Teatro/CRÍTICA

"Fascinante Gershwin"

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Encontro memorável e inesquecível


Lionel Fischer


Costuma-se dizer que "quem não gosta de samba, ou é ruim da cabeça ou doente do pé". Nada mais verdadeiro, convenhamos. Mas aqui não se trata de samba e, no entanto, ouso afirmar que alguém que saia deste espetáculo imune ao encanto que ele gera padece de todas as mazelas possíveis e imaginárias, possuindo não apenas uma cabeça ruim ou um pé deficiente, mas sobretudo um coração incapaz de se deixar impregnar pela beleza, pelo humor, pelo lirismo, enfim, por tudo que se faz presente - e em doses superlativas - nesta inesquecível montagem, em cartaz no Centro Cultural da Justiça Federal.

Estou me referindo, obviamente, a "Fascinante Gershwin - uma revista musical", espetáculo que reúne mais de 30 canções dos geniais irmãos George e Ira Gershwin e tem como enredo a disputa de três pretendentes pela mesma moça. Com direção assinada por Rubens Lima Jr, supervisão de Marília Pêra, direção musical e arranjos vocais de Jules Vandystadt, "Fascinante Greshwin" está em cena com um elenco formado pelos atores-cantores Sabrina Korgut, Chris Penna, Fabrício Negri e Rodrigo Cirne, acompanhados pelo pianista Tony Lucchesi, pelo violoncelista Luciano Correa e pelo baterista Leo Flag.

Como imagino ser impossível que alguém desconheça quem foram, o que produziram e a importância dos irmãos Gershwin - a menos que esse "alguém" não tenha nenhuma relação com teatro ou música -, julgo desnecessário tecer maiores considerações sobre a genialidade da vasta produção da dupla. Vamos, portanto, passar diretamente à avaliação desta memorável montagem.

E por que memorável? E aqui me permito uma brincadeira semântica: porque "Fascinante Gershwin" ficará eternizada na memória dos que tiveram o privilégio de asistí-la. E tal privilégio é fruto de muitas causas. Não bastasse serem deslumbrantes as canções dos irmãos George e Ira, estas são interpretadas de forma absolutamente impecável pelos quatro atores, que, não contentes com este fato já em si notável, estabelecem ótima contracena através da música, das passagens em que a dança predomina e também quando determinados conteúdos são expressos através do sapateado - e aqui devo admitir minha desmesurada inveja quando vejo alguém, valendo-se apenas dos pés, transformá-los quase que numa extensão do próprio coração.

Além disso, há que se destacar a sensibilidade do diretor Rubens Lima Jr, que, apoiado na maravilhosa coreografia de Fabrício Negri, conseguiu utilizá-la não apenas como ilustração das canções, mas sobretudo para enfatizar a relação entre os personagens, tanto nas passagens mais engraçadas quanto naquelas em que a tristeza predomina. E certamente deve ter aproveitado muito a supervisão de Marília Pêra, sabidamente uma das melhores atrizes deste curioso planeta que habitamos, e cujo talento e experiência serão sempre de enorme valia em um espetáculo, ainda que ela apenas opine sobre a posição de um refletor - Marília, como todos sabemos, entende mais de palco do que a soma de muitos encenadores que se julgam bem mais ilustres do que realmente o são.

E se a tudo que já foi dito somarmos a excelência da direção musical e dos arranjos, a maravilhosa atuação dos músicos, a expressividade da luz de Paulo César Medeiros e os ótimos figurinos (ao que parece, não assinados), o resultado só poderia ser o que já foi dito: uma empreitada teatral memorável, que me fez sair do teatro não apenas cantalorando trechos de algumas músicas (de forma afinada, que fique bem entendido), mas sobretudo acreditando cada vez mais que o teatro é realmente a arte do encontro. Desejo, portanto, que os sempre caprichosos deuses do teatro abençoem esta montagem e permitam que ela fique em cartaz por muito tempo, pois assim muitos terão o privilégio, como eu tive, de viver uma noite em que a felicidade me fez companhia permanente.

FASCINANTE GERSHWIN - Musical reunindo canções dos irmãos George e Ira Gershwin. Direção de Rubens Lima Jr. Supervisão de Marília Pera. Com Sabrina Korgut, Chris Penna, Fabrício Negri e Rodrigo Cirne. Centro Cultural da Justiça Federal. De sexta a domingo, 19h.