domingo, 11 de janeiro de 2009

Balcão
de Lionel Fischer


Personagens
Um homem

Cenário
Um balcão

(O Homem se acha diante de um balcão. Carrega uma pasta e um guarda-chuva. Dirige-se a alguém que jamais é visto)

Homem - Bom dia. Eu pensei que o senhor não estivesse aqui, hoje. Cheguei mesmo a me assustar. Afinal de contas, eu já me habituei ao senhor. Não saberia lidar com outro funcionário. Eu sou uma pessoa que se habitua e depois sente muito qualquer alteração em seus hábitos. É claro que eu não estou querendo dizer que não poderia ser atendido por outro funcionário, pois isso equivaleria a duvidar da competência dos elementos selecionados para prestar serviço aqui, não é mesmo? Ao contrário. Longe de mim tal idéia. Sei que numa repartição de tal porte só são encaixados os indivíduos de maior inteligência e capacidade de trabalho. E só poderia ser assim mesmo. Imagine o senhor se de repente colocassem junto a si um sujeito que não tivesse a menor...Trouxe! Está tudo aqui! Hoje é o último dia, não é mesmo? Felizmente não falta nada. O senhor quer ver? É claro que o senhor quer ver...que pergunta mais desnecessária...bem...(Abre a pasta e espalha seu conteúdo sobre o balcão) Não, o guarda-chuva não tem relação alguma com os papéis. É que ele prendeu aqui, nesta pequena alça, e parece que se nega a... Carimbo? Que carimbo? Precisa carimbar? Todos? Mas eu não sabia que...17 carimbos? Cada folha leva 17 carimbos? Sei...sei...compreendo...Todos eles? Quer dizer que, sem deixar as dependências deste prédio, eu consigo carimbar todos os meus papéis? Oh, meu Deus, que bom! E como devo proceder? Sei...sei... compreendo...Eu carimbo, volto aqui e entrego ao senhor. Torno a sair, vou a outra repartição, carimbo, volto aqui e entrego ao senhor. Claro, não resta dúvida! Mas será que eu...o senhor me permitiria uma sugestão? Será que eu não poderia carimbar todos os meus papéis e depois voltar aqui e entregá-los todos de uma vez ao senhor? Perdoe...foi apenas uma sugestão...Pela expressão de seu rosto parece até que fui grosseiro consigo. Não era essa absolutamente a minha intenção, longe de mim tal...(Soam nove badaladas. Percebe-se pela expressão do Homem que o funcionário a quem se dirigia se retirou) Meus Deus! Já são nove horas! Quer dizer que só me restam oito horas para carimbar todos os meus papéis!? (Ele sai. A cada nova entrada surge com um número cada vez maior de folhas grudadas no corpo. E a cada nova entrada o balcão assume posições diferentes. Por fim, o Homem é engolido pelo balcão)

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