Teatro/CRÍTICA
"Amores, perdas e meus vestidos"
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Memória de múltiplos afetos
Lionel Fischer
"Escrevi este livro para que minhas netas soubessem que não fui sempre a avó delas, e achei que eram histórias particulares, mas parece que são histórias comuns para outras mulheres também. É ainda uma oportunidade para homens compreenderem um pouco melhor o universo feminino".
Este trecho, extraído do release que me foi enviado, exibe as premissas básicas que levaram Ilene Beckerman a escrever "Amores, perdas e meus vestidos", levado à cena pelas irmãs Delia e Norah Ephron, cabendo registrar que, ao contrário do que ocorre aqui, na montagem norte-americana as atrizes fazem uma leitura dramatizada do texto.
Em cartaz no Teatro do Leblon (Sala Fernanda Montenegro), "Amores, perdas e meus vestidos" chega à cena com adaptação de Adriana Falcão, direção de Alexandre Reinecke e elenco formado por Arlete Salles, Carolina Ferraz, Ivone Hoffmann e Taís Araújo.
Como também consta do release, estamos diante de mulheres que "dividem experiências de vida a partir das memórias das suas roupas". E aqui reside o grande achado do texto, pois se tudo se resumisse a conjecturas sobre vestidos, bolsas ou sapatos, o interesse ficaria restrito às mulheres.
No entanto, a lembrança dos objetos está intimamente ligada à memória de múltiplos afetos, anseios, encontros e desencontros de várias naturezas. Assim, o que está realmente em causa são os sentimentos, e nisto consiste o maior mérito desta peça sensível e surpreendente, quase sempre muito engraçada, ainda que contendo algumas passagens amargas.
Como todos sabemos, é literalmente impossível definir uma mulher. Mas se tivesse que fazê-lo, ousaria dizer o seguinte: acredito que toda mulher é uma criatura ao mesmo tempo divertida e trágica, insolente e delicada, frágil e transgressora, que jamais pode ser totalmente apreendida, já que está sempre em permanente processo de mutação, sejam quais forem seus amores, perdas ou vestidos ...- trata-se, naturalmente, de uma singela opinião e, como tal, sujeita a todos os enganos.
Mas vamos adiante. Como não li o original, não tenho condições de avaliar a adaptação de Adriana Falcão. Mas, conhecendo seus muitos trabalhos, não reluto em acreditar que seja ótima. E no que se refere à encenação, Alexandre Reineck criou uma montagem que, mesmo mantendo quase sempre uma estrutura confessional, cativa totalmente a platéia. E isto se deve, fundamentalmente, à sua ótima atuação junto ao elenco.
Estamos diante de quatro atrizes que, embora de idades variadas, possuem vasta experiência e carreiras extremamente bem-sucedidas. Arlete Salles, extraordinária comediante, demonstra aqui não apenas o óbvio - seu maravilhoso tempo de comédia - mas também sua capacidade de impor tragicidade ao momento mais tocante do espetáculo, quando sua personagem relata sua experiência ao saber que tinha um câncer de mama. Sem dúvida, uma performance inesquecível.
Ivone Hoffmann, tão experiente quanto Arlete, também convence plenamente em todos os momentos, cabendo ressaltar a empatia que estabelece com o público através da forma como narra e vivencia os fatos relativos à sua personagem.
Carolina Ferraz, cuja beleza sugere a de alguém que não é deste mundo - talvez seja oriunda de Vênus, a primeira estrela - exibe atuação impecável, evidenciando não apenas o que dela já conhecemos (presença, carisma, forte personalidade etc.), mas um senso de humor absolutamente irresistível.
Quanto a Taís Araújo, cuja gravidez a tornou ainda mais charmosa - se é que isso é possível -, a atriz demonstra segurança, ótimo trabalho corporal e sensível capacidade de impor nuances às suas múltiplas participações.
No tocante à equipe técnica, destacamos com grande entusiasmo a criativa cenografia de Theodoro Cochrane, também responsável pelos sóbrios e adequados figurinos. A mesma criatividade se faz presente na iluminação de Aurélio de Simoni e na trilha sonora de Alexandre Elias.
AMORES, PERDAS E MEUS VESTIDOS - Texto de Delia e Norah Ephron, inspirado no livro de Ilene Beckerman. Adaptação de Adriana Falcão. Direção de Alexandre Reinecke. Com Arlete Salles, Carolina Ferraz, Ivone Hoffmmann e Taís Araújo. Teatro do Leblon (Sala Fernanda Montenegro). Quinta, 21h. Sexta e sábado, 21h30. Domingo, 20h.
segunda-feira, 31 de janeiro de 2011
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