segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Amir Haddad defende há 33 anos a liberdade dos artistas de rua

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Por: Luciana Azevedo 31/08/2013. Jornal O Fluminense

Defensor incansável do teatro de rua, o ator, diretor de teatro e teatrólogo Amir Haddad está há mais de 30 anos à frente do Grupo Tá na Rua, que nasceu na UFF



Por três anos o grupo leva para praças um conceito de teatro público produzido sem distinção de classe social ou qualquer tipo de discriminação. Um dos coordenadores do Fórum de Arte Pública do Rio, Haddad é um dos responsáveis pela Lei 5.429/12, conhecida como a “Lei do Artista de Rua” - que inspirou leis em municípios como Niterói -, mudando a relação da Guarda Municipal do Rio com os artistas de rua, criando, assim, um laço de respeito do espaço desses artistas.

Como vê a importância da arte de rua no País?

É o segmento da vida cultural brasileira que mais cresceu nos últimos anos. De três grupos existentes na década de 80 evoluímos para mais de 600 grupos em todo Brasil, até onde conseguimos saber. Isto sem nenhuma política cultural ou investimento no setor. E também sem mercado no sentido comercial do mesmo. Cresceu e cresce porque é uma necessidade do ser humano, tem momento histórico, e é uma forma de reação à privatização perversa, extrema e excludente do mundo em que vivemos. É arte pública. Arte que não se vende nem se compra, e que se realiza no contato direto do artista com a população sem nenhum tipo de discriminação. Em qualquer espaço. Daí você pode perceber a importância para o saneamento da convivência urbana e até mesmo para a melhoria da qualidade de vida do cidadão. Certamente é a possível arte do futuro, em um mundo melhor que este que desmorona diante de nossos olhos. A arte pública trabalha no presente para um outro futuro.

Há mais de 30 anos você está à frente do Grupo Tá na Rua. Por que decidiu criá-lo?

Sempre estive envolvido com coletivos de trabalho desde o começo. Fui fundador do Grupo Oficina. Trabalho em escolas de teatro. Assim, era natural que evoluísse para o Tá na Rua, depois de ter dirigido durante anos o grupo Comunidade no MAM do Rio de Janeiro. Não se decide criar um grupo. Na verdade, praticamente foi este grupo e outros que me criaram. Sem eles não poderia ter feito nada do que fiz e do que pretendo fazer.

Qual o conceito principal do Tá na Rua hoje?

O Tá na Rua, grupo de teatro, é hoje parte do Instituto Tá na Rua para Artes, Educação e Cidadania, que compreende, ainda, a Escola de Teatro e um fórum permanente de Artes Públicas. Nosso investimento principal é no desenvolvimento de um sentido novo para o ancestral conceito de arte como forma de manifestação essencial do ser humano. E a tentativa de entender profundamente qual a função da função artística no mundo em que vivemos.

Quais momentos do Grupo Tá na Rua mais marcaram sua vida?

Na realidade, o Tá na Rua é, ele mesmo, um eterno momento de importância em minha vida. Sair dos espaços fechados e atuar nos espaços abertos significa uma total modificação artística, política e social. Escolher a rua foi o momento principal.

Como se sente com a aprovação da “Lei do Artista de Rua”?

A “Lei do Artista de Rua” é uma lei que seria totalmente desnecessária se não fosse o Brasil, um País de contradições. A Constituição Brasileira já nos garante direito de livre expressão do cidadão. Mas de tal maneira este direito vinha sendo desrespeitado, que se tornou necessária a luta para a criação de uma lei que nos garantisse este direito garantido pela Constituição. Sempre trabalhamos em liberdade. Fugimos da ditadura. Escapamos da censura e acabamos perseguidos pelo novo “conceito” de ordem pública implantado pelas milícias do “choque de ordem”. A lei é uma resposta da sociedade ao arbítrio e à violência.

Quais as dificuldades encontradas pelo artista de rua?

Todas. Mas nada supera o prazer de se expressar livremente no espaço público, em contato com a população, sem discriminação de nenhuma espécie. Isto muda tudo. Muda o conceito de “arte”, de “artista” e coisas do tipo desenvolvido pela burguesia nos últimos séculos, e, principalmente, elimina a estratificação social. A plateia da rua não se divide em termos sociais. Nas ruas, somos todos iguais.

O que ainda precisa mudar e melhorar para os artistas de rua?

No momento, nossa luta é pela conquista de espaços nos planejamentos das políticas públicas para a cultura. Queremos políticas públicas para as artes públicas, assim como há uma infinidade de procedimentos para apoio às atividades que se realizam em espaços fechados e que cobram ingressos, selecionando o expectador por seu poder aquisitivo. Um pecado! Ou um crime! Somos contra todo e qualquer tipo de exclusão!

Como estão seus projetos com o Tá na Rua e fora do grupo?

São inúmeros. Restaurar o prédio onde funcionamos, desde o governo Brizola, onde tudo começou. Ampliar mais nossa capacidade de ação. Fortalecer a Rede Brasileira de Teatro de Rua. Fazer avançar a ideia de que arte é obra pública feita por particular e que o Estado não pode ignorar este exercício de cidadania de primeira classe e de generosidade do ser humano. Disso depende nossa sobrevivência e saúde física e mental. Fora isto, arranjar dinheiro para viver com o mínimo de dignidade!

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