Nelson Rodrigues
(1912-1980)
BIOGRAFIA
Os trechos que se seguem foram selecionados pela professora Elza de Andrade, extraídos do livro "Anjo pornográfico", de Ruy Castro.
1. Nelson Rodrigues nasceu na cidade do Recife, Pernambuco, em 23 de agosto de 1912, quinto filho dos 14 que o casal Maria Esther Falcão e o jornalista Mário Rodrigues puseram no mundo. Seu pai, deputado e jornalista do Jornal do Recife, por problemas políticos resolve se mudar para o Rio de Janeiro, em 1916, onde vem trabalhar como redator parlamentar do jornal Correio da Manhã.
2. Mário Rodrigues permitia a ida dos filhos ao Correio da Manhã para visitá-lo. Dizem que jamais sonhou em ter seus filhos jornalistas: as meninas seriam médicas, os meninos advogados. Afinal, a vida que levava não era nada fácil: nomeado diretor do jornal, meteu-se numa batalha entre Epitácio Pessoa e Artur Bernardes, o que lhe custou um ano de cadeia, em 1924. Negando-se a fugir do país, ficou preso no quartel na Rua Evaristo da Veiga, no Rio de Janeiro. A partir da data de sua prisão o jornal que dirigia - Correio da Manhã - foi silenciado pelo governo por oito meses.
3. Ao ser libertado, Mário Rodrigues pede demissão e cria seu próprio jornal, A Manhã. Nelson inicia sua carreira jornalística em 29 de dezembro de 1925, como repórter de polícia. Tinha treze anos e meio, era alto, magro e seus cabelos eram indomáveis. Embora fosse filho do patrão, teve que comprar calças compridas para impor respeito aos colegas de redação. Nelson impressiona os colegas com sua capacidade de dramatizar pequenos acontecimentos. Especializou-se em descrever pactos de morte entre jovens namorados, tão constantes naquela época.
4. A irmã Dorinha morre em setembro de 1927, aos nove meses, de gastroenterite. Em 1928 a família se transfere para uma nova e luxuosa casa na Rua Joaquim Nabuco, 62, em Copacabana. Viviam um momento de muito dinheiro e muita fartura. Nessa época, o autor e seus irmãos mais velhos trabalhavam no jornal A Manhã. Nelson havia abandonado a terceira série do ginásio. Nunca mais voltou à escola, apesar do esforço feito por seu pai.
5. Mário Rodrigues perde o jornal que, mal administrado, está cheio de dívidas. Amigo de Melo Viana, vice-presidente da República, em 21 de novembro de 1928, e apenas 49 dias depois de perder A Manhã, Mário Rodrigues lançou seu novo jornal de grande sucesso: Crítica, que chegou a ter uma circulação de 130 mil exemplares.
6. Em 26 de dezembro de 1929, a Crítica estampa matéria, na primeira página, sobre o desquite de Sylvia e José Thibau Jr. Foi a fórmula encontrada para o diário não sair sem assunto, já que era o primeiro dia após o Natal. No dia 27, pela manhã, Sylvia entra na redação da Crítica procurando por Mário Rodrigues. Não o encontrando, pede para falar com seu filho Roberto e dá-lhe um tiro no estômago. Nelson viu e ouviu tudo. Com 17 anos, era a primeira cena de violência brutal que presenciava. Seu irmão faleceu dois dias depois. Ninguém conseguirá penetrar no teatro de Nelson Rodrigues sem entender a tragédia provocada pela morte de Roberto. Apenas 67 dias após a morte do filho, Mário Rodrigues sofre, aos 44 anos, uma trombose cerebral. Faleceu dias depois de encefalite aguda e hemorragia.
7. Em 24 de outubro Washington Luís é deposto, redações e oficinas de diversos jornais são invadidas e empasteladas. Dentre elas, a do jornal dos Rodrigues. De todos eles só um não voltaria a circular: Crítica. Isso sem contar que Milton e Mário Filho foram presos, porém logo libertados. Os irmãos começam a procurar emprego, coisa que para eles não estava nada fácil. Começaram a vender tudo o que tinham para poder sobreviver e, devido ao aluguel sempre atrasado, eram obrigados a mudar de casa a cada três meses. Até que um dia uma porta se abriu para Mário Filho. Irineu Marinho havia fundado o jornal O Globo, em 1925, mas apenas 21 dias após o jornal circular pela primeira vez, morreu de enfarte. Roberto Marinho, filho de Irineu, era o sucessor natural, mas achou-se muito inexperiente para comandar um jornal e convida Mário Filho para assumir a página de esportes de O Globo. Mário aceitou, desde que pudesse levar seus irmãos Nelson e Joffre. Roberto Marinho deu seu "de acordo" com a condição de só pagar o ordenado a Mário Filho. Nelson era chamado de "filósofo" pelos colegas de O Globo, tinha um aspecto desleixado, um só terno e não vestia meias por não tê-las. Mário Filho lança seu jornal, Mundo Esportivo, justo no fim do campeonato de futebol. Sem ter assunto, inventaram algo que seria uma mina de dinheiro anos depois: o concurso das escolas de samba.
8. Em 1934 Nelson contrai pela primeira vez uma tuberculose pulmonar. Por falta de um diagnóstico precoce, o autor já havia, com apenas 21 anos, arrancado todos os dentes e posto dentadura, numa tentativa de debelar a febre que insistia em não ir embora. Vai, então, para Campos do Jordão, em São Paulo, local recomendado para tratamento. Foi a primeira de uma série de seis internações. Roberto Marinho, sabendo das dificuldades da família, continuou pagando seu ordenado normalmente. Nelson passou 14 meses no Sanatorinho. Em abril de 1936, a terrível doença atacou seu irmão Joffre, com 21 anos, que foi levado para o Sanatório em Correias, no Rio de Janeiro. Nelson ficou ao seu lado durante sete meses. No dia 16 de dezembro de 1936 Joffre faleceu.
9. Em 1937 a redação do jornal só tinha homens. Após muita conversa Roberto Marinho resolveu contratar Elza Bretanha, apadrinhada do diretor administrativo, como secretária. Voltando de sua segunda estada em Campos do Jordão, Nelson foi informado da presença de Elza, "19 anos, moradora do Estácio e dura na queda". Ele, então, sentenciou: "Está no papo". Errou. Casaram-se no dia 29 de abril de 1940. Nelson alugou uma casinha no Engenho Novo. Era sua volta ao subúrbio. Após seis meses de casamento, certa manhã Nelson acorda e comunica a Elza que estava cego. Não enxergava nada. Descobriu, indo ao médico, que se tratava de uma seqüela da tuberculose. Tomou muito antiinflamatório, melhorou, mas 30% de sua visão estava perdida para sempre, nos dois olhos.
10. Nelson procurava uma saída para seu aperto financeiro. Elza estava grávida e seu salário estava estagnado nos 500 mil réis mensais. Um dia, ao passar em frente ao Teatro Rival, viu uma enorme fila que se formava para assistir "A família lero-lero", de Raimundo Magalhães Júnior. Alguém comentou: "Esta chanchada está rendendo os tubos!". Uma luz se acendeu na cabeça do autor: por que não escrever teatro? No meio do ano de 1941 escreveu sua primeira peça: "A mulher sem pecado". Nessa época as peças ficavam, no máximo, duas semanas em cartaz. Nelson oferece sua peça para dois grandes artistas de então: Dulcina de Moraes e Jaime Costa, mas eles a recusam. Depois de muita luta, em 9 de dezembro de 1942, "A mulher sem pecado" foi levada à cena pela Comédia Brasileira, com direção de Rodolfo Mayer, no Teatro Carlos Gomes, no Rio de Janeiro. Lá ficou por duas semanas e não teve repercussão nenhuma perante o público.
11. Em janeiro de 1943 Nelson escreve sua segunda peça teatral: "Vestido de noiva". Elza, sua mulher, fez mais de 20 cópias datilografadas para serem entregues a jornalistas, críticos e amigos. O primeiro a receber foi Manuel Bandeira. Ele gostou. Como outros, escreveu sobre ela e elogiou. Os jornais e suplementos falavam sobre "Vestido de noiva" mas o autor não conseguia encená-la. Todos diziam que era uma peça que exigia cenário complexo e teria custo muito alto. Só Thomaz Santa Rosa, um pernambucano ex-funcionário do Banco do Brasil, cantor lírico, desenhista, músico e poeta, achou que era possível. Falou então com um polonês recém chegado ao Brasil: Zibigniew Ziembisnki.
12. O grande ator e diretor leu a peça e disse: "Não conheço nada no teatro mundial que se compare com isso". Nelson conhece o diretor e tem iníciio a epopéia do grupo Os Comediantes: oito meses de ensaios, oito horas por dia. Às 20h30 do dia 28 de dezembro de 1943, os portões do Teatro Municipal foram abertos e 2.205 espectadores viram a peça. Duas horas depois, o silêncio foi total na platéia. Nos bastidores ninguém sabia o que fazer. Ziembinski, entre palavrões em polonês, manda subir o pano. Os artistas surgem e o aplauso é ensurdecedor. O diretor aparece e o teatro delira. Alguém grita na platéia: "O autor, o autor!". Nelson estava escondido em um camarote, lutando contra a dor de sua úlcera, e não foi visto por ninguém. Disse, depois, que sofreu naquele momento, sentindo-se "um marginal da própria glória".
13. Apesar da fama que lhe deu, ele continuava sendo mal pago pelo O Globo Juvenil. Em fevereiro de 1945 é convidado por David Nasser, de O Cruzeiro, para uma conversa com Freddy Chateaubriand. A oferta era inacreditável: cinco contos de réis. Nelson foi para seu novo emprego: diretor de redação das revistas Detetive e O Guri. Como a função lhe tomava pouco tempo, o autor ficava perambulando pela redação da revista O Cruzeiro, que era no mesmo andar. Sempre procurando fazer "bicos" que permitissem um ganho extra soube que Chateaubriand estava querendo comprar um folhetim francês ou americano para O Jornal, que estava com uma tiragem de apenas 3 mil exemplares por dia e sem anúncios. Nelson ofereceu-se para escrever o folhetim. Daí nasceu Suzana Flag e "Meu destino é pecar". Quando a história terminou, o sucesso foi tão grande que foi lançado um livro pelas Edições O Cruzeiro. Calcula-se que a venda tenha ultrapassado a 300 mil livros. Isso provocou o começo de outro folhetim, "Escravas do amor", cujo sucesso também foi retumbante.
14. Em março de 1945 é atacado, novamente, pela tuberculose. Começa a escrever, então, "Álbum de família". Em fevereiro de 1946 o texto é submetido à censura federal e os censores ficam de cabelos em pé. A peça foi proibida de ser encenada. As opiniões se dividiam entre os intelectuais, os críticos e os jornalistas da época, uns a favor da liberação, outros contra. Venceram os contra, pois a peça só foi liberada em 1965 e levada pela primeira vez em 1967. Outro sucesso de 1946 foi a publicação de "Minha vida", uma autobiografia de Suzana Flag. Como das vezes anteriores, além de publicada em O Jornal, virou livro e vendeu horrores. "Anjo negro" estréia em abril de 1948. Como sempre, gerou comentários polêmicos. "Senhora dos afogados" é proibida em janeiro de 1948. Com duas peças interditadas, o autor luta como um mouro para tentar liberá-las. Não conseguindo, escreve "Dorotéia", em 1949, que muitos consideram seu melhor trabalho teatral. Ainda em 1948 é publicado mais um folhetim, "Núpcias de fogo", ainda como Suzana Flag.
15. Em 1949 Chateaubriand vai comandar o jornal Diário da Noite e leva Nelson consigo. Para trás fica Suzana Flag, que o autor não aguentava mais. Em seu lugar surgiu Myrna, uma nova máscara feminina. A diferença é que Myrna respondia a cartas de leitoras. Em 1950 o autor dá adeus a Chateaubriand e aos Diários Associados e fica esperando convites de outros jornais. Ficou um ano esperando...Nesse período, salvam a família as economias de Elza e um "bico" no Jornal dos Sports, de seu irmão Mário Filho. No ano seguinte sai do buraco e vai para a Última Hora. Em junho Nelson estréia uma nova peça, "Valsa nº 6", um monólogo estrelado por sua irmã Dulce. Ficou quatro meses em cartaz e foi outra desilusão para seu autor. Samuel Wainer, dono do jornal Última Hora, propõe ao autor que escreva, com pagamento extra, uma coluna diária sobre um fato real. Poderia se chamar "Atire a primeira pedra", mas Nelson sugeriu "A vida como ela é". O sucesso foi estrondoso. Em 1951 relançou Suzana Flag em "O homem proibido".
16. Em 8 de junho de 1953 estréia no Teatro Municipal a peça "A falecida". Nessa época Nelson mantinha um romance com Yolanda, secretária de um radialista da Rádio Mayrink Veiga. Esse caso durou cinco anos e rendeu três filhos: Maria Lúcia, Sônia e Paulo César, que ele não reconheceu como seus. Com tudo isso acontecendo, o autor produziu o último folhetim de Suzana Flag, "A mentira", publicado no semanrário Flan, lançado por Samuel Wainer.
17. "Senhora dos afogados" é encenada no Rio, em 1954, com direção de Bibi Ferreira. A platéia, ao final, dividiu-se e uma parte gritava "Gênio" e a outra "Tarado". O autor não aguentou e reagiu à platéia, gritando do palco: "Burros! Burros!".
18. "Perdoa-me por me traíres" teve, também, problemas de liberação com a censura, em 1957 - sofreu cortes. Outra surpresa ocorreu na estréia: Nelson interpretava o personagem Raul. Mais uma vez as vaias e os que aplaudiam pediam para o autor falar. Ele não se fez de rogado: "Burros! Zebus!". Ninguém esperava, mas aconteceu: um tiro! Na discussão entre prós e contras, o vereador Wilson Leite sacou seu revólver e deu um tiro para amedrontar alguém que o havia chamado de "palhaço". Tumulto geral. No dia seguinte a censura proibiria a peça.
19. "Viúva, porém honesta" estreou em 13 de dezembro do mesmo ano. Dizem que nela o autor procurava atingir aos críticos que atacaram "Perdoa-me por me traíres". Um dos atores era Jece Valadão, cunhado do autor. Dercy Gonçalves estréia "Dorotéia" em São Paulo. Ficou um mês em cartaz. Nelson não gostava dos "cacos" que a atriz introduzia no texto.
20. Em 1958 estréia "Os sete gatinhos", também com Jece Valadão no elenco. Apesar de malhar o presidente da República da época, Juscelino Kubitschek, Nelson vai até ele pedir um emprego. Consegue um cargo de tesoureiro em um instituto de aposentadoria e pensões (IAPETEC), mas é reprovado no exame de vista. Pede, então, a vaga para Elza. Juscelino queria agradar Mário filho e a nomeia.
21. O autor teve sério problema de vesícula, tendo de se submeter a uma operação de alto risco. De agosto de 1959 a fevereiro de 1960, centenas de milhares de leitores acompanharam a história de Engraçadinha e sua família em "Asfalto Selvagem". Foram publicados dois livros, intitulados: "Engraçadinha - seus amores e seus pecados dos doze aos dezoito" e "Engraçadinha - depois dos trinta".
22. O autor almoçava com sua mãe quase todo dia. Tomava o ônibus na Central do Brasil e ia até o Parque Guinle, em Laranjeiras. Um dos motoristas gostava de exibir-se: tinha 27 dentes na boca, mas eram todos de ouro. Nelson juntou esse fato ao bicheiro do submundo carioca, Arlindo Pimenta, e daí surgiu o "Boca de ouro".
23. A peça, como todas as demais, teve problemas com a censura. Foi levada para estrear em São Paulo e foi um retumbante fracasso. Ziembinski insistiu em viver o papel principal e não deu certo. Em janeiro de 1961, com Milton Morais como protagonista, "Boca de ouro" estréia no Rio com grande sucesso. Ainda no final de 1960 o autor entrega a Fernanda Montenegro e Fernando Torres a peça "Beijo no asfalto".
24. Nelson escreveu para Walter Clark a primeira novela brasileira de todos os tempos: "A morta sem espelho". Apesar do grande elenco - Fernanda Montenegro, Fernando Torres, Sérgio Britto (que também respondia pela direção), Ítalo Rossi, Paulo Gracindo (que estreva na TV), música de Vinícius de Moraes - não foi autorizada a sua apresentação às oito e meia da noite. Foi empurrada para o horário das vinte e três e trinta. Walter Clark apelou, sem sucesso, até para Dom Helder Cãmara. Conseguiu, finalmente, autorização para o horário das dez horas, que não compensava financeiramente. Nelson foi convidado a encerrá-la rapidamente. Ficou claro nesse episódio que o problema era o nome do autor.
25. Na sua novela seguinte, "Sonho de amor", em 1964, seu nome apareceu, mas ela foi anunciada como uma adaptação de "O tronco do ipê", de José de Alencar. Sua última novela para a TV foi "O desconhecido", com direção de Fernando Torres e Jece Valadão, Nathalia Timberg, Carlos Alberto, Joana Fomm e outros, que só foi liberada graças ao poder de convencimento de Walter Clark.
26. Depois de ser renegada por muitas atrizes, "Toda nudez será castigada" entréia no dia 21 de junho de 1965 e é um sucesso. Os artistas são aplaudidos em cena aberta, os ingressos são avidamente disputados e fica em cartaz por seis meses no Teatro Serrador e em excursão pelo país. Após três anos de apresentações no Rio, São Paulo, Porto Alegre e Salvador, a peça é proibida em Natal.
27. Em 1966 o autor muda-se, a convite de Walter Clark, para a TV Globo. Em situação financeira apertada - como sempre - aceitou até aparecer como "tradutor" dos romances de Harold Hobins, publicados pela Editora Guanabara. Foi uma forma de receber mais dinheiro. A TV Globo era a "lanterna" na preferência dos telespectadores naquela época. No programa "Noite de gala" o autor apresentava o quadro "A cabra vadia", onde entrevistava pessoas. O primeiro foi João Avelange, presidente da CBD - Confederação Brasileira de Desportos.
28. Nessa época é chamado por Carlos Lacerda, ocasião em que é informado da criação da editora Nova Fronteira. Lacerda, que o malhou por tanto tempo, pediu-lhe um romance e deu-lhe um cheque de dois milhões de cruzeiros. Era algo em torno de 900 dólares, mas para quem estava pendurado, foi ótimo. Ele escreveu "O casamento". Quando Lacerda leu o livro, ficou assustadíssimo. Era um carnaval de incestos e perversões às vésperas de um casamento. Vendeu-o para Alfredo Machado, da Editora Eldorado. O livro vendeu 8 mil exemplares nas primeiras duas semanas de setembro de 1966, empatando com as vendas do novo romance de Jorge Amado, "Dona Flor e seus dois maridos". A morte de seu irmão, Mário Filho, impediu por algum tempo que ele fizesse a divulgação da obra. Quando reanimou, o livro teve sua venda proibida pelo ministro da Justiça, Carlos Medeiros Silva. Sua venda foi liberada nocamente em 1867.
29. No dia 21 de fevereiro de 1967, o prédio onde Paulo Rodrigues, irmão de Nelson, morava em Laranjeiras, desabou devido às chuvas. Morreram Paulinho, a esposa, filhos e mais alguns parentes que lá se encontravam para festejar o aniversário da cunhada do escritor. Em dezembro desse mesmo ano a viúva de seu irmão Mário se suicida.
30. Raphael de Almeida Magalhães, que já atuara como advogado de Nelson, é eleito governador do Estado da Guanabara. E consegue, finalmente, liberar "Álbum de família", que estava interditada desde 1946. Só em julho de 1967 foi levada à cena e, apesar do carrossel de incestos, foi aplaudida no final. Já não tinha o impacto de tempos atrás. No jornal O Globo passa a publicar "À sombra das chuteiras imortais" e "As confissões", cada uma patrocinada por um banco. Como recebia uma comissão por esses patrocínios (mais que o dobro de seu salário), estabilizou sua situação financeira. A primeira "Confissão" foi publicada em 4 de dezembro de 1967. Uma de suas manias era implicar com as pessoas conhecidas e com os amigos. Era do seu estilo alimentar-se periodicamente de certas obsessões. Como dizia Cláudio Mello e Souza, Nelson era a "flor de obsessão".
32. A partir de 1970 a ditadura militar endurece. Nelson, conhecido e admirado pelos militares, luta para tirar da prisão Hélio Pellegrino e Zuenir Ventura. Em 1972 começa nova luta: seu filho Nelsinho é um dos terroristas mais procurados pelas forças armadas. "Prancha" (seu codinome) foi apanhado em 30 de março de 1972. Dois anos antes, quando seu filho já vivia na clandestinidade, Nelson consegue com o presidente da República, General Medici, que ele saísse do país. Nelsinho não aceita o privilégio. Apesar disso, devido a seu prestígio e contatos com os militares, era muito procurado para ajudar pessoas em apuros com o regime militar. De 1969 a 1973 ele teve participação ativa na localização, libertação ou fuga de diversos suspeitos de crimes políticos. Após a prisão de Nelsinho, começa a luta para localizá-lo e procurar mantê-lo vivo, pois a tortura corria solta.
32. Nelson escreve "Anti-Nelson Rodrigues" no final de 1973. Em 1974, a peça fazia bela carreira no teatro do Serviço Nacional do Teatro. O autor faz alguns exames e é levado de imediato para São Paulo para ser operado de um aneurisma da aorta. Passou por duas operações, quase morreu, retornou ao Rio e, apesar de terminantemente proibido pelo médico, voltou a fumar. Em abril de 1977 é internado com uma arritmia ventricular grave e nova insuficiência respiratória.
33. O autor escreveu sua grande e última peça - "A serpente" - em meados de 1979, pouco antes de seu filho Nelsinho iniciar greve de fome com 13 companheiros, os últimos presos políticos cariocas, com a finalidade de transformar a anistia ampla em anistia total e irrestrita. Finalmente, no dia 23 de agosto, dia do aniversário do autor, Nelsinho é autorizado a deixar a prisão e assistir ao nascimento da filha Cristiane. No dia 16 de outubro, Nelsinho recebeu a liberdade condicional, mas não pôde ver seu pai: estava inconsciente no Hospital Pró-cardíaco. Nelson Rodrigues faleceu na manhã do dia 21 de dezembro de 1980, um domingo. No fim da tarde daquele dia ela faria 13 pontos na loteria esportiva, num "bolo" com seu irmão Augusto e alguns amigos do Globo. Dois meses depois, Elza cumpriu seu pedido - de, ainda em vida, gravar o seu nome ao lado do dele na lápide, sob a inscrição: "Unidos para além da vida e da morte. É só".
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quarta-feira, 29 de junho de 2011
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