terça-feira, 16 de novembro de 2010

Teatro/CRÍTICA

"Mente Mentira"

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Virulentos embates familiares



Lionel Fischer


"A peça conta, com humor ácido e força trágica, a história de duas famílias afetadas pela drástica separação de seus filhos Jake (Malvino Salvador) e Beth (Fernanda Machado). Beth, jovem e bonita atriz iniciante, desperta no marido uma crescente suspeita de infidelidade e os dois, depois de sucessivas e violentas brigas, chegam a uma situação limite quando Jake, cego de ciúmes, bate na esposa deixando-a desacordada e chegando a acreditar que está morta. Marcados pela traumática separação, cada um volta à 'proteção da casa paterna', o que só contribui para afastá-los cada vez mais da realidade. Beth volta a viver sob os cuidados de um pai egocêntrico e autoritário, Baylor (Zécarlos Machado), uma mãe submissa, Meg (Roza Grobman) e um irmão temperamental, Mike (Marcos Martins). Jake, por sua vez, regressa aos braços de sua mãe Lorraine (Malu valle), que vive presa às lembranças do passado; Sally (Keli Freitas), uma irmã infantilizada e excluída; e Frankie (Augusto Zacchi), o irmão sensato mas que, no fundo, parece guardar um desejo velado pela cunhada Beth".

O trecho acima, extraído do release que me foi enviado pela assessoria de imprensa do espetáculo, apresenta um resumo do enredo de "Mente mentira", por muitos considerada a melhor peça do consagrado dramaturgo norte-americano Sam Shepard. Em cartaz na Casa de Cultura Laura Alvim, o texto chega à cena com tradução de Maurício Arruda de Mendonça e direção de Paulo de Moraes.

Como não li toda a obra de Shepard, não posso assegurar ser esta sua melhor peça. No entanto, não resta dúvida de que se trata de um texto de grande qualidade, que aborda temas inerentes a todos nós, tais como ciúme, inveja, autoritarismo, desejos proibidos ou não, mágoas e frustrações etc., expressos através de personagens bem construídos e de uma trama cuja virulência, humor corrosivo e alternância de foco - os conflitos das duas famílias - prendem a atenção do espectador durante todo o espetáculo.

No que concerne à montagem, Paulo de Moraes impõe à cena uma dinâmica em total sintonia com os conteúdos propostos pelo autor. Ainda assim, acredito que tanto a virulência do texto, como seu corrosivo humor, não precisariam necessariamente ser expressos num registro quase sempre tão exacerbado, o que inviabiliza maiores contrastes. Não estou sugerindo, evidentemente, que o encenador deveria "suavizar" os múltiplos embates, apenas que os mesmos não perderiam sua contundência se trabalhados numa escala expressiva mais ampla.

Com relação ao elenco, os excelentes profissionais que estão em cena conseguem valorizar, com vigor e sensibilidade, os difíceis personagens que interpretam. Mas ainda assim torna-se impossível não destacar as irrepreensíveis participações de Zécarlos Machado, Roza Grobman, Malu Valle e Augusto Zacchi, que, em minha opinião, extraem o máximo dos papéis que encarnam.

Na equipe técnica, a mesma eficiência se faz presente nas contribuições de todos os envolvidos no projeto - Maneco Quinderé (iluminação), Rita Murtinho (figurinos), Ricco Viana (música original), Paulo de Moraes e Carla Berri (cenografia), Maurício Arruda de Mendonça (tradução e dramaturgia), Patrícia Selonk (preparação corporal) e Simone Mazzer (preparação vocal).

MENTE MENTIRA - Texto de Sam Shepard. Direção de Paulo de Moraes. Com Malvino Salvador, Fernanda Machado, Zécarlos Machado, Malu Valle, Roza Gorbman, Keli Freitas, Marcos Martins e Augusto Sacchi. Casa de Cultura Laura Alvim. Sexta, 21h30; sábado, 21h; domingo, 19h.

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