à sua própria experiência e de fazê-lo considerar, através desta, as diferentes ideias do texto.

          Escrito para nos convencer do caráter historicamente subversivo do amor, que, contrariando a tradição ocidental, enobreceu o corpo, o livro é um ensaio de poeta. Por isso mesmo, a chama que ele acende não vai se apagar. “O amor é uma flor sangrenta e é também um talismã: a vulnerabilidade dos amantes os protege”, escreve Octavio Paz. E quem poderá se esquecer do que ele diz da pessoa amada: “Terra a descobrir e casa natal”.

          Tendo em vista A dupla chama, fui ter com Paz no Hotel Lutetia onde, apesar da minha oposição inicial, ele deu a entrevista num salão repleto. As idas e vindas das pessoas em momento algum o molestaram, e eu, que temia não compreender o seu espanhol, logo fiquei à vontade. Só quando eu não ouvia ou não entendia, Octavio Paz passava do espanhol para o francês, a língua em que eu lhe fazia as perguntas, não por ele desconhecer o português, mas por conhecer menos o português do que o francês, a segunda língua dos escritores latino-americanos da sua geração.

          Depois da entrevista, Paz me convidou para tomar um café. Contou-me, durante a conversa, que foi tradutor de Fernando Pessoa e falou com admiração de Carlos Drummond de Andrade e Manuel Bandeira.[1]. [BM]

BM O senhor diz na introdução ao livro A dupla chama que, antes de escrevê-lo, hesitou muito, mas não teve como não escrever este livro sobre o amor e fez isso com um “desespero alegre”. Que relação o senhor estabelece entre a escrita e o amor?

OP Há uma relação íntima quando se trata de certo tipo de escrita – a escrita literária, a poesia ou o romance. Há muitas formas de escrever. Quando a gente quer expressar algo de muito profundo, escreve um poema ou um romance, procura assim objetivar a paixão. Em geral, a escrita nasce de uma vocação, a gente está condenada a escrever sobre certos temas. Você, que é escritora, sabe disso. Acontece a mesma coisa no amor, que começa com uma atração involuntária – a que a gente está destinada – e depois se converte, através do livre-arbítrio, numa forma de liberdade.

BM O senhor utilizou a palavra condenada. Em que medida existe um livre-arbítrio?

OP Trata-se de uma questão tão antiga quanto a filosofia. Não há resposta e as respostas que eu encontrei me parecem igualmente insatisfatórias. Há uma eterna relação entre a palavra “destino” e a palavra “liberdade”. Os gregos viram isso muito bem. Para que o destino se realize, é necessário que ele conte com a cumplicidade dos homens. Para que Édipo [2] cumpra o seu trágico destino, ele tem que escolher voluntariamente, sem saber o que está fazendo, claro. Quero dizer que em cada ato humano há uma dose de determinismo, mas este não pode se realizar sem a liberdade, que, por sua vez, necessita do destino para se realizar. Podemos dizer que, se a liberdade é uma condição da necessidade, o inverso também é verdadeiro. Não há como considerar separadamente a palavra destino e a palavra liberdade. Os dois termos estão perpetuamente em luta; e um não vive sem o outro.

BM Agora que o senhor já escreveu o livro com um “desespero alegre”, talvez seja possível me dizer por que escolheu o amor como tema.

OP Eu o escrevi com um “desespero alegre” porque o escrevi no final da minha vida. Mas o que importa é que eu o escrevi. Por que o fiz? Desde que comecei, quisera ser, quisera ter sido… a gente até começa a falar no passado… bem, quisera ter sido poeta. Os meus melhores poemas foram de amor. Às vezes foram poemas eróticos. O tema do amor é uma das minhas obsessões, um dos eixos em torno dos quais girou a minha vida pessoal e também a minha vida intelectual.

BM Sim, mas por que o senhor escreveu um ensaio?

OP Porque queria explicar o amor para mim mesmo. Quando comecei a escrever poemas, eu me disse que precisava escrever algum ensaio para justificar o ato aparentemente absurdo de escrever poemas. O mesmo ocorreu com o amor.

BM O senhor afirma que Platão [3] teria ficado escandalizado com o que nós chamamos amor. Seria possível comentar essa frase?

OP Para Platão, o amor não tinha o sentido que damos a ele e que surgiu na Idade Média com a poesia provençal. O amor, para Platão, era o erotismo, a ação de Eros, o deus da luz e da escuridão, o mensageiro, a força atuante. Platão concebia o amor como um desejo de beleza que terminava na contemplação das ideias eternas. Ademais, o amor não se dirigia a uma mulher, e sim aos efebos. O amor de que falamos, e que hoje pode ser homossexual, nasceu como uma paixão heterossexual. Nele existe um gosto pelo sofrimento, pela tragédia – como em Tristão e Isolda ou Romeu e Julieta [4] –, que teria escandalizado Platão. O amor também escandalizou os cristãos, pelo fato de se colocar numa criatura humana o que é próprio da divindade. Lope de Vega [5] diz que, no amor, a gente busca o eterno no que é perecível. O amor é uma blasfêmia para a Igreja; ele é subversivo diante da filosofia e da religião.

BM O senhor diz que o amor é uma aposta extravagante na liberdade, pois o livre-arbítrio transforma uma atração involuntária entre duas pessoas em união voluntária. Isso é bastante claro quando pensamos em Tristão e Isolda ou em Romeu e Julieta. Mas o romance História de O [6] não é uma aposta extravagante na servidão?

OP A questão é muito interessante. Mas O decide, porque ama René, que deseja se deixar escravizar. Os estoicos pensavam que só se pode afirmar a liberdade dentro dos limites do destino. Epicteto [7] dizia que o escravo tem a liberdade, pelo menos no seu interior, de dizer não. O mesmo ocorre com O, que é uma mulher livre e se vale da liberdade para se converter numa escrava.

BM Cabe perguntar se O teria podido dizer que não queria ser escrava ou, em outras palavras, se ela teria tido a possibilidade subjetiva de escolher a posição de quem não é escrava.

OP Sim, poderia ter recusado o amor. Falei algumas vezes com Paulhan sobre isso. No meu livro sobre Sade [8], eu desenvolvo a ideia. O livro se chama Um mais além erótico: Sade, e também acaba de sair pela Gallimard. Contém um poema e dois ensaios. A parte final trata da História de O. Creio que O escolhe a servidão porque está apaixonada. Todos os apaixonados, no fundo, seguem O, na medida em que todos aceitam a servidão. Na poesia provençal, que codificou o amor, se diz que o apaixonado é um vassalo e a amada é uma senhora. Mas o apaixonado decidiu se converter em vassalo, por estar apaixonado, ele não nasceu escravo. A origem de O se encontra na poesia provençal. Se O fosse somente masoquista, ela seguiria suas inclinações eróticas e ponto final, mas ela está apaixonada…

BM O senhor não acha que o amor implicaria uma revisão completa da noção de escolha?

OP Sim, porém o amor lança luz sobre a relação entre necessidade e liberdade, sobre o livre-arbítrio, o grande tema do teatro espanhol.

BM O amor move o sol e as estrelas, mas não se dissocia do ódio e pode se tornar mortífero. Por que o senhor só fala do amor como um bem?

OP Mencionam com freqência o caráter mortífero do amor. Possivelmente, eu falo dele, sobretudo como um bem por reação contra essa predileção do século XX, predileção pelos lados negros do amor. Trata-se também de uma reação contra a exaltação do Marquês de Sade… Mas eu penso que o ódio é inseparável do amor.

BM Existe mesmo o conceito de hainamoration, em Lacan [9].

OP O quê?

BM Hainamoration, um neologismo que junta o ódio (haine) e o amor (amour).

OP Os psicólogos dizem de modo mais ou menos pedante o que os poetas dizem de forma simples. Catulo [10] diz num poema famoso: “Amo e odeio ao mesmo tempo/ Por que?/ Não sei,/ mas eu disso padeço”. É magnífico, em quatro versos, diz o que os psicólogos e os psicanalistas precisam de mil páginas para dizer.

BM (Risos) O senhor diz, no seu livro, que o amor é incompatível com a infidelidade. Isso significaria que a revolução erótica deste século [11] não mudou em nada a noção tradicional de infidelidade?

OP A revolução erótica nos trouxe uma ideia mais limpa do corpo… O amor não existe sem a liberdade feminina. Por isso, desde sempre, os grandes períodos do amor coincidiram com a liberdade da mulher ou com a sua rebelião. Afinal de contas, Isolda se rebelou, Julieta também…

BM Voltando à questão anterior, eu lhe pergunto se um simples encontro erótico é um ato de infidelidade.

OP Sim, em geral sim, porque o amor está fundado na união do corpo e do espírito. No passado, havia o problema da paternidade. Hoje, a infidelidade é menos grave, porque não interfere na procriação, mas o amor parte da decisão de que “iremos juntos até o final”.

BM Será mesmo que a revolução erótica não implica que possa haver fidelidade do espírito e liberdade do corpo?

OP Parece complicado. As experiências dos que tentaram esse tipo de amizade amorosa não deram certo. É muito difícil evitar o sofrimento do companheiro. A infidelidade, em si mesma, poderia não ser grave, mas fere profundamente o outro. Isso, todos nós sabemos pela experiência.

BM Os autores árabes celebram os amores castos. Qual a diferença entre a erótica árabe e a platônica?

OP A ideia da castidade é uma ideia muito antiga. No Oriente, nasce da ideia de que toda descarga sexual implica perda de vida. É preciso ser casto para conseguir mais vida. A castidade é uma receita de imortalidade. No taoísmo e na ioga [12], a castidade existe para que o sujeito tenha mais controle sobre si mesmo. No caso de Platão, a castidade está ligada ao dualismo do corpo e da alma e à necessidade de salvar esta última. Cada ato sexual, para ele, é uma queda no mundo informe da matéria. Nós amamos uma forma; porém, no momento em que a abraçamos, ela se dissolve. Isso, para mim, é maravilhoso, porque é um contato com o universo.

BM O senhor escreve que a maior defesa contra a Aids é o amor, por implicar a fidelidade. A sua posição é a do papa.

OP Possivelmente. Mas D. H. Lawrence [13] já dizia que o papa sabia mais de sexo e erotismo do que os tratados todos.

BM Segundo o seu livro, o último grande movimento estético do século XX teria sido o surrealismo, e o movimento beat [14] foi uma derivação daquele. Seria possível explicar isso?

OP Toda a doutrina da beat generation parte da espontaneidade da escrita, que é uma ideia dos surrealistas.

BM Obrigada pela entrevista.

OP Você quer tomar um café?

BM Aceito.


NOTAS


1. Do português Fernando Pessoa (1888-1935), considerado um dos maiores poetas da lusofonia, Octavio Paz traduziu Antología, lançado em 1984. Figura inaugural do modernismo em Portugal, Pessoa é ele mesmo e seus heterônimos – os principais sendo Alberto Caeiro, Álvaro de Campos e Ricardo Reis, que são personagens ficcionais com vida, obra e estilo próprios. Já os poemas do mineiro Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) e do pernambucano Manuel Bandeira (1886-1968) – ambos modernistas – aparecem no volume Versiones y diversiones, livro de 1974, que recebeu forma definitiva em 2001, no projeto de edição da obra completa de Paz, da Editorial Galaxia Gutenberg/Círculo de Lectores de Barcelona. Esse título inclui agora todas as traduções feitas pelo autor mexicano.

2. Édipo é personagem central da peça Édipo rei, de Sófocles (496 a.C.-406 a.C.), que foi considerada por Aristóteles o exemplo máximo da tragédia. Ele procura decifrar o assassinato de seu pai, Laio, governante de Tebas. Para seu horror, ele descobrirá ter matado o pai e se casado com a mãe, Jocasta. A dor o leva a arrancar os próprios olhos.

3. Ateniense de estirpe nobre, Platão (428 a.C.-347 a.C.) foi discípulo de Sócrates (470 a.C.-399 a.C.). Depois da morte do mestre, fundou a Academia, onde foi professor de Aristóteles (384 a.C.-322 a.C.). Sobre o amor, escreveu O banquete, em sua tradicional forma de diálogos, no qual aborda as manifestações e o significado do amor sensual. O tema volta a ser tratado em outros de seus diálogos, como Lísias e Fedro.

4. Tristão e Isolda e Romeu e Julieta poderiam ser chamadas de tragédias do amor proibido. A primeira foi celebrizada modernamente na ópera homônima de Richard Wagner (1813-1883). A lenda, de origem celta, remonta ao século IX e, a partir do século XIII, foi incorporada ao ciclo do Rei Artur e a Távola Redonda. Na história, Isolda é prometida em casamento ao príncipe Marke, que manda seu sobrinho, o cavaleiro Tristão, buscá-la na terra dela. A caminho, os dois bebem uma poção mágica e se rendem ao amor impossível. Segundo os especialistas em literatura trovadoresca e medieval, Romeu e Julieta, o drama eternizado por William Shakespeare (1564-1616), inspira-se na história de Tristão e Isolda, que foi tema de muitos poemas na Europa medieval. O amor dos dois, bloqueado pela inimizade entre suas respectivas famílias, acaba na morte dos amantes.

5. Lope de Vega (1562-1630), poeta e dramaturgo espanhol formado pelos jesuítas, foi secretário de poderosos da Igreja e da Coroa, emergindo como autor de sucesso em 1598. Tendo perdido a mulher e um filho, entrou em crise e resolveu ordenar-se. Foi nomeado para o tribunal da Inquisição. A adoção do hábito religioso não o impediu de casar-se várias vezes nem de ter numerosas amantes e de protagonizar situações escandalosas em Madri, onde viveu e apresentou a maioria de sua obra numerosíssima – segundo os estudiosos, com mais de 400 comédias, dramas épicos, volumes de poesia, inclusive o famoso Amarílis, em homenagem à amante morta.

6. História de O, relançado no Brasil em 2005, é obra de Anne Desclos (1907-1998), nome real da escritora e editora francesa DominiquebAury, que o assinou com o pseudônimo de Pauline Réage. Foi criado para provar a seu amante – o escritor Jean Paulhan (1884-1968), com quem ela trabalhava na Nouvelle Revue Française – que a literatura erótica não é exclusividade do homem. História de O é um romance sadomasoquista que escandalizou os franceses em 1954, ao ser lançado, e não demorou a ganhar o mundo. Em 1975, virou filme, dirigido por Just Jaeckin e estrelado por Corinne Cléry.

7. O filósofo grego Epicteto (55-135) viveu a maior parte de sua vida em Roma como escravo de um ex-escravo do imperador Nero. Foi seu senhor que lhe permitiu estudar com um filósofo da escola estoica, Musonius Rufus, e depois lecionar na cidade, já como liberto. Ele voltou para a Grécia e continuou a ensinar quando o imperador Diocleniano expulsou todos os filósofos de Roma, no ano de 94. Para os estoicos, que introduziram na ética a noção de responsabilidade, a virtude é o único bem – e, conseqentemente, o vício é o único mal. A virtude é identificada com a razão, ao passo que os afetos correspondem ao lado patológico da realidade humana. Seus escritos assumem a forma de máximas morais, com as quais pregava a reforma dos homens, propondo a austeridade e o desprendimento como o caminho para a felicidade, a realização pessoal e a tranqilidade de espírito.

8. Jean Paulhan (1884-1968), professor, crítico, editor e escritor francês. Estudou psicologia e desde cedo se envolveu com o editorial de revistas – de filosofia, de ciências sociais e de literatura, como Les Temps Modernes, de Sartre, e a Nouvelle Revue Française, na qual foi secretário e editor (1925-1940) e diretor de 1953 até sua morte. Pertenceu à Resistência Francesa e teve papel determinante em defesa da publicação das obras dos escritores colaboracionistas, que, tendo afinado com os nazistas durante a ocupação, eram bloqueados pelos editores no pós-guerra. Foi eleito para a Academia Francesa em 1963. Foi também um estudioso da literatura erótica e autor, em 1951, do ensaio Le Marquis de Sade et sa complice ou Les revanches de la pudeur (“O Marquês de Sade e seu cúmplice ou As revanches do pudor”). Paulhan foi ainda o inspirador do romance Histoire d’O. Ver Nota 6. O livro de Octavio Paz mencionado, Um mais além erótico: Sade, foi publicado no Brasil em 1999.

9. Jacques Lacan (1901-1988) nasceu em Paris e se formou em medicina, especializando-se em psiquiatria antes de se tornar o psicanalista mais polêmico do século XX, desenvolvendo sua teoria e sua clínica em nome de um retorno a Freud. Para ele, o ser humano só se constitui como sujeito através da palavra e a estrutura do inconsciente é a da linguagem. Ao “Penso, logo existo” de Descartes, Lacan opôs um “Digo, logo existo”. A obra de Jacques Lacan e de grande parte de seus alunos vem sendo traduzida e publicada pela editora Jorge Zahar e pela Companhia de Freud, ambas do Rio de Janeiro.

10. Caio Valério Catulo (provavelmente 84.a.C-54 a.C.), pequeno nobre da província de Verona, foi um modernizador da poesia em Roma, onde viveu, trabalhando sobretudo com poemas líricos, curtos, dedicados a temas como o amor ou os pássaros e denominados “carmes” (do latim carmen, carminis, que quer dizer “poesia”). O erotismo é forte componente de seus versos. Nos anos 1930, Catulli carmina, os poemas eróticos de Catulo, foram transformados em cantata pelo compositor Carl Orff (1895-1982), formando um tríptico ao lado de Carmina Burana e Triunfos de Afrodite.

11. A expressão revolução erótica deste século faz referência aos novos comportamentos afetivos e sexuais decorrentes da eliminação ou abrandamento da repressão sexual, sobretudo na segunda metade do século XX, com o advento da pílula anticoncepcional, libertando a mulher do tabu da virgindade e do risco da gravidez involuntária. Além de afetar profundamente o relacionamento entre homens e mulheres, em decorrência das lutas por maior abertura comportamental e por novos direitos, encetadas pelo movimento feminista, a sociedade assistiu também aos movimentos de homossexuais e transgêneros por liberdade e igualdade de direitos.

12. Os adeptos do taoísmo, uma antiga religião chinesa, crêem que o tao (caminho) é a origem do universo e o criador de todos os seres. Pela prática da austeridade e do respeito a todas as criações e criaturas da natureza, o homem pode tornar-se imortal e converter-se em um ser celeste. Já a ioga é prática de origem indiana, que visa promover a união entre o ser humano e sua essência, mediante o equilíbrio de corpo e mente. Em ambas as linhas espirituais, assim como em várias crenças orientais, a castidade é vista como economia de energia.

13. David Herbert ou D. H. Lawrence (1885-1930), escritor britânico, aborda temas controversos, sobretudo de caráter sexual e relações destrutivas, tendo produzido em todos os gêneros literários – novelas, contos, poemas, peças de teatro, livros de viagens, traduções, livros sobre arte, crítica literária e correspondência. Entre suas obras mais conhecidas estão O amante de Lady Chatterley, que foi proibido e circulou clandestinamente na Inglaterra, Mulheres apaixonadas, Filhos e amantes e A serpente emplumada.

14. O surrealismo, considerado a última das vanguardas artísticas da Europa, propõe a libertação do criador em relação às normas e regras do pensamento racional, optando pela exploração do inconsciente e do subconsciente, como acaso, sonhos, alucinações, delírio e humor. Para tanto, trabalha com o automatismo como método (sem controle racional nem antes nem durante ou depois da criação) e, nas artes visuais, adota novas mídias, como colagem, foto-montagem, assemblage etc. São muitos e grandes os nomes que se ligaram ao surrealismo desde o Manifesto Surrealista, lançado pelo escritor francês André Breton em 1924. Nas artes visuais, Paul Klee, Joan Miró, Salvador Dalí, Marc Chagall, o cineasta Luis Buñuel, entre outros, enquanto na literatura comparecem Tristan Tzara, Paul Éluard, Louis Aragon, Guillaume Apollinaire. Quanto ao movimento beat, surgiu nos Estados Unidos nos anos 1950 como protesto contra o estilo de vida vazio e consumista do pós-guerra. O livro de Jack Kerouac On the road, traduzido no Brasil como Pé na estrada, é dado como seu ponto inicial. Allen Ginsberg, William Burroughs, Lawrence Ferlinghetti são alguns dos escritores do movimento, que foi intensamente ligado à música – inclusive à música oriental, que iria depois inspirar os Beatles e compor o universo da geração “paz e amor”, representada pelos hippies.

Betty Milan (Brasil, 1944). Romancista, ensaísta e dramaturga. Colaborou nos principais jornais brasileiros e atualmente é colunista da revista Veja. Sua bibliografia inclui títulos como O papagaio e o doutor (1991), Paris não acaba nunca (1996), e Fale com ela (2007). Entrevista realizada em 19/06/1994, publicada na Folha de S. Paulo, figura no livro A força da palavra (Editora Record, 1996). Contato: bettymilan@free.fr. Página
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