quinta-feira, 2 de julho de 2015

Teatro/CRÍTICA

"Laio & Crísipo"

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Belo texto ganha impecável montagem



Lionel Fischer



"O jovem Laio fugiu de Tebas - sua cidade natal, onde uma sangrenta disputa pelo trono torna sua vida perigosa - e foi acolhido pelo rei Pélops da Frígia, que o nomeou preceptor de seu herdeiro, o adolescente Crísipo. Mas a relação entre mestre e pupilo se transmuta em paixão. Perseguidos pelo rei - que amaldiçoa Laio - e pela sociedade, forjam um sequestro e se dirigem a Tebas, onde a situação política se tornara favorável a Laio, que ali reencontra a jovem Jocasta, prometida a ele como esposa. Sagrado rei, casa-se com Jocasta e mantêm a relação com Crísipo - e os três se envolvem em um ardente triângulo amoroso."

Extraído do ótimo release que me foi enviado pelas assessoras de imprensa Luciana Medeiros e Leila Grimming, o trecho acima explicita uma livre interpretação do mito de Laio, aqui materializada no espetáculo "Laio & Crísipo", que, juntamente com "Caranguejo Overdrive", comemora os dez anos de existência do grupo Aquela Cia. - o segundo espetáculo será analisado na crítica seguinte. Pedro Kosovski assina o texto e Marcos André Nunes a direção da montagem, em cartaz no Mezanino do Espaço Sesc. No elenco, Eron Cordeiro (Laio), Ravel Andrade (Crísipo) e Carolina Ferman (Jocasta). 

Como dito no parágrafo anterior, estamos aqui diante de uma livre interpretação do mito de Laio. Sendo assim, ao invés de discorrer sobre o que de fato se sabe sobre os personagens e em seguida tentar perceber em que medida foram recriados, contestados ou subvertidos, opto por também valer-me de total liberdade para falar sobre o que assisti, ou seja, como se estivesse diante de personagens sem qualquer referência anterior. 

Laio e Crísipo vivem uma relação vertiginosa que inclui ensinamentos (éticos, filosóficos e marciais), trocas, cumplicidade, desentendimentos, reconciliações e visceral atração física. Ou seja: existe entre ambos uma verdadeira paixão, com todos os ingredientes de lucidez e loucura a ela inerentes. E após se encontrarem com a jovem Jocasta - prostituta que faz strip-tease em um inferninho à beira de uma estrada - estabelece-se um virulento triângulo amoroso. 

Diante do exposto, cabe a pergunta: qual terá sido o real objetivo de Pedro Kosovski ao escrever "Laio & Crísipo"? Que diferença haveria se o presente texto não tivesse mitos como referência? Em minha opinião, nenhuma. Sim, pois com ou sem referências, o fundamental é que Kosovski escreveu um belo, instigante, libertário e contundente texto sobre a paixão, aqui materializada como irresistível pulsão de vida e essencial no que diz respeito à descoberta sobre si mesmo e sobre o outro. 

Com relação ao espetáculo, Marcos André Nunes impõe à cena a dinâmica característica da Aquela Cia.: marcas expressivas e diversificadas, invariavelmente surpreendentes, impecável domínio dos tempos rítmicos e uma visceral relação com a música, que praticamente se converte em um personagem. E no tocante ao elenco, Eron Cordeiro, Ravel Andrade e Carolina Ferman têm desempenhos irrepreensíveis, tanto do ponto de vista vocal como corporal. Além disso,  exibem uma contracena que só existe quando a confiança mútua é total, assim como no projeto em que estão engajados. A todos, portanto, parabenizo com o mesmo entusiasmo e agradeço a instigante noite que me proporcionaram.

Na equipe técnica, Felipe Storino responde por maravilhosa (como de hábito) direção musical, sendo igualmente irretocável sua contribuição como músico, ao lado de João Paulo. Marcia Rubin, com sua notável direção de movimento, é uma peça-chave no sucesso da presente empreitada teatral, o mesmo aplicando-se a Marcelo Marques (figurino), Aurora dos Campos (cenografia) e Renato Machado (iluminação) - este último, por sinal, cada vez mais se firma como um iluminador de ponta.

LAIO & CRÍSIPO - Texto de Pedro Kosovski. Direção de Marcos André Nunes. Com Eron Cordeiro, Ravel Andrade e Carolina Ferman. Sala Multiuso do Espaço Sesc. Quinta a sábado, 21h. Domingo, 20h.

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