quinta-feira, 23 de abril de 2009

Cabaré:
origem e trajetória do gênero

Lawrence Senelik

A palavra Cabaré tem sua origem no espanhol (cabaretta ou casa de diversões). Posteriormente, foi incorporada pelo francês (cabaret ou taverna). O gênero Cabaré indica um espetáculo de entretenimento em pequena escala, por vezes improvisado, no qual são apresentadas canções, esquetes, sátiras e discursos, cujo teor costuma ser um comentário sobre as condições sociais, políticas ou artísticas. Um acontecimento estritamente urbano, o cabaré surgiu como uma forma de diversão pioneira para uma audiência seleta, passando a ser apresentada, posteriormente, para um público mais amplo.

Início

Em 1878, Emile Goudeau fundou um clube no Le Sherry Cobbler, em Paris, onde poetas liam suas próprias produções. Foi, porém, no Chat Noir (nome tirado do conto "O gato preto", de Edgar Allan Poe) que deu origem ao termo genérico "cabaré artístico" a programas apresentados em cafés e bares. Ele foi fundado em 1881 pelo pintor Rudolphe Salis, que lhe deu o nome de cabaré porque as canções e esquetes se sucediam como os pratos de um menu. O local que ocupavam em Montmartre - com 60 lugares e projetado em estilo Luís XIII - era palco não somente de leitura de poesia nas noites de sexta-feira, bom como de complexos jogos de sombra, para os quais renomados artistas escreviam os textos e elaboravam os projetos, além de fazerem o acompanhamento musical. Quando o Chat Noir mudou-se para um prédio novo e elegante em 1885, a sua sede antiga abrigou o Le Mirliton, de Aristide Bruant, um dos muitos cabarés de Montmartre por ele inspirados. A atmosfera acolhedora permitiu que muitos artistas, como Yvette Guilbert, desenvolvessem uma forma nova e sutil de atuação e tratassem de assuntos naturalistas.

Exibicionismo

Na Alemanha, o primeiro verdadeiro cabaré foi o Überbrett (Superpalquinho), criado pelo barão Ernst von Wolzogen e Otto Julius Bierbaum, em 1901, para oferecer uma forma mais elevada de espetáculos de variedades. O seu afetado exibicionismo artístico levou Alfred Kerr a criticá-lo por desprezo à arte. No mesmo ano, o jovem Max Reinhardt e atores do Deutsches Theater inauguravam o Schall und Rauch (Barulho e Fumaça) de Berlim, e Frank Wedeking cantava ao violão seus poemas macabros no Elf Scharfrichter (Onze Carrascos). Os escritores e artistas vinculados ao jornal satírico Simplicissimus apresentavam-se no cabaré homônimo de Kathi Kobus, em Munique. Esses cabarés artísticos misturavam baladas, canções, peças em um ato, dança, teatro de marionetes e música instrumental em um programa cuja coesão era mantida por um mestre de cerimônias. O objetivo primordial era divertir e difundir novas tendências literárias.

Semelhança

Propostas semelhantes eram apresentadas no Els Quatre Gats (Os Quatro Gatos), em Barcelona e no Zielony Balonik (O Balão Verde) na Cracóvia, nascidas de encontros de pintores. Na Rússia, as associações eram mais ligadas ao teatro. O Letuchaya Mysh (O Morcego) foi criado por Nikita Baliev e a partir das hilariantes Festas do Repolho promovidas pelo Teatro de Arte de Moscou, rapidamente transformou-se em um teatro em miniatura apresentando peças e cenas baseadas na literatura clássica russa e no folclore. Após a revolução, tornou-se mundialmente famoso como Le Chauve-Souris. O Krivoe Zerkalo (O Espelho Curvo), fundado em 1908, em São Petersburgo, era, sob a direção de Nicolai Evreinov, uma casa que se destacava pela paródia e formas experimentais, tais como o melodrama. O mais literário desses cabarés era o Brodyachaya Sobaka (O Cão Vadio, 1913-1915), refúgio de futuristas. Ele foi sucedido pelo Prival Komediantov (Repouso dos Comediantes, 1916-1919), um teatro aconchegante que tinha na presidência Vsevolod Meyerhold.

Dissidência

O mais radical desses parques de diversão artísticos foi o Cabaret Voltaire, em Zurique (1916-1917), onde Hans Arp e Tristan Tzara deram os primeiros passos do dadaísmo, que não demoraria a expandir-se como um movimento artístico independente. Após a Primeira Guerra-Mundial, os cabarés alemães, especialmente em Berlim, tornaram-se mais políticos, solo fértil para a dissidência. Podem ser citados: Wilde Bühne (Palco Selvagem, 1921), de Trude Hesterberg; Kabarett der Komiker (Cabaré do Comediante, 1924); o antifascista Katakombe (Catacumbas, 1929), de Werner Finck; e Tingel-Tangel (1930), de Firederich Hollaender. Antes de 1935, os nazistas baniram os cabarés e alguns artistas, como Finck, foram mandados para campos de concentração; outros emigraram e mantiveram cabarés itinerantes, como o Pfeffer-Mühle (Moinho de Pimenta), de Klaus e Erika Mann e Therese Giesche (1933).

Renovação

O cabaré pós-guerra na Alemanha, tanto oriental como ocidental, esforçou-se para renovar sua atividade política. Havia uma tendência que visava programas cuidadosamente estruturados e encenação precisa no Schaubude (Palco de Curiosidades), de Munique; Komödchem (A Pequena Comédia), de Düsseldorf; e Die Lach und Schiessgesellsweine (A Sociedade do Riso e do Tiro), de Munique. Eles, porém, bem como o Stachelschweine (Porco-espinho, fundado em 1949), de Berlim Ocidental, tiveram dificuldades em competir com a televisão. Já os cabarés de Berlim Oriental tiveram que direcionar sua sátira excluvivamente para alvos internacionais. Em tempos de agitação política, eles se revelaram menos mordazes do que o teatro de rua e os grupos agit-prop.

Improvisação

No mundo de língua inglesa, os cabarés foram equiparados a clubes noturnos até os anos 60, quando o Second City (Segunda Cidade), de Chicago, deu ênfase à iprovisação e elaborou esquetes diante do público. Ele deu origem a uma grande quantidade de imitações, como The Premise (O Local), de São Francisco, e The Propositiom (A Proposta), de Boston, ambos organizados por grupos estudantis. Após a temporada de grande sucesso da peça de teatro de revista "Beyond the fringe", "The Establisment" (O Estabelecimento, 1961), um clube noturno londrino, procurou manter o ar irreverente.

Tendências

Tendências recentes incluem os clubes de comédia, nos quais artistas inexperientes se apresentam perante um público pouco exigente por um cachê reduzido - este fenômeno já havia sido previsto no Cabaré dos Anônimos, em Berlim, em 1926, onde amadores faziam papel de bobos. A natureza casual do empreendimento contrasta com as intenções programáticas do cabaré artístico. Mais de acordo com a tradição de vanguarda foi o Vaudeville da Nova Onda, uma mistura musical maluca originária do rock punk.

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Artigo extraído de The Cambridge Guide to World Theatre, 1988. Tradução de Patrícia B. Lehman. Este artigo foi publicado pela revista Cadernos de Teatro, 1998, edição já esgotada.






2 comentários:

  1. Lionel

    Meu nome é Ingrid. Eu pratico dança do ventre, tribal e atualmente ingressei no ballet. Ocorre que esse ano o tema da formatura são países e eu ia dançar jazz. Só que o tema foi escolhido já por outro aluno (que a propósito é bailarino). Gostaria de saber se existem vídeos de cabaré para que não fique tão exagerado, mas tb não imite o rapaz...o cabaré se utiliza de quais modalidades de dança...ele é mais teatral?

    Obrigada

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  2. Caro Lionel, o meu nome é Ana Carvalho, eu estou neste momento a tirar o 2 ano do Mestrado de Artes Performativas, onde vou apresentar o meu projecto. Eu decidi fazer um espectáculo de Cabaret, onde já tenho algum material e ideias para o mesmo.Como ainda estou na fase de pesquisa, estou a recolher material, as origens, a "essência" do verdadeiro Cabaret. Li o seu artigo, que achei muito interessante! Ainda é possível encontrar este artigo para consulta? Poderia aconselhar-me outros artigos ou livros sobre o tema para o meu trabalho?
    Desde já agradeço a atenção!
    Melhores cumprimentos
    Ana

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