quinta-feira, 26 de maio de 2016

Teatro/CRÍTICA

"Cidade Correria"

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Surpreendente e imperdível



Lionel Fischer



"Cidade Correria é um espetáculo sobre a cidade. A dramaturgia é fruto de trabalho radicalmente coletivo, inspirado em imagens, filmes, situações cotidianas, histórias de vida e contos literários. O espetáculo não é uma história, é uma invasão, um transbordamento de nossas urgências cotidianas, nossas contradições, alegrias, delírios, feridas e potências. Uma cidade inventada, em deriva, que poderia ser a nossa cidade, ou qualquer cidade. Sejam bem-vindos à cidade caos, cidade contradição, cidade maravilhosa, cidade impedida, cidade carnaval, cidade invenção, cidade revolução. Cidade Correria".

O belo trecho acima, extraído do programa, define as premissas essenciais de "Cidade Correria", que, após circular por todas as arenas cariocas no ano passado, está agora em cartaz no Espaço Cultural Sérgio Porto. Criado em 2014, o Coletivo Bonobando responde pela dramaturgia, estando a direção a cargo de Adriana Schneider e Lucas Oradovschi. No elenco, Daniela Joyce, Hugo Bernardo, Igor da Silva, Jardila Baptista, Karla Suarez, Lívia Laso, Marcelo Magano, Patrick Sonata, Thiago Rosa e Vanessa Rocha. 

De acordo com o release que me foi enviado, o grupo pesquisou vários textos, tais como "O bebê de tarlatana rosa" (João do Rio), "A última chuva do prisioneiro" (Mia Couto), "O duelo entre a criança que diz sim e a cidade que diz não" (Thiago Rosa), "Banzeiro" (Ricardo Cotrim), "Cidade Correria 1" (Thiago Florencio) e "Cidade Correria 2" (Daniel Guimarães). E mesmo não tendo condições de avaliar em que medida esses textos foram preservados ou adaptados, é inegável que o resultado final é de excelente qualidade.

Tal excelência se deve a vários fatores, sendo um dos principais a capacidade do grupo de abordar criticamente alguns aspectos da realidade cotidiana de nossa cidade. E essa abordagem, em muitos momentos, envereda para uma recriação desta mesma realidade, apontando eventuais caminhos e novas possibilidades, ora priorizando o lúdico, ora lançando mão de uma ironia devastadoramente cômica. Sem dúvida, e sob todos os aspectos, estamos diante de um dos melhores textos atualmente em cartaz no Rio de Janeiro.

Quanto ao espetáculo, Adriana Schneider e Lucas Oradovschi  impõem à cena uma dinâmica em total sintonia com o material dramatúrgico. Valendo-se de marcações invariavelmente criativas e imprevistas, e trabalhando os tempos rítmicos de forma irrepreensível, a dupla de encenadores exibe o mérito suplementar de haver extraído ótimo rendimento do jovem e carismático elenco.

E embora alguns atores ainda necessitem de um maior aprimoramento técnico, sobretudo vocal, esta pequena e sanável deficiência é amplamente compensada pelo excelente trabalho corporal de todos. E também pela forma corajosa com que se apropriam do espaço, impregnando-o de transbordante energia e conferindo total credibilidade às ideias que defendem. Assim, não me resta outra opção a não ser implorar aos sempre caprichosos deuses do teatro que abençoem este jovem grupo e permita que ele tenha uma bela trajetória artística.

Com relação à equipe técnica, parabenizo com o mesmo entusiasmo as preciosas colaborações de todos os profissionais envolvidos nesta surpreendente e imperdível empreitada teatral - Adriana Schneider (metodologia de dramaturgia), Cátia Costa e Mariana Mordente (direção de movimento), Ricardo Cotrim (direção musical e trilha sonora), Fabiana Mimura (direção de arte), Nina Balbi (iluminação), Cátia Costa (preparação corporal), Lucas Oradovschi (treinamento de máscaras balinesas), Verônica Machado (suponho que a preparadora vocal concorde comigo, mas certamente fez um excelente trabalho, na medida do possível) e Filipe Duarte (assistência de arte). 

CIDADE CORRERIA - Texto coletivo. Direção de Adriana Schneider e Lucas Oradovschi. Com o Coletivo Bonobando. Espaço Cultural Sérgio Porto. Sábado e segunda, 21h. Domingo, 20h.

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