terça-feira, 12 de julho de 2011

João Caetano
(1808-1863)


A Primeira Companhia de Teatro Brasileira

1. Na noite de 2 de dezembro de 1833 estréia a primeira companhia de teatro inteiramente independente, criada por João Caetano para acabar com a dependência de atores estrangeiros para o nosso teatro. Esta companhia existirá até a morte do ator, aos 55 anos, devido a problemas cardíacos. A peça escolhida é "O príncipe amante da liberdade ou A independência da Escócia".

2. A fundação desta primeira companhia, contudo, teve apenas um sentido mais simbólico do que real - o nosso teatro na verdade não estava preparado para dispensar a colaboração de Portugal. Até 1836, todo o repertório de João Caetano vem de Portugal.


João Caetano e o Melodrama 

3. Melodrama - peças de amor, ciúme e violência. Em geral em versos, com filhos perdidos e recuperados, ameaças de morte, vinganças, traições, arrependimentos. Teatralmente, deveriam valer como pretexto para o talento melodramático do ator principal.

4. Um ator de vinte e poucos anos, num país tão jovem quanto ele, voltava-se para o passado por falta de apoio e material no presente. Na Europa já não se interpretava mais assim. Mas João Caetano, duplamente isolado, quer pela distância geográfica, quer pela distância cultural, marcava passo, refazendo os caminhos do passado.

5. As diferenças entre o drama romântico e o melodrama nunca foram muito nítidas. O Melodrama liberta-se das unidades clássicas, com a utilização dos espaços e tempos mais amplos. Está baseado no "coup de théâtre" - efeito surpresa, reviravolta sensacional dos personagens. As diferenças são mais de conteúdo do que de forma teatral. O melodrama era sentimental, moralizante, otimista. O Drama era fatal, tenebroso, revoltado contra a sociedade, tentado pelo mal. Não podemos esquecer também a qualidade de seus autores, tais como Alexandre Dumas e Victor Hugo.

6. O segredo da popularidade do melodrama estava diretamente relacionado à ingenuidade do público. O mal, no melodrama, não decorre de causas sociais, não possui raízes psicológicas complexas. Tem sempre forma concreta e personifica-se num personagem propositadamente mau: o tirano ou o vilão. Em geral, monta-se uma rede de intrigas em torno do tirano ou do vilão. A dificuldade para as vítimas consiste em descobrir a verdade, sepultada sob várias camadas de mentiras. Os maus vencem todas as batalhas, exceto a última: a morte do vilão é o exorcismo através do qual o espectador reafirma sua confiança. Esta visão maniqueísta é profundamente popular: o mal é sempre um personagem deliberado, produto de uma vontade determinada. Eliminando esse personagem teremos livrado o mundo de suas imperfeições.

7. Para João Caetano a literatura melodramática foi o esteio que o escorou nos anos da maturidade. A partir de 1845, à medida que crescem seus encargos comerciais e as suas responsabilidades como empresário, todos os seus grandes êxitos são de natureza popular. A bilheteria falava, e João Caetano, vivendo de sua profissão, não podia fechar os ouvidos.


"O poeta e a Inquisição" - a primeira peça brasileira (1838)

8. "Antônio José ou O poeta e a Inquisição" - mais do que criação poética espontânea, é o produto de um propósito estético bem definido: de dar início ao teatro brasileiro um programa literário nacionalista de inspiração romântica. O público aplaudiu o espetáculo com entusiasmo - pela escolha do tema nacional, ou pela novidade da declamação e da reforma da arte dramática - substituindo a monótona cantilena com que os atores recitavam seus papéis, pelo novo método natural e expressivo, até então desconhecido entre nós.

9. Rubircas de Antônio José - o tiritar nervoso do homem que sofre / as mudanças de voz de uma alma aflita / essas desentoações, ora agudas, ora graves e cavernosas, produzidas pela fraqueza física / esses êxtases, pronunciados apressadamente, com o medo de que se não esgotem, e sejam entrecortados subitamente / estas ânsias, esse agonizar.

10. Araújo Porto Alegre, um crítico da época, escreve:

"Esta mímica particular à Gonçalves de Magalhães e por ele emprestada aos gestos de Antônio José, é ainda a mesma que se vê no senhor João Caetano, em todos os momentos difíceis e em todas as situações em que as paixões concêntricas se debatem com as excêntricas".


Grandes Sucessos

11. "Othelo" foi uma de suas interpretações de maior prestígio artístico. As primeiras representações causaram espanto "pela exageração dos impulsos apaixonados, pelos gritos e rugidos selvagens e desentoados" - a inspiração estava no próprio texto, aos "leões do deserto" com os quais Othelo se compara.

12. De "Othelo", João Caetano passa para "Zaira", de Voltaire. Os traços essenciais de Orosman são os mesmo de Othelo - alguma coisa de felino, de agrestemente africano, que atraía e repelia as platéias civilizadas da Europa, fazendo passar-lhes pela espinha um arrepio de admiração e horror.

13. Quando João Caetano encenou este repertório já estava atrasado em relação à Europa uma ou duas gerações. O que o atraiu deve ter sido a possibilidade de levar "o furor trágico" às últimas conseqüências, ao delírio, principalmente devido à facilidade do ator em relação ao drama e aos exageros interpretativos. Dono de uma voz poderosíssima, nunca conseguiu êxito na comédia.

14. O autor romântico preferido de João Caetano foi Alexandre Dumas (1803-1870), autor dos livros "Os três mosqueteiros", "O conde de Monte Cristo", "O máscara de ferro" etc. O teatro de Dumas não perde tempo com reflexões morais, divagações filosóficas, desenvolvimentos psicológicos. É puro enredo, ação, puro efeito melodramático.

15. João Caetano se preocupa com a renovação da cena brasileira e sabe que isso só poderá ocorrer a partir do estudo. É um dos poucos atores que se preocuparam com o ensino do teatro.

16. Em 1857 João Caetano apresenta ao governo um plano para uma escola de teatro. Professores de reta pronúncia (dicção), História, declamação de tragédia e comédia, e esgrima. Não recebe nenhuma resposta do governo. Começa a dar aulas no salão do Teatro São Pedro, que são publicadas posteriormente com o título de "Lições dramáticas". Foi o único ator brasileiro que escreveu longamente sobre a arte de representar.
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Extraído (e um pouco reduzido) de História e Dramaturgia do Teatro Brasileiro I / professora Elza de Andrade/ CAL, 2001.

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