sábado, 14 de agosto de 2010

Teatro/CRÍTICA

"Os inocentes"

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Virulência, solidão e sexualidade


Lionel Fischer


No início, dizem, era o Verbo. Aqui tudo começou com o livro "The Holly Innocentes", do escocês Gilbert Adair, mais adiante levado às telas pelo italiano Bernardo Bertolucci com o título "Os sonhadores" e que agora chega à cena batizado de "Os inocentes". Esta versão teatral, assinada por Julia Spadaccini e Rodrigo Nogueira, conta com direção de César Augusto e Fernanda Félix, supervisão artística de Fernando Eiras e elenco formado por integrantes do Brecha Coletivo - Lisa Fávero, Michel Blois e Patrick Sampaio.

Tendo como pano de fundo os memoráveis acontecimentos ocorridos em Paris, em maio de 1968, a peça gira em torno da pouco ortodoxa relação entre três jovens, completamente apaixonados por cinema, e que se dedicam, com intensa volúpia, a experiências de múltiplas naturezas, inclusive algumas ligadas à sexualidade, e que se materializam através de jogos, digamos, psicológicos.

Isto é o que o espectador vê acontecer em cena. No entanto, me parece que o objetivo dos autores vai um pouco mais além da superfície dos fatos exibidos. Se nos limitamos a eles, ficamos com a sensação de estar diante de um trio um tanto blasé que, na falta do que fazer, consome seu tempo com os já citados jogos. Acredito, porém, que estes devem ser encarados em seu potencial revelador de personalidades inadaptadas, solitárias e que ainda não conseguiram conferir um sentido mais sólido às suas vidas - e, ao que parece, dificilmente o conseguirão.

Caso seja correto este ponto de vista, então o texto de Julia Spadaccini e Rodrigo Nogueira atinge plenamente seus objetivos, cabendo destacar que estes são expostos através de personagens que, mesmo tendo muitas coisas em comum, como já foi dito, não deixam de exibir suas singularidades. Como única ressalva, acho que o texto poderia ser um pouco reduzido, o que só contribuiria para ressaltar ainda mais suas qualidades.

Quanto à direção, César Augusto e Fernanda Félix impõem à cena uma dinâmica em total sintonia com o material dramatúrgico, plena de nervosidade e priorizando uma atmosfera que mescla surpresas, virulência e sexualidade. A mesma eficiência se faz presente no ótimo trabalho dos intérpretes, cabendo apenas ressaltar que, em alguns momentos, o ator Patrick Sampaio deve impor menor velocidade ao texto, para que este se torne completamente apreensível.

Na equipe técnica, destaco com entusiasmo o trabalho de todos os profissionais envolvidos - Tomás Ribas (iluminação), Domingos Alcântara e Vitória Hadba (cenografia, com a colaboração de Rafael Medeiros), Domingos Alcântara e Verônica Pimentel (figurinos), Juliano Gomes e Mariana Kaufman (audiovisual), Átila Calache e Joana Guimarães (trilha sonora) e Priscila Vidca (direção de movimento).

OS INOCENTES - Texto de Julia Spadaccini e Rodrigo Nogueira. Direção de César Augusto e Fernanda Félix. Supervisão de Fernando Eiras. Com Lisa Fávero, Michel Blois e Patrick Sampaio. Teatro Glaucio Gill, Quartas e quintas, 20h.

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