segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Teatro/CRÍTICA

"As traças da paixão"


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Fantasias e dúvidas no Poeira

Lionel Fischer


Como se sabe, alguns textos - medíocres ou primorosos - permitem uma compreensão clara e imediata de seu enredo. Outros, como no presente caso, exigem algum tipo de especulação, pois podem ser apreendidos de diversas formas. Portanto, não sabemos se foi essa a intenção de Alcides Nogueira, mas entendemos seu texto da seguinte forma: tudo que é visto já aconteceu, ou seja, uma mulher (Marivalda), proprietária de um bar de beira de estrada em um local inóspito e isolado, recebe a visita de um estranho (Paco) e com ele permanece enquanto esse estranho se satisfaz com as fantasias (muitas vezes de natureza sexual) que ambos criam de comum acordo. Até que um belo dia ele se vai.

Escrita em 1994, "As traças da paixão" vem de cumprir temporada em São Paulo, e agora pode ser vista no Teatro Poeira. Marco Antonio Braz assina a direção, estando o elenco formado por Lucélia Santos e Maurício Machado.

De acordo com o release que nos foi enviado, o espetáculo utiliza "...uma linguagem atual, bem brasileira e com boas doses de humor sarcástico, une apelo popular e citações históricas (a princesa Anastácia, herdeira dos czares russos) e teatrais (Plínio Marcos, Nelson Rodrigues, Tchecov, Sófocles)". Sem dúvida, tais citações podem ser percebidas - ao menos por um público mais especializado. No entanto, em termos de conteúdo, não fica muito claro o que o autor pretendeu, além do resumo do enredo que fizemos - que pode estar completamente equivocado.

Mas na hipótese de que não esteja, ainda assim o resultado não está à altura de um autor do porte de Alcides Nogueira. Algumas situações ou se arrastam ou se repetem em demasia, gerando a permanente impressão de que tudo se resume mesmo aos tais jogos fantasiosos que os dois personagens estabelecem, mas que jamais nos permitem compreender as razões que os motivam e muito menos deles extrair um significado capaz de nos tocar de forma mais profunda.

Quanto ao espetáculo, Marco Antonio Braz impõe à cena uma dinâmica em sintonia com o material dramatúrgico, criando marcas ora mais atreladas ao real, ora mais impregnadas de um clima delirante e alucinatório. E no tocante à sua atuação junto aos intérpretes, tanto Lucélia Santos como Maurício Machado se entregam corajosamente à tarefa de materializar as, digamos, diferenciadas facetas dos personagens que interpretam, mas certamente poderiam chegar a um resultado mais expressivo se não fossem orientados, de uma maneira geral, a utilizar a voz e o corpo em registros por demais paroxísticos.

Com relação à equipe técnica, Juliana Fernandes responde por uma cenografia que retrata com precisão a decadência do bar, sendo corretos os figurinos que também assina. Roberto Cohen ilumina a cena com sensibilidade, o mesmo aplicando-se à trilha sonora de Tunica.

AS TRAÇAS DA PAIXÃO - Texto de Alcides Nogueira. Direção de Marco Antonio Braz. Com Lucélia Santos e Maurício Machado. Teatro Poeira. Quinta a sábado, 21h. Domingo, 19h.

Um comentário:

  1. Assisti no último sábado "As Traças da Paixão" no teatro do SESC Nova Iguaçu. Por uns 10 minutos iniciais tentei entender o enredo pensando que a história tratasse de alguma coisa enredável, mas logo descobri que de nada adiantaria buscar uma lógica no que eu estava vendo. Gostei de ver a Lucélia em cena uma vez que, quando na época da novela "Escrava Isaura", as pessoas me chamavam por este nome, pois me parecia bastante com a atriz. Gostei também do belo colírio que é Maurício Machado, mas me senti uma idiota, que certamente encontraria depois algum intelectual, que me poderia explicar de forma inútil o significado do que fui ver. Uma vez fui assistir "Gritos e Sussurros", de Bergman e também me senti bastante intrigada sobre o enredo do filme. Mais tarde caiu em minhas mãos um livro que explicava seu significado. Não que eu esteja comparando um com outro. Valeu Lucélia! Valeu Maurpicio!

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