Teatro/CRÍTICA
"Eclipse"
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Tchecov em belíssima versão
Lionel Fischer
"Em 2011, o Grupo Galpão realizou o projeto 'Viagem a Tchecov', que resultou na montagem dos espetáculos 'Tio Vânia (aos que vierem depois de nós)' e 'Eclipse'. Em busca desse novo desafio, o grupo mergulhou sobre a obra do dramaturgo e contista. 'Eclipse' nasceu do encontro do Grupo Galpão com o diretor e professor russo, residente em Berlim, Jurij Alschitz. Empolgada com sua visão de teatro e seu trabalho de treinamento de atores, a companhia convidou o artista para dirigir sua nova montagem. Após oito meses de trabalho com a pesquisa de mais de 150 contos, o grupo encenou o espetáculo em que cinco pessoas, presas num mesmo espaço, aguardam o final de um eclipse solar. Enquanto isso, discorrem sobre a existência e a condição humana, perpassando os contos e a filosofia de Tchecov. À medida que a espera se torna longa, o confronto dessas visões de mundo desencadeia uma série de situações absurdas".
O trecho acima, extraído do programa distribuído ao público, resume a origem do processo que culminou no presente espetáculo, assim como o contextualiza. Em cartaz no Teatro Sesc Ginástico, "Eclipse" chega à cena com direção, dramaturgia, cenografia, figurino e treinamento de Jurij Alschitz, e elenco formado por Chico Pelúcio, Inês Peixoto, Julio Maciel, Lydia del Picchia e Simone Ordones.
Prestes a completar 30 anos de estrada, o Grupo Galpão nos apresenta um espetáculo que sem dúvida será um dos marcos da atual temporada. Inspirada em contos do genial autor russo, a montagem se estrutura a partir de um fato insólito, como já mencionado no parágrafo inicial: um eclipse solar obriga cinco pessoas a permanecerem trancadas, no mesmo espaço, ao longo de uma noite. Mas não se trata de pessoas que o acaso juntou, mas cinco atores de uma mesma companhia. Esse detalhe pode parecer insignificante, mas sem dúvida não é.
Por serem atores e integrarem a mesma companhia, as reflexões que os personagens empreendem não se limitam a questões que poderiam afligir ou estimular pessoas normais, forçadas a uma tal convivência, mas também dizem respeito ao teatro, à função da arte numa sociedade, aos impulsos e prioridades que norteiam os rumos de um grupo teatral. Teatro e vida, portanto, são tratados como uma unidade indissociável.
E justamente porque estamos diante de um grupo de artistas, nada mais natural que as questões levantadas não fiquem circunscritas a divagações teórico/filosóficas, mas venham sempre impregnadas de teatralidade. Esta, por sinal, e ainda que enganosamente simples, é fruto de um esmerado trabalho de composição, que prioriza a plasticidade - como explicitado no release que me foi enviado, predominam as cores primárias, os contrastes entre claro e escuro e as formas geométricas.
Partindo do riquíssimo material criado por um dos maiores dramaturgos e contistas de todos os tempos, "Eclipse" exibe uma dinâmica cênica irrepreensível, que, a exemplo de toda a obra de Tchecov, dispensa arroubos e climas paroxísticos, priorizando a delicadeza, a fantasia, a sutil ironia e a poesia, sendo que tais predicados não se consubstanciam apenas através das palavras, mas também de tudo que elas não são capazes de expressar - como todos sabemos, o silêncio, em Tchecov, está sempre impregnado de múltiplos significados.
Com relação ao elenco, os cinco atores que participam da montagem dispensam maiores apresentações e muito menos uma análise detalhada de seus desempenhos, pois há muito atingiram um estágio de excelência que os coloca entre os maiores intérpretes deste país. Mas não custa nada ressaltar sua cumplicidade, parceria e maravilhosa contracena. Assim, só me resta agradecer aos sempre caprichosos deuses do teatro a oportunidade que me concederam de, mais uma vez, ter o privilégio de assistir a mais uma montagem deste grupo de exceção.
Na equipe técnica, destaco com o mesmo entusiasmo as contribuições de todos os profissionais envolvidos nesta mais do que oportuna empreitada teatral - Jurij Alschitz (direção, dramaturgia, cenografia e figurinos), Olga Lapina (preparação vocal e assistência de direção), Diego Bagagal (assistência de direção e figurinos), Ernani Maletta (direção musical e arranjos), Chico Pelúcio e Bruno Cerezoli (iluminação), André Amparo, Chico de Paula e Bruno Cardieri (vídeo projeção), Mona Magalhães (caracterização), Jomar Mesquita (coreografia) e Eloquent Words (tradução).
ECLIPSE - Texto de Tchecov. Direção e dramaturgia de Jurij Alschitz. Com o Grupo Galpão. Teatro Sesc Ginástico. Quinta a domingo, 19h.
segunda-feira, 23 de abril de 2012
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