quarta-feira, 10 de março de 2010

GEORG BÜCHNER

Erwin Theodor


Büchner nasceu em Godelau, aldeia próxima a Darmstadt (Hesse), a 17 de outubro de 1813, filho do médico Ernt Karl Büchner e de Caroline Reuss Büchner, primogênito de seis irmãos, quatro dos quais viriam a notabilizar-se nas letras e na ciência. Entre 1825 e 1831 cursou o ginásio Ludwig-Georg de Darmstadt. Ainda nos bancos escolares manifestou algumas idéias políticas que, mais tarde, o levariam ao exílio. Apreciava a solidão, falava pouco e, quando envolvido em discussões, mostrava-se agressivo. "Para dizer a verdade", declarou seu colega Karl Vogt (mais tarde professor na Universidade de Genebra), "este tal de Georg Büchner não nos era simpático...Seu isolamento era considerado altivez e, como estivesse ligado a atividades políticas, tendo mesmo deixado escapar uma que outra opiniões revolucionárias, não raro, à noite, nós estudantes parávamos diante de sua casa ao voltar da cervejaria, dedicando-lhe irônica saudação: Viva Georg Büchner, conservador do equilíbrio europeu, abolidor da escravidão!".

E embora esta recordação de Vogt se referisse aos anos de 1833 e 1834, quando tanto ele como Büchner eram estudantes em Giessen, deixa transparecer a índole do jovem Georg. Após concluído o curso ginasial, e antes de matricular-se na Universidade de Giessen, Büchner passou mais de um ano em Estrasburgo, ali iniciando os estudos de medicina e vindo a tomar conhecimento das doutrinas de Saint-Simon e de Fourrier, que agitavam o ambiente estudantil. Morava como pensionista na casa do pastor Johann Jakob Jaeglé, e, ainda antes de voltar à terra natal, ficou noivo da filha deste, Louise Wilhelmine Jaeglé (1810-1880), a sua Minna, a quem dirigiria algumas das suas mais celebradas cartas.

Teve de retornar no segundo semestre de 1833 para Hesse, a fim de, de acordo com as leis em vigor, cursar a universidade do seu estado de origem. Esta localizava-se em Giessen, cidadezinha pobre e atrasada, que não podia medir-se com a progressista Estrasburgo dos seus dias. Entrou em contato com o povo simples das cercanias, mostrando-se revoltado com a miséria e as privações da imensa maioria. Conheceu o pedagogo Firedrich Ludwig Weidig, e os dois tiveram a idéia de escrever o "Mensageiro Hesse", panfleto de espírito revolucionário, subordinado ao lema "Paz às choças, guerra aos palácios" (nome de uma seção parisiense da "Sociedade dos Direitos do Homem").

Não existia em Hesse nenhuma indústria digna deste nome, e não havia, por isso, um proletariado no sentido atual da palavra. Todos que não pertenciam à casta aristocrática ou à reduzidíssima classe média eram campônios pobres e explorados. Entre os aproximadamente 800 mil habitantes do país, apenas os mil cidadãos mais bem situados tinham o direito de candidatar-se à deputação. Para combater esta situação, fundou em Giesse uma sociedade secreta, a "Sociedade dos Direitos do Homem" a exemplo daquela que conhecera em Estrasburgo, e em 1834 tratou de abrir uma sub-seção desta sociedade em Darmstadt.

Nesse mesmo ano escreveu em colaboração com Weidig, o acima referido "Mensageiro de Hesse", folheto decididamente subversivo, no sentido social, redigido em linguagem violentíssima. Já o início da bem idéia de sua força dialética: "A vida dos nobres é um longo domingo. Moram em belas casas, usam roupas finas, têm rostos gordos e falam idioma próprio. O povo, para eles, é como adubo sobre a terra. O camponês anda atrás do arado, mas o nobre atrás dele e do arado e o impele, juntamente com o boi e o arado; tira-lhe o grão e deixa-lhe o restolho. A vida do camponês é um longo dia de trabalho. Estranhos consomem, diante do seu olhar, a produção de suas terras; seu corpo não apresenta senão calosidades, e seu suor é o sal da mesa do nobre".

Como arma revolucionária, o manifesto produziu pouco efeito. A maioria dos camponeses entregou os folhetos à polícia, a qual passou a vigiar Büchner, denunciado por Konrad Kuhl, um estranho que se infiltrara na organização. Em março de 1835, quando começou a circular uma segunda edição do "Mensageiro", Georg Büchner, que então já havia redigido A morte de Danton, e o remetera ao escritor Karl Gutskow, pedindo-lhe recomendar o drama para publicação ao editor Sauerländer, teve de fugir precipitadamente, para escapar ao cárcere. Dirigiu-se a Estrasburgo, onde, em contato com a noiva e os amigos, iniciou nova existência, embora durante muitos meses fosse perseguido pelo temor de extradição à polícia de Hesse, que havia publicado edital de captura contra ele.

Em Estrasburgo recebeu a confirmação de Gutzkow de que A morte de Danton havia sido aceita para publicação. Mantém-se afastado de quaisquer atividades políticas, para dedicar-se ao estudo da filosofia. Traduziu dois dramas de Victor Hugo (Lucrécia Borgia e Maria Tudor) e procurou uma base para candidatar-se a uma colocação universitária. A respeito desse período da vida de Büchner, as cartas publicadas proporcinam fartas informações. Após alguma hesitação, reiniciou o estudo da medicina, escrevendo sob a orientação dos professores Lauth e Duvernoy a sua tese Sur le système nerveux du barbeau, a respeito da qual, graças ainda ao auxílio dos seus professores, realizou conferências na Sociedade de Ciências Naturais de Estrasburgo, em abril e maio de 1836. Valeram-lhe a nomeação para membro correspondente da Sociedade, assim como a impressão da tese por conta da mesma, ficando solucionado um dos problemas materiais que mais lhe pesava.

Entretanto, prosseguuia em seus trabalhos literários, realizados em horas roubadas ao sono e aos estudos. Obtivera, a respeito do famoso Jacob M. R. Lenz, alguns dados em primeira mão, de que se utilizou em sua única novela, Lenz, descrevendo a evolução do processo de insanidade mental desse autor do Strun und Drang. O verdadeiro campo literário de Büchner era, porém, o teatro, e a ele voltou quando a editora Cotta abriu um concurso para a "melhor comédia alemã". Assim motivado, criou Leonce e Lena. Suas múltiplas ocupações não lhe permitiram, contudo, concluir a obra a tempo, e ela foi devolvida pela editora, sem que o envelope em que a remetera sequer tivesse sido aberto pela comissão de julgamento.

Em Estrasburgo realiza também o esboço de Woyzeck, talvez o mais significativo dos seus dramas, embora não o concluísse de forma definitiva. Baseado em fatos reais, e fundamentado nas suas experiências humanas, é talvez o produto literário mais tocante de sua pena, sendo ao mesmo tempo o derradeiro, se descontarmos o Aretino, perdido por motivos ainda não definitivamente esclarecidos, ou por ventura nunca realizado, existindo apenas nos planos do autor.

A Universidade de Zurique aprovou, em setembro de 1836, sua tese de doutoramento, enviando-lhe o diploma correspondente. Conseguiu ser admitido pela mesma Universidade para um "curso experimental", após o qual teria de obter a docência-livre e organizar suas preleções universitárias, que nunca passariam da primeira aula. Em 18 de outubro, partiu de Estrasburgo para Zurique, e em princípios de novembro realizou ali a sua preleção sobre nervos cranianos. Mereceu o título de docente-livre e o curso, do qual viria a dar apenas a primeira aula, tratou de demonstrações zootécnicas. Cartas da época faziam prever nova contribuição para o teatro, quando a morte interrompeu seu trabalho. Faleceu em 19 de fevereiro de 1937, arrebatado aos 23 anos de idade pelo tifo, que grassava em Zurique.

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