quarta-feira, 30 de março de 2011

Teatro/CRÍTICA

"A escola do escândalo"

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Texto excessivo em belíssima versão


Lionel Fischer


Antes de tecer algumas considerações sobre o presente espetáculo, julgo pertinente falar um pouco sobre seu idealizador, Miguel Falabella. Exceção feita aos invejosos "natos e hereditários"
(como dizia Nelson Rodrigues) ou aos destituídos de um mínimo de caráter, todos hão de reconhecer que Miguel Falabella é um homem de teatro completo, atuando com idêntico êxito em múltiplas funções - autor, diretor, ator, produtor, adaptador, tradutor etc.

E no tocante à sua participação na TV, algo de semelhante acontece: atua, adapta, escreve, comandou durante anos o "Vídeo Show", foi um dos pilares do humorístico "Sai de Baixo" etc. Não contente, assinou durante muito tempo belíssimas crônicas no jornal O Globo. Pois bem: estamos ou não diante de um homem cujo talento está mais do que comprovado em tantos e diversificados meios de expressão? Caso alguém discorde do já exposto, cabe lembrar que contra fatos não há argumentos

Além disso, nunca é demais relembrar que Miguel Falabella é um comediógrafo por execelência, e ao escolher "A escola do escândalo", do irlandês Richard Brinsley Sheridan (1751-1815), certamente o fez por acreditar que o texto contém elementos capazes de interessar platéias contemporâneas. E ele os possui, sem dúvida, mas com muitas ressalvas, como tentarei indicar a seguir.

Em cartaz no Espaço Tom Jobim, "A escola do escândalo" chega à cena com direção, tradução e adaptação de Miguel Falabella e elenco formado por Ney Latorraca (Comendador Pedro Atiça), Maria Padilha (Rosália Atiça), Bruno Garcia (José Fachada), Guida Vianna (Tia Olívia), Rita Elmôr (Dona Benferina), Edi Botelho (Benjamin Mordessopra), Chico Tenreiro (Barata), Bianca Comparato (Maria), Armando Babaioff (Carlos Fachada) e Jacqueline Laurence (Dona Cândida).

Tendo como temas centrais a futilidade, a compulsão de falar mal da vida alheia e a hipocrisia, Sheridan ambientou seu texto no universo dos aristocratas, que, ontem como hoje, nutrem singular volúpia no exercício permanente de tais predicados. Ocorre, porém, que lhe falta o brilho e a verve de um Oscar Wilde, por exemplo, mesmo levando-se em conta o humor crítico de algumas passagens.

Outra questão diz respeito ao tamanho do texto. Sei que Miguel reduziu drasticamente a peça, inclusive cortanto inúmeros personagens. Mas, ainda assim, é excessiva a quantidade de palavras, assim como muito longas algumas cenas. Para minimizar tais questões, a única alternativa possível seria a de impor um ritmo alucinante à montagem, mas isto evidentemente privaria a platéia de um maior entendimento sobre o texto, as relações entre os personagens e assim por diante.

E aqui me ocorre uma única indagação, decorrente do que disse nos dois parágrafos iniciais: sendo Miguel Falabella um comediógrafo por excelência, será que não percebeu que, mesmo fazendo tantos ajustes no texto, cortando personagens e tentando imprimir à cena um ritmo em consonância com o material dramatúrgico, ainda assim a montagem dificilmente conseguiria "decolar"? E atentem para o fato de que estamos diante de uma produção primorosa e em cena estão atores, em sua maioria, de altíssimo nível. Mas mesmo assim, só em raros momentos consegui estabelecer alguma relação mais significativa com o espetáculo. E isto se deve, como já deve ter ficado claro, ao texto.

Quanto à direção, Miguel Falabella impõe à cena uma dinâmica divertida e crítica, valendo-se de marcações criativas e imprevistas. E no que concerne à sua atuação junto ao elenco, é evidente que os profissionais mais afeitos à comédia acabam se destacando, como é o caso de Ney Latorraca, Guida Vianna e Jacqueline Laurence, cabendo mencionar a ótima composição de Maria Padilha, cuja personagem, agora integrada à alta sociedade, não consegue esconder sua origem humilde. Quanto aos demais, todos exibem atuações corretas, mas é possível que, com o transcorrer dos espetáculos, consigam encontrar um tom que se ajuste mais ao universo da comédia.

Com relação à equipe técnica, Lia Renha assina uma cenografia deslumbrante, o mesmo ocorrendo com os figurinos de Emilia Duncan. Antonio Mecha e Leandro Lapagesse respondem por uma trilha musical em sintonia com os climas emocionais em jogo, cabendo ainda destacar a sóbria iluminação de Orlando Schaider e sobretudo a irretocável direção de movimento de Marcia Rubin.

A ESCOLA DO ESCÂNDALO - Texto de Richard B. Sheridan. Direção de Miguel Falabella. Grande elenco. Espaço Tom Jobim. Sexta e sábado, 20h30. Domingo, 20h.


  

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