Teatro/CRÍTICA
“Master class”
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Recriação
memorável da diva
Lionel
Fischer
Após cumprir temporada em São Paulo, chega ao Rio de
Janeiro “Master class”, de Terrence Mc Nally, que em 1995 levou três prêmios
Tony – o Oscar do teatro norte-americano -, inclusive o de melhor espetáculo.
Protagonizada por Marília Pêra, que divide a direção da temporada carioca com
Fábio Namatame, a montagem (Teatro do Leblon) conta ainda com os cantores
líricos Caio Ferraz (que atua como pianista), Isabel Batista, Julianne Daud e
Frederico Vieira, além de Kléber Brandão no papel de um contra-regra.
Abandonada por Onassis, já sem voz e em plena
decadência, Maria Callas deu aulas – que mesclavam palestra e prática – na
Julliard School of Music de Nova York em 1971 e 1972, freqüentadas por alunos
adiantados e celebridades. Mas em função da depressão que a dominava, Callas
evidenciava um humor tão corrosivo que gerava pânico nos alunos. Este fato real
constitui a espinha dorsal do texto – por sinal, excelente – e a ele deve ser
creditado os muitos risos da platéia, que se delicia com os incontáveis “foras”
dados pela diva.
Entretanto, Mac Nelly teve o bom senso de explorar
também o lado mais humano de uma personalidade que combinava vigor e
fragilidade em doses equivalentes. Isto se dá através de recordações que,
trabalhadas de forma algo delirante, revelam algumas das principais carências e
angústias da maior cantora lírica de todos os tempos.
A dupla de diretores estabelece uma dinâmica cênica
que, em total consonância com o material dramatúrgico, tem na simplicidade a
sua tônica. Excetuando-se as passagens em que imagens são projetadas ao fundo,
quando o clima do espetáculo adquire uma atmosfera algo irreal, no geral tudo
ocorre como se os espectadores fossem alunos do curso. Assim, o que de fato
importa é a relação que se estabelece com a protagonista. E esta encontra em
Marília Pêra uma intérprete diante de quem os mais generosos adjetivos se
amesquinham.
Não é de hoje que tenho a plena convicção – só
refutada por invejosos natos ou hereditários, como dizia Nelson Rodrigues – de
que poucas atrizes, em qualquer parte do planeta, têm o magnetismo, o domínio
vocal e corporal desta fantástica intérprete. E quando as condições permitem
que seu talento de exceção encontre campo para expandir-se, o resultado acaba
tornando ingrata a tarefa de esmiuçá-lo em palavras. Mas como esta é a minha
função, não custa tentar.
De acordo com o release enviado à imprensa, Marília
e sua equipe leram vários livros sobre a cantora, assim como assistiram a
vídeos que imortalizaram sua carreira. Isto forneceu à atriz o indispensável
embasamento para a refinada composição que exibe. Mas que ninguém imagine que
Marília se propôs a copiar o modelo, o que só interessaria a uma intérprete
possuidora de parca fantasia. Não: o que se vê em cena é a recriação do mito,
feita por uma artista de fina sensibilidade e dotada de imensos recursos
expressivos.
Tudo surpreende na atuação de Marília: a forma como
inflexiona o texto, a cadência das frases, as pausas, a imprevista e sempre
pertinente valorização de algumas palavras, a esmerada composição física –
neste particular, cabe destacar a expressividade de suas mãos e a maneira como
posiciona o corpo para ressaltar determinados conteúdos. E se a tudo isto
somarmos o carisma e presença cênica da atriz, o resultado só poderia ser uma
atuação que o público carioca jamais esquecerá.
Quanto aos demais intérpretes, os cantores Isabel
Batista, Julianne Daud e Frederico Vieira exibem belas vozes, cumprindo com
correção seus papéis de alunos “massacrados”. Ao piano, Caio Ferraz exibe
técnica e mostra ser um acompanhante primoroso. Kléber Brandão executa com bom
humor o contra-regra algo desajeitado. Com relação à equipe técnica, esta atua
com segurança e eficiência, cabendo destacar os figurinos de Fábio Namatame, a
iluminação de Aurélio de Simoni e sobretudo a preparação corporal feita por
Ricardo Napoleão.
MASTER
CLASS – Texto de Terrence Mc Nally. Direção de Marília Pêra e Fábio Namatame.
Com Marília Pêra, Isabel Batista e outros. Teatro do Leblon.
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