Lágrimas e sorrisos
na Casa da Gávea
Lionel Fischer
Como faz há mais de duas décadas, sempre às segundas-feiras, a Casa da Gávea promove leitura de textos, quase sempre de novos autores e, em sua maioria, lidos por atores profissionais. Nesta última segunda, no entanto, algo de muito especial aconteceu.
Nenhum novo autor estava sendo lançado. Nenhum profissional das artes cênicas estava no palco. Nele estavam 13 mulheres, em sua maioria ainda muito jovens, vestidas com simplicidade - calça jeans, camiseta branca, pés descalços. Rostos desconhecidos. Mas todos evidenciando uma forte emoção, mesmo antes da leitura começar. Quem seriam aquelas mulheres?
A resposta certamente causaria surpresa a alguém que desconhecesse por completo a natureza do evento. Estávamos diante de um grupo de mulheres que trabalha numa escola particular do Rio de Janeiro, umas como babás que apóiam turmas da Educação Infantil e outras que atuam na conservação e limpeza da escola. E que estavam em vias de ratificar a mais perfeita definição de teatro que já ouvi, proferida pelo maior encenador vivo, o inglês Peter Brook: "O teatro é a arte do encontro".
Dirigidas pela atriz Clarize Derzié, as 13 mulheres se preparavam para dar início à leitura dramatizada do livro "A vida na porta da geladeira", de Alice Kuipers, tradução de Rodrigo Neves e adaptação de Dilza Salema, coordenadora da dita escola. E já constituíam um grupo, o VIDA ENCENA, agora realizando sua terceira aparição pública.
E esta gerou, como acima já sugerido, um emocionante encontro entre palco e platéia. Um tanto pelos pertinentes temas trabalhados pela autora (a falta de comunicação nas famílias contemporâneas e a busca de alternativas para resolver esta questão), mas sobretudo porque tivemos o privilégio de constatar o mágico poder do teatro de possibilitar a materialização de sonhos que, provavelmente, sem ele permaneceriam eternamente adormecidos.
Muito se fala de inclusão social e isto, sem dúvida, é muito importante. Mas tão importante quanto é a inclusão artística, o legítimo direito que todos deveriam possuir de expressar sua sensibilidade, direito este praticamente restrito aos que integram as classes dominantes. E essas 13 mulheres nada mais fizeram do que ocupar um espaço que lhes pertencia.
Em meio a lágrimas e sorrisos, obedecendo a uma dinâmica cênica simples mas não isenta de expressividade, essas 13 jovens mulheres foram acolhidas com absoluto afeto, porque também nos ofereceram, sem reservas, toda a sua afetividade. E talvez por isso, dentre outras razões, ao término da leitura me veio uma lembrança de quando era ainda uma criança.
Eu caminhava de mãos dadas com minha mãe numa fazenda no Uruguai - minha família é de lá. Teria uns oito ou nove anos, no máximo. Num dado momento, me deparei com uma flor belíssima e, absolutamente encantado, relutava em seguir em frente, tentando ao máximo reter na memória aquela deslumbrante visão. Foi quando minha mãe me disse: "Fica tranquilo, meu filho. Não nos esquecemos de uma flor somente porque ela é bela, mas sobretudo por seu perfume".
E é esse perfume que seguiu comigo quando deixei a Casa da Gávea. As imagens, provavelmente, se tornarão menos nítidas com o passar do tempo. Mas aquilo que se instala no nosso coração, isso é para sempre.
Gostaria, então, de agradecer a inesquecível noite que me proporcionaram Danielle Alves Martins, Elenilde Alves de Oliveira, Elosia de Souza Vitorino Candido, Erlane Barbosa, Gilselene dos Santos, Josimar Dias da Mota, Maria Jocélia Carlos da Silva, Maria Valdilene M. Gonçalo, Tatiane Regina da Silva, Luciene Barcellos, Deysilane Moura da Silva, Joseane Batista de Souza e Daiene Gomes de Oliveira. E também ressaltar as inestimáveis colaborações de Mary Kunha (preparação corporal) e Daniel Valentim (direção musical), assim como desejar que os sempre caprichosos deuses do teatro abençoem a trajetória humana e artística do grupo VIDA ENCENA.
quinta-feira, 5 de maio de 2011
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que lindo texto, vida longa para elas porque assim é a arte. Bjss
ResponderExcluirah... consegui comer os biscoitos...rs bjs
ResponderExcluirGostei muitoooo... assisti na escola e adorei... Parabéns às meninas.
ResponderExcluirPrimeiro quero agradecer em nome do Sesc Rio Casa da Gávea seu relato, realmente esse foi um dia de aprendizado e emoção para todos os presentes, fomos todos contagiados.
ResponderExcluirQuero lhe pedir autorização para publicar seu texto em nosso folder.
Abraços e Sucesso,
Rafael Assis.