quarta-feira, 2 de março de 2011

Teatro/CRÍTICA

                          "Um coração fraco"

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Obra-prima em excelente versão


Lionel Fischer


"O jovem Vassia, pobre e frágil, trabalha em uma repartição pública como copista. Seu companheiro de quarto, Arkaddi, é alto e forte, mas igualmente pobre. A relação que os une é da mais paternal amizade. Na noite de Natal, Vassia se apaixona por Lisanka, uma moça da idade dele e também pobre. Resolvem casar e viver juntos - com a mãe e o irmão dela, menino ainda. E naturalmente, Arkaddi. Para ganhar um dinheiro extra, Vassia se compromete em preparar para o Ano Novo uma grande quantidade de cópias. A paixão por Lisanka, no entanto, impede que o rapaz tenha qualquer outro pensamento a não ser o amor e a felicidade, e ele acaba por perder o prazo de entrega do trabalho. Entre a paixão e a tarefa impossível, Vassia ultrapassa suas forças. Passa noites em claro e termina por enlouquecer. Para quem nunca foi feliz, a felicidade é insuportável".

O trecho acima, extraído do release que me foi enviado, resume o enredo da novela "A felicidade", de autoria de Fiodor Dostoievski, adaptada para o palco por Domingos Oliveira com o título "Um coração fraco". Priscilla Rozenbaum assina a direção do espetáculo (Teatro das Artes), que tem elenco formado por Caio Blat (Vassia), Isabel Guéron (Lisanka), Cadu Fávero (Arkaddi) e Sofia Torres (Mãe).

Certamente me falta autoridade para afirmar o que se segue, mas considero Dostoievski o melhor escritor de todos os tempos. Em suas vasta e diversificada obra, o gênio russo conseguiu um feito semelhante ao de Shakespeare na dramaturgia: empreender um mergulho profundo nos mais diversos componentes da alma humana, valendo-se de personagens magníficos e de uma narrativa que escraviza o leitor desde a primeira página.

Assim, nada mais natural que "Um coração fraco" possibilite intensa emoção e agudas reflexões sobre questões como amor, amizade, lucidez, loucura e felicidade, dentre outras. Mas não seria nem um pouco "natural", ao menos em princípio, que uma adaptação conseguisse converter sublime literatura em teatro. No entanto, sendo Domingos Oliveira um mestre no tocante a adaptações, o "milagre" se materializa.

Mas este também deve ser creditado à ótima direção de Priscilla Rozenbaum, não apenas no tocante à dinâmica cênica - sombria, afetuosa, plena de nervosidade e impregnada de contrastes -, mas também à sua irretocável atuação junto ao elenco.

Na pele de Vassia, Caio Blat consegue materializar toda a paixão e fragilidade do personagem, o mesmo ocorrendo com Cadu Fávero, que extrai de Arkaddi suas principais características - sua amizade incondicional pelo frágil e apaixonado amigo, assim como sua tenaz disposição de protegê-lo. A mesma eficiência se faz presente na performance de Isabel Guéron como Lisanka, sendo correta a menor participação de Sofia Torres vivendo a Mãe.

Na equipe técnica, é simplesmente deslumbrante a cenografia de Fernando Mello da Costa, irretocável em seu retrato da miserável habitação dos protagonistas. Maneco Quinderá responde por uma iluminação sombria e expressiva, a mesma expressividade presente nos figurinos de Angele Fróes.

UM CORAÇÃO FRACO - Texto de Dostoievski. Adaptação de Domingos Oliveira. Direção de Priscilla Rozenbaum. Com Caio Blat, Cadu Fávero, Isabel Guéron e Sofia Torres. Teatro das Artes. Segunda e terça, 21h. 

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