sexta-feira, 12 de março de 2010

Teatro/CRÍTICA



"O ensaio"



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Sob a aparência, a mesma essência




Lionel Fischer




Um mestre no que se convencionou chamar de peça bem feita e uma das personalidades mais brilhantes do teatro francês dos anos 30 e 40, Jean Anouilh (1910-1987) fundiu em suas comédias - na opinião de alguns teóricos - inovações da vanguarda com elementos tradicionais.
Seja como for, o que prevalece é a riqueza formal de suas peças, o jogo intelectual da "comédia de salão".

No presente caso, estamos diante de um texto inédito no Brasil (e que eu também não conhecia) cuja trama gira em torno de um grupo de aristocratas parisienses, capitaneado pelo conde e sua esposa, que recebem como herança um castelo, mas sob as seguintes condições: têm que abrigar ali 12 órfãos e passar pelo menos um mês por ano na faustosa residência. Para espantar o tédio, resolvem encenar a peça de Marivaux (1688-1763) "A dupla inconstância", que trata da paixão de um nobre por uma plebéia às vésperas da Revoção Francesa - algo semelhante acabará ocorrendo com o entediado protagonista do texto de Anouilh...

Eis, em resumo, o enredo de "O ensaio", na verdade uma peça dentro de outra. Após cumprir temporada em São Paulo, a montagem do Grupo Tapa está em cartaz na Caixa Cultural, chegando à cena com direção de Eduardo Tolentino de Araújo e elenco formado por Zécarlos Machado, Walter Breda, Emilia Rey, Adriana Alencar, Ana Cecília Junqueira, Douglas Simon e Luis Baccelli.

Ao escrever "O ensaio", os principais objetivos do autor parecem bastante claros: mostrar que o jogo de aparências, de poder, a hipocrisia, o tédio e a intolerância pouco mudaram ao longo do tempo, numa espécie de denúncia contra o que poderíamos, digamos, batizar de imobilismo da sociedade francesa. As aparências se modificam, certamente, mas sob elas permanece a mesma essência. E por isso o texto de Anouilh, escrito em 1950, permanece atualíssimo.

Bem escrito, contendo ótimos personagens e diálogos brilhantes, "O ensaio" recebeu uma versão precisa e austera de Tolentino, que sabiamente renuncia a marcações mais elaboradas e prioriza o que aqui há de mais essencial: o caráter dos personagens e as relações que estabelecem entre si. E neste sentido contou com a colaboração de um ótimo elenco, com destaque especial para as performances de Zécarlos Machado (Conde/Príncipe), Emilia Rey (Condessa/Lisette) e Walter Breda (Herói/Cavalheiro). Este último, responsável pelas passagens mais engraçadas do texto, exibe numa das últimas cenas, na pele de Herói, momentos de intensa dramaticidade, ao expor sem rodeios sua personalidade trágica e dilacerada.

Na equipe técnica, Lola Tolentino (figurinos), Paulo Mamede (cenografia) e André Canto (iluminação) exibem trabalhos corretos.

O ENSAIO - Texto de Jean Anouilh. Direção de Eduardo Tolentino de Araújo. Com o Grupo Tapa. Caixa Cultural. Quinta a domingo, 19h30.





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