sexta-feira, 23 de agosto de 2013


                                                                                                         J. R.  Araújo


Não  há qualquer exagero em dizer que a Arte Barroca é reacionária. Como movimento, o Barroco surgiu como uma contraposição à Reforma Protestante iniciada por Martinho Lutero.  O cânon promulgado no Concílio de Trento ( 1545-63 ) iniciou a Contra-Reforma e determinou que as pinturas e esculturas representativas nas igrejas apelassem para os sentimentos e mentes dos menos intelectuais, das pessoas simples, que estavam mais vulneráveis a uma exposição da retórica luterana e que as manifestações artísticas fossem empregadas primariamente como instrumento de propagação da fé cristã e da doutrina da Igreja Católica. Assim, os elementos estéticos desse movimento serviriam à popularização das artes como instrumento para a divulgação das doutrinas católicas, frente à expansão das idéias protestantes.  

Do ponto de vista prático, entretanto, o período barroco teve início em 1580 na Itália e logo desenvolveu-se na Espanha e Portugal (países predominantemente católicos), e desses países se propagou para todos os centros culturais da Europa e do Novo Mundo. Como movimento, perdurou até cerca de 1756, quando foi sucedido pelo Classicismo. O termo barroco significa detalhe, saliência ou imperfeição. Originou-se da frase portuguesa "perola barroca (irregular)", usado para indicar uma pérola de forma irregular, de textura áspera e cheia de imperfeições ou desprovida da esférica,  . Isto não quer dizer que a arte barroca pudesse admitir imperfeições, mas tão somente uma alusão à sua riqueza de detalhes. Sabe-se, todavia, que nesse período estilístico riquíssimo da História Ocidental, o termo barroco nem era utilizado ou conhecido por aqueles que fizeram o movimento. Tudo indica que essa denominação seja uma inserção posterior que, de início, tinha uma conotação pejorativa, devido ao abuso dos detalhes, ao excessivo apelo dramático/emocional, ao emprego de elementos estéticos rebuscados, contrários a racionalidade e sobriedade do Renascimento. 

Embora na origem, o barroco tenha surgido para elevar o fervor religioso,  logo atraiu a atenção da nobreza e da aristocracia, que viam no estilo possibilidades de auto-promoção e engrandecimento. Assim surgiram temas heróicos, míticos e mitológicos com forte apelo ao respeito pela hierarquia e cultivo das virtudes.


Foi um estilo vigoroso, com forte fundamento teórico e marcado por características que o diferenciava bastante do estilo Renascentista. Ao contrário deste, o Barroco primava pelo emocional sobre o racional, deixando o artista livre de qualquer regra ou padrão rígidos para obter uma completa liberdade em sua criação.
Como meio de expressão artística, os elementos estéticos/filosóficos do Barroco se fizeram presentes sobretudo na Pintura, Escultura e Arquitetura, mas também com notável intensidade na Música, Literatura e nas Artes Dramáticas.

  

O Barroco na Pintura


Essa reviravolta em direção a um conceito popular nas funções das artes sacras, ao contrário da abordagem acadêmica e elitista do Renascimento, está na origem do esforço dos pintores italianos, exatamente aqueles que estavam mais próximos ao centro de influência da Igreja, Roma. As inovações de Caravaggio (1571-1610) e dos irmãos Carracci são consideradas as primeiras manifestações dessa tendência nas artes visuais. Caravaggio utilizava um plano escuro, por vezes completamente negro, e iluminava os elementos principais do tema com um impressionante jogo de luz. Essa disposição conferia realismo e dramaticidade à sua pintura, trazendo os elementos retratados para o primeiro plano e levando o expectador, com toda a emoção possível, para dentro da cena. 

                          
                                                                                                                                                                                               
                                                 
 *Não confundir com Michelangelo di Ludovico Buonarroti Simoni (1475-1564) o famoso pintor, escultor, poeta e arquiteto renascentista italiano.
Entre a família Carracci de Bolonha, Itália, destacaram-se Agostino (1557-1602) e seu irmão Annibale (1560-1609), Antônio (1583-1618) e Francesco (1595-1622) sobrinhos de Annibale. Ludovico (1555-1619) era primo de Agostino e Annibale. Todos com importância reconhecida na pintura desse período.

                                                                                                        No barroco não havia o rigor geométrico elaborado dos renascentistas. O elemento cênico principal poderia muito bem nem estar no centro do quadro. Havia sim, uma preocupação sobre o emocional, habilmente permitido fluir, da cena para o expectador, nos contornos salientados pela dicotomia luz/escuridão, pela combinação de cores, pelo dinamismo e movimento, pelas faces e corpos retorcidos, pela textura da pele viva, tenra ou musculosa, pela dramaticidade ou pela suavidade, porém sempre a serviço da emoção que podia gerar. Esta foi a marca registrada na pintura barroca, vista em sua plena força, também, nos espanhóis Velázques (1599-1660) e Murillo (1618-1682), nos belgas Van Dyck (1599-1641) e Frans Hals (1583-1666), nos holandeses Rembrandt (1606-1669) e Vermeer (1632-1675) e no flamengo Rubens (1577-1640).

    
                     
 Nos países de predominância protestante, como Holanda, Alemanha e a Região flamenga (Flandres, atualmente na Bélgica), havia uma maior permissão ao livre pensar, e isso contribuiu para que a pintura se aventurasse por uma visão mais pertinente aos eventos seculares do cotidiano. Ainda assim, havia essa tendência religiosa bem próxima das origens do barroco, mas, nesse caso, o movimento floresceu como instrumento de inspiração cristã, não necessariamente ligado à doutrina católica.        
   
        
    

Barroco na Arquitetura  e Escultura



Nas disposições artísticas do Século XVII, a arquitetura e as esculturas estão  entrelaçadas de tal forma, que se faz necessário analizá-las conjuntamente. Ambas procuravam impressionar pela grandiosidade no interior das construções, evocando as mesma emoções de piedade e fervor religioso característico do estilo. As igrejas e capelas, com suas fachadas relativamente simples, guardavam em seus interiores toda a grandiosidade nos adornos, capitéis, nas colunas, nos altares e nichos laterais que finalmente conduziam ao altar principal, num crescente grandeur, como que preparando o visitante numa seqüência de surpresas, que o levasse à experiência emocional, à reverência e ao afloramento ou fortalecimento da fé.

Os  arquitetos empregavam  a  mesma  disposição  dualística  claro/escuro  nos  elementos  arquitetônicos, aos quais mesclavam esculturas  iconográficas  ou  meramente  decorativas pintadas  ou  não, combinadas  com  quadros da  pintura  representativa do período. Podemos destacar as esculturas figurativas ou iconográficas, onde força e dinamismo estão presentes nas formas humanas ou animais. As figuras humanas representam divindades, santos, membros da nobreza e aristocracia, heróis nacionais ou mitológicos, dispostos de maneira a inspirar emoções e valores elevados. As esculturas figurativas barrrocas eram concebidas para integrarem um conjunto harmônico e combinado com a arquitetura de tal maneira que não se poderia dizer se elas serviam  como decoração ao edifício ou este foi construído apenas para abrigá-las. As figuras eram dispostas em grupos ou solitárias, sempre com o objetivo de causar uma emoção de certa forma planejada. Quando em grupos, as figuras assumiam uma disposição circular ou espiralada, com bastante espaço vazio entre elas para serem admiradas a partir de ângulos diferentes e trazer o observador para o meio da cena. 
     

Com finalidade decorativa, os artistas barrocos utilizavam motivos florais ou geométricos, com predominância das curvas evalorização do entalhe na construção de altares e nichos, com luxo na decoração e aplicação a ouro. Várias técnicas eram usadas, dentre as quais uma, denominada Trompe l'oeil e ainda de uso corrente, emprega truques de perspectiva, cores, luz e sombra, para criar objetos ou formas que na verdade não existem, num interessante e desconcertante efeito de ilusão de ótica. A expressão Trompe l'oeil é proveniente da língua francesa e significa 'engana o olho'. Como um exemplo desse truque, temos a figura ao lado: o que realmente existe é a parede . . . tudo o mais é pintura !

A nobreza e a aristocracia logo viram na retórica dramática da arquitetura e arte barroca a oportunidade de igualmente impressionar visitantes, ao evocar a idéia triunfal de controle e poder. A simplicidade das fachadas disfarçavam o que estava disposto nas áreas internas, com pórticos monumentais, ante-salas e recepções impressionantes que levavam a outras ante-salas e finalmente à sala principal, onde escadarias majestosas impunham reverência e poder. 

O barroco preocupava-se em manter a hierarquia vigente na Igreja e no Estado, conferindo poder absoluto aos papas, aos reis e à aristocracia. Defendia, pois, a manutenção do absolutismo em ambas as esferas. Como expressão estilística secular, a arquitetura barroca  manifestou-se na forma de grandes palácios, inicialmente na França, a exemplo do Château de Maisons(1642) do arquiteto François Mansart (1598-1666), e logo se espalhou por toda Europa. No Brasil há de destacar o talento incomum de Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1730-1814), arquiteto, escultor, desenhista, construtor e entalhador maior do barroco brasileiro. Sua obra prima é o conjunto denominado Os doze Profetas esculpido em pedra-sabão, disposto no pátio do Santuário de Bom Jesus de Matosinhos em Congonhas, Minas Gerais.     
       


  
     
Música Barroca


Se considerarmos que o estilo barroco predominou de 1580 até 1756,  a denominação "Música Barroca" surgiu num período posterior, em torno de 1919 por sugestão do historiador da arte e musicólogo alemão Curt Sachs (1881-1959). Apesar de que tenham existido compositores de musicalidade tão diversa quanto os italianos Jacopo Peri (1561-1633) e Domenico Scarlatti (1685-1757) e o alemão J. S. Bach (1685-1750), há, entretando, que se atentar para as diferenças marcantes dá música desse período com os períodos anterior e posterior na história da música, quais sejam: Renascimento e Clássico respectivamente. Essas diferenças foram suficientes para a identificação da música desse período, que compartilhava valores estético-filosóficos e os mesmos propósitos doutrinários e ideológicos das outras artes do período. Assim fica muito claro definir a música dessa época como sendo barroca. Houve um notável desenvolvimento da teoria musical, da tonalidade diatônica e do contraponto imitativo. Foi uma época de ornamentação musical bem mais elaborada com muitas mudanças na notação musical. O forte apelo emocional, visando o fervor religioso, fêz-se sentir na música barroca em perfeita consonância ao espírito da época. Grandes compositores enriqueceram a música desse período com dedicação e talento, entre os quais se destacaram os italianos Alessandro Scarlatti (1660-1725), o compositor e violinista Arcangelo Corelli (1653-1713) cujo estilo seria adotado como a técnica de tocar o violino predominante nos 200 anos seguintes, Nicola Porpora (1689-1767) que seria o mestre de Joseph Haydn (1732-1809), grande compositor do Período Clássico; o inglês Henry Purcell (1659-1695), o alemão Gottfried Heinrich Stölzel (1690-1749) e o francês Jean-Baptiste Lully (1632-1687). 

Muitos são os músicos, compositores e renomados mestres dessa música estilística que sucedeu ao Renascentismo. Vivaldi, Handel e Bach, entretanto, são os maiores e mais completos representantes da música barroca.

Antonio Lucio Vivaldi (1687-1741) era um sacerdote católico, nascido em Veneza e exímio violinista. Foi um compositor bastante prolífico, com uma obra impressionante, tanto em densidade e importância musical, quanto em quantidade com a incrível cifra de mais de 500 concertos, 210 dos quais dedicados ao solo para violino e violoncelo, 46 óperas, 73 sonatas, 23 sinfonias e inúmeras músicas de câmara e peças sacras. Difundiu o concerto grosso, onde mais de um solista alterna com o restante da orquestra e nesse estilo, sua peça mais conhecida é As Quatro Estações (1723). Apesar da rígida formação acadêmica, Vivaldi demonstrava grande alegria em compor, com igual paixão,  música sacra e profana. Era capaz de compor música bem ao gosto popular, o que o tornaria bastante famoso no seu tempo, dentro e fora da Itália. Bach recebeu forte influência do mestre italiano, e com freqüência transcrevia as peças deste, para violino e violoncelo, adaptando-as para  teclas solo e orquestra. Como exemplo disso temos o Estro armonico (1712), que é um conjunto de doze concertos grosso, seis dos quais transcritos por Bach para cravo e órgão.

Compôs notadamente música sacra, com destaque para o oratório Juditha Triumphans, três Gloria catalogados sob os números RV 588, RV 589 e RV 590 (esse jamais encontrado) e ainda as obras Stabat MaterNisi DominusBeatus Vir, a belíssima Magnificat e Dixit Dominus entre outras.

     


                 
George Frideric Haendel (1685-1759) era filho de um cirurgião-barbeiro que não o queria vê-lo tornar-se músico, o que não conseguiu inibir o telento natural do menino. Em 1703 transferiu-se para Hamburgo, então o centro teatral e musical da Alemanha, onde estudaria música com o renomado mestre organista F.W.Zachau, da catedral de Nossa Senhora, em Halle. Aos onze anos já era um mestre no órgão, violino, cravo e outros instrumentos e começara a compor, dominando com desenvoltura a arte da polifonia e do contraponto. Aos 20 anos de idade, sua primeira ópera, Almira, foi apresentada com grande sucesso. Em 1706, viajou à Itália, numa jornada que durou  três anos. Entrou em contato com a música  e os mestres italianos, recebendo forte influência de Alessandro Scarlatti. As suas obras foram apresentadas em Florença, Roma, Nápoles e Venezasempre com enorme repercussão, obtendo reconhecimento e prestígio. Ao retornar da Itàlia em 1710, Haendel se estabelece em Hannover como diretor da orquestra da corte. No ano seguinte viaja à Londres, onde apresenta sua ópera Rinaldo. Diante do sucesso obtido, é convidado a permanecer na Inglaterra, com a missão de criar um teatro real de ópera que ficou conhecido como a  Royal Academy of Music. Entre 1720 e 1728, Haendel escreveu 14 óperas para essa academia, o lhe valeu grande popularidade em toda a Europa. 

Dedicou-se com igual paixão à composição de óperas e oratórios, estes, entretanto, ocupam lugar central em sua obra. Compôs 32 oratórios, magníficas peças corais, os quais eram apresentados em ocasiões solenes por coros grandiosos de várias dezenas de cantores. Entre seus principais oratórios destacam-se Esther (1718), Athalia (1733), Saul (1739), Israel no Egito (1739), Messias (1742), Sansão (1743), Judas Maccabaeus (1747), Solomão (1748) e Jephtha(1752)
Suas óperas (compôs cerca de 40), apesar de contarem com produções esmeradas nos palcos dos teatros, especialmente na Royal Academy of Musicnão tinham a mesma força dramática de seus oratórios. Podemos destacar as óperas Agripina (1709), Rodelinda (1725), Ottone e Teofano (1723), Tamerlano(1724), Orlando (1732), Ézio (1733). Júlio César (1724) é considerada sua obra-prima no gênero. 

Embora tenha se dedicado à composição de obras vocais, a produção instrumental de Haendel é considerável: 110 cantatas, 20 concertos, 39 sonatas, fugas, suítes, obras sacras para missas e obras orquestrais. Haendel teve na fé luterana uma motivação profunda para sua música religiosa e, assim como Bach, deu maiores dimensões à polifonia vocal, com base na polifonia instrumental da música para órgão, pois eram ambos grandes virtuoses desse instrumento.
                                        



Johann Sebastian Bach (1685-1750) foi criado em meio religioso da Igreja Luterana. Sua música refletia sua devoção e fervor religioso, com destaque àquelas especialmente compostas para as missas dominicais, as cantatas. Compôs as famosas paixões, grandes obras para corais que eram executadas nas cerimônias da semana santa. A 
Paixão segundo São João (1724) e a Paixão segundo São Mateus (1729) estão entre suas maiores composições. Bach escreveu em 1731 a Paixão segundo São Marcos uma peça que embora tenha sua existência histórica bem estabelecida, permanece como uma obra perdida. Apesar de ser um compositor protestante, compôs a grandiosa  Missa em si menor (1733-1738), imbuído de raro espírito ecumênico. Outras obras célebres do mestre alemão são as Variações Goldberg, uma série de trinta variações para cravo publicadas a partir de 1741 sob o título Clavierübung (Prática para Teclado), que se constitui na obra mais séria, complexa e grandiosa composta para cravo. Sua Arte da Fuga, talvez seja sua obra mais representativa do barroco. Contêm dezenove fugas, variações sobre um tema, repletas de contraponto, que é uma característica dominante na música barroca. Bach compôs uma série de trinta Invenções: quinze a  "duas vozes"  e outras quinze a  "três vozes". Essas últimas, formam o estilo também conhecido como sinfonia, que não deve ser confundido com as Sinfonias típicas do Período Clássico. As Invenções, assim nomeadas pelo próprio Bach, são técnicas compostas com finalidade didática, para treinar a execução independente das mãos e que desvendam e ensinam de forma simples as intrincadas nuances da arte musical do contraponto, definidas em temas de rara inspiração. 
 

Os Concertos de Brandenburgo, uma série de seis concertos grosso, foram compostos sob evidente influência do mestre italiano Vivaldi, de quem Bach tinha muita admiração. Célebres pela forte densidade polifônica, esses concertos incorporam temas aristocráticos e do folclore alemão, numa bem balanceada mistura, desprovida de qualquer conotação extra-musical doutrinária ou ideológica. É a música pela música, numa perfeita combinação de todos os instrumentos da orquestra. Os Concertos de Brandenburgo constituem o exemplo maior da genialidade, inspiração e maturidade musical de Bach. Demonstram expressividade, fluência, conhecimento e talento musical dignos do maior músico de todos os tempos. Mais que tudo isso, é pura sabedoria !

    


  



Literatura e Teatro Barrocos

A Literatura barroca foi marcada por um forte senso de polaridade ou dualismo. Neste aspecto, o conflito maior era entre as alegrias e dores da existência terrena com as delícias e promessas espirituais. O confronto entre o prazer maior e a perda final, configurados como Eros e Tânatos, estava no centro das alegrias e dores individuais, enquanto o nacionalismo e o universalismo distendiam a polaridade dos sentimentos coletivos. O conteúdo emocional competia com o rigor formal. Tudo demarcava o inevitável conflito entre as necessidades da sociedade versus as do indivíduo. A prosa e a poesia tinham como característica principal a ênfase na originalidade, com bastante uso de elementos estilísticos tais como as figuras de linguagem, notadamente metáforas, hipérboles e antíteses. O objetivo principal era, como sempre, evocar emoções e permitir o afloramento de religiosidade e virtudes elevadas bem ao espírito da época, tendo como plano de fundo a natureza, a história e os dramas e sentimentos individuais.  Os escritores e poetas alcançaram popularidade como nunca havia acontecido. A Literatura  estava na vida do povo, mas nisso ela não se fez sozinha. Tornou-se aliada inseparável de uma manifestação artística poderosa, o Teatro. 

O Período Barroco foi sem dúvida o período do Teatro, alimentado convenientemente por sua irmã, a Literatura. Com sua retórica poderosa, podia tocar fundo nas emoções humanas trazendo aos palcos o conflito entre os dramas individuais e as demandas da sociedade. O grande impulso recebido pelo Teatro veio, no início, de uma fonte inesperada, a Igreja, na figura dos jesuítas. Eles usaram o teatro como ferramenta pedagógica, com encenações elaboradas, trazidas das praças para as escadarias das igrejas, palcos improvisados. Nos países protestantes, a Literatura e o Teatro não seguiram a agenda contra-reformista da Igreja Católica. Foi exatamente nesses países que o Teatro ganhou força e independência, deslocando-se gradualmente de uma abordagem popular rumo a uma linguagem mais intelectual, incorporando a música, as artes plásticas na confecção de cenários, com uso cada vez mais freqüente de tecnologias diversas utilizadas para aprimorar a arte da ilusão e causar mais impacto na platéia, explorando os elementos mais importantes do diálogo entre o Teatro e essas artes visuais. Na Inglaterra houve o desenvolvimento das famosas Masques, produções teatrais luxuosas e bem elaboradas, com custosos cenários planejados e executados por arquitetos e pintores famosos. A popularidade e força do Teatro viria a consolidar o termo theatrum mundi (o mundo é um palco) como o lema da época, pela capacidade do teatro para descrever, analisar e entender as atividades, emoções, anseios e vivências das pessoas e dos acontecimentos em suas vidas.
No barroco, a Literatura e o Teatro estão interligados de tal forma que caso tivessem tomado rumos independentes, certamente nada seriam. Quase todos os autores nesse período foram essencialmente dramaturgos.  Entre os mais importantes e representativos podemos citar:

Miguel de Cervantes (1547-1616) novelista e dramaturgo espanhol cuja obra mais conhecida é Dom Quixote.
William Shakespeare (1564-1616) é o maior poeta e dramaturgo inglês conhecido pelas peças Romeu e Julieta (1595), Rei Lear (1603-06), Macbeth (1603-06), Hamlet (1599-1601) Sonhos de uma Noite de Verão (1590).  Escreveu 38 peças das quais 17 comédias, 10 dramas históricos, 11 tragédias, além de 154 sonetos, vários poemas e muitos outros trabalhos menores.
John Fletcher (1579 – 1625) foi um dos mais prolíficos e influentes dramaturgos de seu tempo. Obteve reconhecimento e sucesso ainda em vida e os críticos de então, consideravam-no (juntamente com Ben Johnson) como superior ao próprio Shakespeare. 
Lope de Vega (1562-1635) poeta, dramaturgo e novelista espanhol dominou a chamada Era de Ouro do teatro da Espanha. Seus trabalhos contam La Arcadia (1598), La Dragontea (1598), El Isidro (1599), La Hermosura de Angélica (1602) e uma série de sonetos sacros intitulados Rimas sacras (1614).  
Ben Johnson (1572-1637) poeta e dramaturgo inglês, contemporâneo de Shakespeare e durante o período de vida de ambos era considerado pelos críticos como superior a este.  Johnson,  associado  ao  arquiteto  inglês Inigo Jones (1573-1652), produziu e popularizou o estilo masque, que  animava as festividades da corte dos Stuarts.
Pedro Calderón de la Barca (1600-81) um dos principais dramaturgos da Era Dourada de teatro espanhol, conhecido por seus Autos Sacramentales, série de peças religiosas encenadas em um ato  apenas.

Pierre Corneille (1606-84) poeta e dramatista francês muito importante na evolução da dramaturgia neo-clássica do Século XVII.  

Jean Baptiste Poquelin Molière (1622-73) dramaturgo e diretor de teatro francês, o maior artista cômico conhecido.  
John Dryden (1631-1700) escritor e dramaturgo inglês cujos dramas heróicos, comédias e tragédias dominaram os palcos nos anos que seguiram a restauração da monarquia inglesa (1660) após o período de guerra civil que assolou a Inglaterra, Escócia e Irlanda.

Philippe Quinault (1635-88) dramaturgo e letrista francês que colaborou com Lully nas letras de muitas óperas.  
Jean-Baptiste Lully (1637-82) músico e compositor italiano, que viveu sua vida artística na França, onde se dedicou a composição e produção de óperas durante três décadas.  

Jean Racine (1639-99) o principal dramaturgo trágico francês do século 17.  Phèdre (1677), uma tragédia em cinco atos, é sua obra mais conhecida.

 
  

As artes têm esse poder de comunicar e repassar as tradições, a cultura e as características de um povo, impregnada, pois, de nacionalismo. Todavia, sempre foi a ambição maior da arte ser universalista. Todo artista é um contador de estórias e um narrador da história, comprometido com a análise, reflexão e entendimento dos anseios, desejos e expectativas próprios da vida humana. A via media pode ser o que está escrito num livro ou livreto, o som que emite um instrumento ou uma orquestra, a representação pictográfica de uma pintura ou escultura, a magnificência de uma construção ou o palco de uma apresentação teatral. Ao expectador ou ouvinte, basta admirar e se inspirar no que o artista teve de melhor, num determinado momento; sentir uma emoção ressonante, com a que o artista sentiu e desejou compartilhar, seja essa emoção de alegria, tristeza, medo, amor ou os sentimentos extáticos e indescritíveis dos mistérios da fé. Hoje, decorridos tantos  anos, podemos não mais nos afetar diretamente pelas motivações sociais, ideológicas ou religiosas de então, mas, o que realmente importa, é que diante de qualquer expressão artística do Barroco sentiremos, ainda , uma  forte  emoção  e  isto  pela  pura  e  simples  magia  da  Arte.
 

Recife,
08/12/2007

J.R. Araújo
e-mail - zecaro108@yahoo.com.br



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