segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Teatro/CRÍTICA

"Pedras nos bolsos"

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Séria e divertida crítica aos EUA


Lionel Fischer


Ambientada numa pequena vila no interior da Irlanda, a peça tem sua ação centrada na relação entre alguns integrantes de uma faustosa produção hollywoodiana e os habitantes do lugar, recrutados como figurantes. Estes, como em geral costuma acontecer, são tratados com uma mescla de sarcasmo e desdém, mas aos poucos suas histórias particulares terminam por alçá-los quase que à condição de protagonistas. No entanto, e sem deixar de ser uma divertida e crítica análise do mundo do cinema, a peça me parece ir um pouco mais além.

Sim, pois a "invasão" hollywwodiana pode também ser interpretada como uma espécie de metáfora da política externa dos EUA, sempre invasiva e intervencionista, e invariavelmente exercida com total descaramento, mesmo que mascarada por nobilíssimas intenções. E é esta abjeta postura que presumo ter sido o principal alvo da autora irlandesa Marie Jones ao escrever "Pedras nos bolsos". Em cartaz no Teatro Poeira, o texto chega à cena com direção de David Herman, tradução de Ana Luiza Martins Costa e Laura Ronai, e elenco formado por Luiz Furlanetto (Jake) e Paulo Trajano (Charlie).

Sendo verdadeira minha suposição, cumpre destacar que a considero mais que oportuna. Mas é lógico que tal premissa poderia redundar em algo muito aquém do pretendido. Entretanto, ocorre justamente o oposto. A começar pela ousadia da autora, que construiu seu brilhante texto valendo-se apenas de dois atores, que interpretam 15 personagens, além dos já mencionados.

Isto pressupõe, naturalmente, intérpretes capacitados a encarnar diversas e díspares personalidades. Mas o desafio é ainda maior, na medida em que os atores entram e saem dos personagens sem mudanças de figurino, alterações de caracterização etc. Ou seja: uma peça escrita para Atores e não para oportunistas que, aproveitando-se do sucesso obtido em outros veículos, costumam profanar o palco com sua incompetência.

Neste sentido, tanto Luiz Furlanetto como Paulo Trajano dão um show de competência, contracena e capacidade de entrega, com o primeiro ficando em geral responsável pelas passagens mais densas e o segundo por aquelas em que o humor predomina. Mas é evidente que as notáveis performances de ambos contaram com a preciosa colaboração de David Herman, que além de ótimo diretor é um dos melhores professores de teatro desta cidade. Afora isso, Herman consegue impor à cena uma dinâmica ágil, surpreendente e altamente expressiva, assim contribuindo de forma decisiva para o incontestável êxito de "Pedras nos bolsos".

Com relação à equipe técnica, destacamos com o mesmo entusiasmo a fluente tradução de Ana Luiza Martins Costa e Laura Ronai, os apropriados figurinos de Desirée Bastos, a expressiva iluminação de Wilson Reis e som de Daniel Santamaria - digo "som" porque assim está escrito no ótimo release que me foi enviado, mas suponho que Santamaria tenha assinado a trilha sonora.

PEDRAS NOS BOLSOS - Texto de Marie Jones. Direção de David Herman. Com Luiz Furlanetto e Paulo Trajano. Teatro Poeira. Sexta e sábado, 21h. Domingo, 19.

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