sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Kallias ou Sobre a Beleza
Friedrich Schiller

Quando se diz que uma pessoa está belamente vestida? Quando nem a roupa – através do corpo – nem o corpo – através da roupa – ferem algo em sua liberdade; quando a roupa se afigura como se nada tivesse a ver com o corpo e, no entanto, satisfaz à perfeição o seu fim. A beleza ou, antes, o gosto, considera todas as coisas como fins em si e simplesmente não tolera que uma sirva de meio para a outra ou suporte o jugo.

No mundo estético, todo ser natural é um cidadão livre que tem os mesmos direitos em relação ao mais nobre, e não lhe é permitido ser coagido, nem sequer por causa do todo, tendo simplesmente de consentir com o todo. Nesse mundo estético, que é um mundo totalmente diferente da mais perfeita república platônica, também o casaco que eu trago no corpo me exige respeito pela sua liberdade; e ele me pede, como um criado envergonhado, que eu não deixe ninguém perceber que ele me serve.

Em contrapartida, ele também me promete usar sua liberdade tão modestamente que a minha nada sofrerá com isso; e se ambos mantêm a palavra, então todo mundo dirá que estou belamente vestido. Se, pelo contrário, o casaco aperta, então ambos perdemos, o casaco e eu, em nossa liberdade.

Por isso todos os tipos de roupa totalmente justas e totalmente largas são igualmente pouco belas; pois se não levamos em conta que ambas limitam a liberdade de movimentos, o corpo, com roupa justa, mostra sua figura apenas ao custo da roupa e, com roupa larga, o casaco esconde a figura do corpo, inflando-se com sua figura e reduzindo o seu dono a seu mero portador.

Uma bétula, um pinheiro, um choupo são belos se se erguem de modo esguio; um carvalho, se verga; a causa está em que, abandonados a si mesmos, este ama a orientação curva e aqueles, ao contrário, a orientação reta. Mas se o carvalho se mostra esguio e a bétula curvada, então ambos não são belos, pois suas orientações traem uma influência estranha, heteronomia. Ao contrário, se o choupo é vergado pelo vento, então o achamos de novo belo, pois manifesta sua liberdade através de seu esguio movimento oscilante.
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Este pequeno fragmento foi extraído do livro “Kallias ou Sobre a Beleza”, que exibe a correspondência entre Schiller e Körner no período janeiro-fevereiro de 1793. Jorge Zahar Editor. Tradução e introdução de Ricardo Barbosa.


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