quarta-feira, 8 de julho de 2015

Teatro/CRÍTICA

"2.500 por hora"

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Instrutiva e divertida jornada



Lionel Fischer



Consta que, para redimir-se de haver matado a esposa e filhos em um acesso de loucura (maiores detalhes em uma próxima crítica), o herói mitológico Hércules foi incumbido de realizar as seguintes tarefas:

1) Matar o leão que apavorava a cidade de Neméia; 2) Matar a hidra de Lerna, monstro de 9 cabeças; 3) Limpar os estábulos de Áugias, rei de Élida; 4) Trazer para Admeta, filha de Euristeus, o cinto de ouro de Hipólita, rainha das amazonas; 5) Trazer para Euristeus o boi de Gerião, monstro de três cabeças; 6) Colher os pomos de ouro das Hespérides; 7) Caçar a Corsa de Cerínia, animal lendário com chifres de ouro e pés de bronze; 8) Capturar vivo o javali de Erimanto; 9) Matar, com setas envenenadas, no lago Estínfalo, os monstros cujas asas, cabeça e bico eram de ferro; 10) Levar o Touro de Creta vivo até Euristeus; 11) Entregar Diómedes, rei da Trácia, à voracidade de seus próprios cavalos, que vomitavam fogo; 12) Trazer do inferno o cão Cérbero, que guardava o mundo das profundezas. 

Ao que tudo indica, o herói conseguiu cumprir todas essas diversificadas, perigosas e estafantes tarefas. Mas poderiam elas encontrar algum paralelo em um esforço, digamos, de natureza artística? Como, por exemplo, tentar resumir toda história do teatro em um texto que resultasse em um espetáculo de pouco mais de uma hora? Bem, se alguém quiser conferir - e acho que todos devem conferir - é só comparecer ao Oi Futuro, onde está em cartaz "2.500 por hora", de autoria de Jacques Livchine e Hervée de Lafond. Monica Biel assina a tradução e adaptação do texto, e Moacir Chaves a direção da montagem, que tem elenco formado por Claudio Gabriel, Henrique Juliano, Júlia Marini, Joelson Medeiros e Monica Biel. 

Reunindo fragmentos de obras de Pirandello, Tchecov, Molière, Feydeau, Eurípedes, Brecht, Beckett, Goethe e Nelson Rodrigues, dentre outros, assim como reflexões de Artaud e João Caetano, o presente texto efetivamente oferece ao público uma visão abrangente de toda a história da dramaturgia. E como a adaptação e a direção encontraram um formato narrativo delicioso - os fragmentos das cenas são representados e eventualmente comentados de forma extremamente bem humorada, com os atores (todos eles excelentes) entrando e saindo dos personagens com notável agilidade e saborosas doses de cinismo - o resultado é uma divertida e criativa jornada de 25 séculos, que merece ser prestigiada de forma incondicional pelo público.

Na equipe técnica, destaco com o mesmo entusiasmo as contribuições de todos os profissionais envolvidos nesta curiosa e oportuna empreitada teatral - Miguel Mendes e Tomás Correia (direção musical e execução ao vivo), Inês Salgado (figurinos), Sergio Marimba (cenografia), Aurélio de Simoni (iluminação) e Marcio Newlands (boneco e direção de manipulação). E embora não tenha lido o original, cumpre destacar a fluência da tradução de Monica Biel, assim como seu impecável e parisiense sotaque em uma das cenas.

2.500 POR HORA - Texto de Jacques Livchine e Hervée de Lafond. Tradução e adaptação de Monica Biel. Direção de Moacir Chaves. Com Claudio Gabriel, Henrique Juliano, Júlia Marini, Joelson Medeiros e Monica Biel. Oi Futuro. Quinta a domingo, 20h. 









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