quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Teatro/CRÍTICA

"Vênus em visom"

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Instigantes jogos de poder e erotismo


Lionel Fischer



Tendo por inspiração o livro de conotações sadomasoquistas do escritor austríaco Leopoldo Sacher Masoch, editado em 1870, o dramaturgo norte-americano David Ives cria um fascinante texto a partir de uma situação corriqueira: após testar 35 candidatas para protagonizar uma montagem, o diretor Thomas é surpreendido em seu estúdio pela inesperada aparição de Vanda, que implora uma oportunidade para fazer um teste. Ele reluta o mais que pode até que ela o convence a lerem juntos três páginas do texto. A partir daí, ficção e realidade começam a se confundir e aos poucos a trama envereda para insuspeitados jogos de poder, sedução e dominação.

Eis, em resumo, o enredo de "Vênus em visom", em cartaz no Teatro do Leblon (Sala Marília Pêra). Hector Babenco assina a direção da montagem, estando o elenco formado por Barbara Paz e Pierre Baitelli.

O fascínio a que me referi no parágrafo inicial se deve à extraordinária capacidade do autor de ir aos poucos convertendo um contexto realista numa espécie de delírio capaz de fazer cair todas as máscaras, em especial as do diretor, que certamente jamais ousara supor que sua personalidade contivesse aspectos tão obscuros. 

Outro dado instigante consiste no fato de que jamais chegamos a uma conclusão definitiva sobre Vanda: seria ela realmente uma atriz em busca de uma oportunidade ou uma farsante? E sendo uma farsante, estaria agindo por vontade própria ou instigada por alguém? Tais questões não são jamais explicitadas com clareza, obviamente porque o autor assim o desejou. Portanto, cada espectador fará a leitura que quiser.

Com relação ao espetáculo, Hector Babenco impõe à cena uma dinâmica em total sintonia com o material dramatúrgico, explorando com grande sensibilidade todos os climas emocionais em jogo. Valendo-se de marcas diversificadas e criativas, o encenador consegue criar uma atmosfera que valoriza ao extremo tanto o humor quanto a violência e o erotismo dos jogos que os personagens estabelecem. Sem dúvida, um dos espetáculos de maior destaque da atual temporada.

Na pele do diretor, Pierre Baitelli convence plenamente tanto na parte inicial do texto - quando age como um homem exasperado ante a possibilidade de não encontrar uma atriz adequada para o papel - como nos momentos em que vai se entregando sem reservas às bizarras propostas de Vanda. Esta recebeu uma interpretação maravilhosa de Barbara Paz. É realmente notável a capacidade da atriz de sair da realidade e a ela retornar, num processo de metamorfose tão rápido que gera um permanente estado de inquietação na plateia. E se a isso somarmos seu carisma, forte presença cênica e a inteligência de suas escolhas, o resultado não poderia ser outro: uma interpretação brilhante e inesquecível.  

Na equipe técnica, Bia Junqueira assina uma bela e expressiva cenografia, os mesmos predicados presentes nos figurinos de Antônio Medeiros e na iluminação de Paulo César Medeiros. Cabe ainda registrar a excelente tradução de Daniele Ávila Small.

VÊNUS EM VISOM - Texto de David Ives. Direção de Hector Babenco. Com Barbara Paz e Pierre Baitelli. Teatro do Leblon. Quinta a sábado, 21h. Domingo, 20h.  


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