terça-feira, 29 de março de 2011

Cenário / Iluminação/ Música

Tadeusz Kowzan

* Os textos que se seguem foram extraídos do cap. 5 ("Os signos no teatro - introdução à semiologia da arte do espetáculo), que integra o volume "Semiologia do Teatro" (Editora Perspectiva, 1978). Do referido capítulo, que se inicia com pertinentes considerações sobre o SIGNO, constam ainda tópicos sobre A Palavra, O Som, A Mímica Facial, O Gesto, O Movimento Cênico do Ator, A Maquilagem, O Penteado, O Vestuário, O Acessório e O Ruído. Isa Kopelman responde pela tradução.  

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CENÁRIO

          A tarefa primordial do cenário, sistema de signo que se pode tembém denominar de dispositivo cênico, decoração ou cenografia, é a de representar o lugar: lugar geográfico (mar, montanha, campo), lugar social (praça pública, lanoratório, cozinha, bar), ou os dois ao mesmo tempo (rua dominada por arranha-céus, salão com vista para a torre Eiffel). O cenário ou um de seus elementos pode também significar o tempo: época histórica (templo grego), estações do ano (tetos cobertos de neve), certa hora do dia (o sol se escondendo, a lua).

          Ao lado de sua função semiológica de determinar a ação no espaço e no tempo, o cenário pode conter signos que se relacionem com as mais variadas circunstâncias. Limitar-nos-emos a constatar que o campo semiológico do cenário teatral é quase tão vasto quanto os de todas as artes plásticas: Pintura, Escultura, Arquitetura, Arte Decorativa. Os meios dos quais o cenógrafo se serve são muito variados. Sua escolha depende da tradição teatral, da época, das correntes artísticas, dos gostos pessoais, das condições materiais do espetáculo.

          Há cenários ricos em detalhes e cenários que se limitam a alguns elementos essenciais, até mesmo a um único elemento. Num interior burguês sobrecarregado, cada móvel e cada objeto (maciço, pintado ou de papelão) é o signo em primeiro grau de um móvel ou de um objeto real, mas a maior parte deles somente tem significação individual no segundo grau; são as combinações de diversos signos no primeiro grau e, às vezes, sua totalidade, que constituem o signo no segundo grau, signo de um interior burguês. No caso em que o cenário teatral limita-se a um único elemento, a um único signo, este torna-se automaticamente o signo no segundo (e mesmo no terceiro) grau.

           O valor semiológico do cenário não se esgota nos signos implicados em seus elementos. O movimento dos cenários, a maneira de colocá-los ou de mudá-los pode trazer valores complementares ou autônomos. Um espetáculo pode dispensar inteiramente o cenário. Neste caso, seu papel semiológico é retomado pelo gesto e o movimento (expediente ao qual recorre, voluntariamente, a pantomima), pela palavra, ruído, vestuário, acessório e também pela iluminação.


ILUMINAÇÃO

          A iluminação teatral é um procedimento bastante recente (na França ela foi introduzida somente no século XVII). Explorada principalmente para valorizar os outros meios de expressão, pode ter, não obstante, um papel semiológico autônomo. Em vista dos rápidos progressos, desde a aplicação da eletricidade, quer dizer, desde mais de um século, a iluminação teatral, com seus mecanismos aperfeiçoados de distribuição de comando, encontra um emprego cada vez mais amplo e rico do ponto de vista semiológico, tanto na cena fechada como nos espetáculos ao ar livre.

          Inicialmente, a iluminação é capaz de delimitar o lugar teatral: o facho de luz concentrado numa determinada parte do palco significa o lugar momentâneo da ação. A luz do projetor permite também o isolamento de um ator ou de um acessório. Ela o faz não somente com o fim de delimitar o lugar material, mas também para pôr em relevo tal ator ou tal objeto em relação com aquilo que os rodeia; ela se torna o signo da importância, momentânea ou absoluta, da personagem ou do objeto iluminado.

          Uma função importante da iluminação consiste em poder ampliar ou modificar o valor semiológico novo; o rosto, o corpo do ator ou o fragmento do cenário são às vezes "modelados" pela luz. A cor difundida pela iluminação pode também desempenhar um papel semiológico.

          Deve-se reservar um lugar especial para as projeções. Por seu funcionamento, elas se ligam ao sistema de iluminação, mas seu papel semiológico ultrapassa largamente o sistema em questão. É necessário, inicialmente, distinguir a projeção imóvel da projeção móvel. A primeira pode contemplar ou substituir o cenário (imagem ou fotografia projetada), a segunda acrescenta efeitos dinâmicos (o movimento das nuvens, movimento das ondas, imitação da chuva ou da neve).

          O emprego da projeção no teatro contemporâneo toma formas bastante variadas: ela se tornou um meio técnico de comunicar signos pertencentes a sistemas diferentes, e mesmo situados fora deles. Por exemplo, a projeção cinematográfica no decorrer de um espetáculo teatral deve ser analisada, inicialmente, no quadro da semiologia do cinema; o fato de que esta projeção exista é, para nós, um signo de grau composto: este se passa simultaneamente em um outro local, ou trata-se de sonhos da personagem.


MÚSICA

          A música, que é um dos grandes domínios da Arte, exigiria estudos especializados a fim de destacar seus aspectos semânticos ou semiológicos. De qualquer maneira, o valor significativo da "música de programa", da "música imitativa" tem sido evidente. Mas um método de análise válido só é possível a partir da pesquisa semiológica ao nível das estruturas fundamentais da música - ritmo, melodia, harmonia - baseadas nas relações de intensidade, de duração, de altura e de timbre dos sons. Estas pesquisas ainda não ultrapassaram um estágio preliminar.

          No que concerne à musica aplicada ao espetáculo, sua função semiológica é quase sempre indubitável. Os problemas específicos e muito difíceis colocam-se no caso em que ela é o ponto de partida de um espetáculo (ópera, balé). No caso em que ela é acrescentada ao espetáculo, seu papel é o de sublinhar, de ampliar, de desenvolver, às vezes de desmentir os signos dos outros sistemas, ou de substituí-los.

          As associações rítmicas ou melódicas ligadas a certos gêneros de música (minueto, marcha militar) podem servir para evocar a atmosfera, o lugar ou a época da ação. A escolha do insturmento tem também um valor semiológico, podendo sugerir o lugar, o meio social, o ambiente. Entre os numerosos empregos que os diretores fazem da música, pensemos, por exemplo, no tema musical que acompanha as entradas de cada personagem e torna-se signo (em segundo grau) de cada uma delas, ou num exemplo de motivo musical que, acrescentado às cenas retrospectivas, significa o contraste presente-passado.

          Um lugar particular deve ser reservado à música vocal, cujos signos estão estritamente ligados aos da palavra e da dicção (como palavra e tom estão ligados na linguagem falada). Portanto, a música significa às vezes outra coisa diferente do texto (por exemplo, música suave e texto cruel). Num espetáculo de ópera, a tarefa do semiólogo é mais complicada porque os signos da música manifestam-se simultaneamnente em dois níveis: ao nível instrumental e ao nível vocal. Numa certa medida, também é assim o caso da opereta e da canção.
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