sábado, 27 de junho de 2009

Bernard Shaw:
breves reflexões e piadas de um gênio

Quem estuda teatro - por curiosidade ou interesse aprofissional -sabe pefeitamente quem foi e o que escreveu Bernard Shaw(1856-1950). Portanto, não nos dedicaremos aqui a falar de sua produção teatral, mas exibir um pouco a curiosa, sarcástica e polêmica personalidade do autor irlandês, que desde os 20 anos passou a morar em Londres.

* * *

REFLEXÕES


Amizade - Trata o teu amigo como se um dia ele pudesse tornar-se teu inimigo, e teu inimigo como se pudesse um dia ser teu amigo.

Amor - Ao querermos ler sobre atos praticados por amor, aonde nos viramos? À seção dos assassínios. E lembremos o seguinte: não há amor mais sincero que o da comida.

Artistas - O verdadeiro artista prefere deixar a mulher morrer de forme, os filhos andarem descalços, a mãe septuagenária trabalhar para sustentá-lo, a trabalhar em qualquer coisa que não seja a sua arte.

Boa sociedade - Em nossos dias, homem de boa sociedade é quem tem bastante dinheiro para fazer o que fariam todos os tolos se pudessem, quer dizer, consumir sem produzir.

Burguesia - Um homem moderadamente honesto com uma esposa moderadamente fiel, sendo ambos bebedores moderados numa casa moderadamente saudável, eis o verdadeiro tipo da classe burguesa.

Casamento - O casamento é popular por combinar o máximo de tentações com o máximo de oportunidades. Cabe à mulher casar-se o mais cedo possível e ao homem ficar solteiro o mais tempo que pode.

Civizilação - A civilização é uma doença devida à prática de construir sociedades com materiais podres.

Confidências -
A minha maneira de brincar consiste em dizer a verdade. É a brincadeira mais divertida do mundo.
A minha especialidade é ter razão quando outros não a tem.
Não deveis supor, só por ser eu um homem de letras, que nunca tentei ganhar a vida honestamente.
Nunca fui um bom filho, ou um bom irmão ou um bom patriota, no sentido de pensar que minha mãe, minha irmã e minha terra natal eram melhores do que as outras pessoas só pelo fato de eu lhes pertencer.

Corte - A corte é a copa dos criados do soberano.

Crime - O crime é o varejo do atacadista que chamamos de lei penal.

Democracia - A nomeação de uma pequena minoria corrompida é substituída, na democracia, pela eleição por uma multidão incompetente.

Dever - Quando um tolo pratica um ato de que se envergonha, declara sempre que fez o seu dever.

Educação - Quando um homem ensina alguma coisa a outro que não tem aptidão para ela, e lhe dá um certificado de proficiência, este outro completou sua educação de gentleman.

Eficiência - Na verdade, só há duas qualidades no mundo: eficiência e ineficiência, e só duas espécies de gente: os eficientes e os ineficientes.

Egoísmo - Se quiseres ver como as pessoas são egoístas e como a cortesia usual é epidérmica, fazei uma viagem...Um transatlântico é quase tão terrível como o Palácio da Verdade.

Esperança - Quem nunca esperou não pode desesperar nunca.

Felicidade - Uma vida inteira de felicidade? Ninguém a aguentaria: seria o inferno na Terra. Não temos mais direito de consumir felicidade sem tê-la produzido do que consumir riquezas sem tê-las produzido.

Escravidão - A escravidão atingiu o seu ponto culminante em nossa época sob forma de trabalho assalariado.

Gentleman - Não é um homem, pelo menos não um homem comum - pois o homem comum não passa de um escravo que alimenta e veste o gentleman melhor que os demais.

Governo - Somos governados por uma administração pública que possui poder tão enorme a ponto de seus regulamentos tomarem o lugar das leis, embora muitos deles sejam feitos apenas no interesse dos funcionários sem a menor consideração pelos interesses até pelos direitos do público.

Humanidade - Nas artes da vida o homem nada inventa; nas da morte, porém, ultrapassa a própria Natureza e produz por meios químicos e mecânicos toda espécie de peste, fome e outros flagelos.

Imoralidade - Tudo o que contraria as maneiras e os hábitos estabelecidos é imoral...Todo avanço em matéria de pensamento e comportamento é imoral por definição, até que não tenha convertido a maioria.

Imprensa - A invenção da tipografia e a liberdade de imprensa trouxeram-nos não apenas o risco do seu emprego abusivo, mas também a instalação como parte de nossa rotina social de alguns dos piores males que podem atingir a humanidade.

Indiferença - O pior crime para com nossos semelhantes não é odiá-los, mas demonstrar-lhes indiferença: é a essência da desumanidade.

Infelicidade - Há duas tragédias na vida: uma, a de não alcançarmos o que o nosso coração deseja; a outra, de alcançá-lo.

Ingleses -
Os ingleses nunca hão de ser escravos: eles são livres de fazer tudo o que o Governo e a opinião pública lhes permitem fazer.

Um inglês pensa que é moral quando é apenas desagradável.

Não há nada tão ruim ou tão bom que não se encontre ingleses a praticá-lo; mas nunca se há de encontar um inglês que não tenha razão. Ele faz tudo por princípios. Combate-nos por princípios patrióticos; rouba-nos por princípios comerciais; escraviza-nos por princípios imperiais.

Jogo de xadrez - É um expediente tolo para fazer com que pessoas preguiçosas acreditem que estão fazendo algo muito inteligente, quando estão apenas perdendo tempo.

Justiça - Quando um homem quer matar um tigre, chama a isto de "esporte". Quando o tigre quer matá-lo, o homem dá a isto o nome de "ferocidade". A distinção entre crime e justiça não é maior.

Lar - O lar é a prisão da moça e o hospício da mulher.

Lisonjas - O que realmente lisonjeia uma pessoa é que a julguemos digna de ser lisonjeada.

Martírio - O martírio é a única maneira de ganhar fama sem ter competência.

Monarquia - A monarquia constitucional é um meio para combinar a inércia de um ídolo de madeira com a credibilidade de um ídolo de carne e sangue.

Monotonia - Um homem é como uma vitrola com meia dúzia de discos. Em pouco tempo, a gente se cansa deles, e, no entanto, tem que ficar à mesa enquanto ele os toca para cada novo visitante.

Mulheres - A mulher nos reduz a todos nós ao denominador comum. Quem deseja uma vida feliz com uma mulher bonita assemelha-se a quem quisesse saborear o gosto do vinho tendo a boca sempre cheia dele.

Normas de comportamento - Não faças aos outros o que queres que te façam; os gostos deles podem ser diferentes dos teus.

Patriotismo - Nunca tereis um mundo tranquilo enquanto não expurgardes o patriotismo da raça humana.

Perigo - Neste mundo sempre há perigo para aqueles que o temem.

Pessimismo - Sabeis o que é um pessimista? Um homem que julga os demais tão sórdidos como ele próprio e por isso os detesta.

Progresso - A idéia de que houve algum progresso desde a época de César (menos de 20 séculos) é absurda demais para entrar em discussão. Toda a selvageria, a barbárie, o obscurantismo e todo o resto de que nós guardamos lembrança, no passado, existe no presente momento.

A decadência não pode encontrar agentes senão quando põe a máscara do progresso.

O homem razoável adapta-se ao mundo; o desarrazoado insiste em tentar adaptar o mundo a si mesmo. Por isso, todo progresso depende do homem desarrazoado.

Propaganda - Uma coisa que ninguém acredita não pode ser provada bastante.

Religião -

Há apenas uma única religião, embora dela exista uma centena de variações.

As Igrejas têm que aprender a praticar a humildade tão bem quanto pregá-la.

Um milagre...é um acontecimento que produz fé.

Revolução - Revoluções não quebraram nunca o jugo da tirania; passaram-no, apenas, sobre outros ombros.

Sacrifício - O sacrifício de nós próprios permite-nos sacrificarmos sem vergonha dos outros.

Sociedade - A sociedade é baseada na intolerância.

Soldados - Nunca espero de um soldado que pense.

Temperança - Sou abstêmio de cerveja, não de champanhe.

Viagens - Não gosto de sentir-me em casa quando estou no estrangeiro.


PIADAS

Na livraria - Examinando certa vez os livros oferecidos num balcão de sebo a preços muitos reduzidos, o dramaturgo topou com um volume de peças suas. O livro estava dedicado a um amigo, sob cujo nome, lia-se: "Com os cumprientos de G.B. Shaw". Comprando o livro, ele acrescentou: "Com os cumprimentos renovados do mesmo" e mandou-o de volta a quem já o oferecera uma vez.

Cinema - Conta-se que o magnata do cinema Samuel Goldwyn implorou a autorização de Shaw para filmar Pigmalião.

- Pouco me importa perder dinheiro com o filme - declarou ele. - Interessa-me apenas trazer uma contribuição à arte.

- É esta a diferença entre nós, respondeu Shaw. - O senhor só pensa em arte e eu só penso em dinheiro.

Isadora Duncan - segundo uma lenda, Isadora Duncan teria fervorosamente insistido com Shaw para que, em homenagem aos princípios da eugenia, tivesse um filho com ela.

- Imagine - teria dito ela - que criança essa, tendo o meu corpo e o seu cérebro.

Shaw rejeitou a proposta com este argumento:

- Imagine, porém, que infelicidade se ela tivesse o meu corpo e o cérebro da senhora.

Respondendo a inquéritos

Suas leituras preferidas?

Shaw - Só as minhas proprias, e com admiração cada vez maior.

Seus hobbies?

Shaw - Tudo, menos esportes.

Trocas famosas de telegramas e cartas

Telegrama de Shaw convidando Winston Churchill a uma de suas "premières":

Reservei-lhe dois ingressos para minha primeira representação. Venha e traga um amigo, se o tiver.

Resposta de Churchill:

Impossível assistir primeira representação. Assistirei a segunda, se a tiver.

Telegrama do Theatre Guild a Shaw pedindo-lhe que encurte "Santa Joana":

Favor alterar quarto ato de "Santa Joana" para que espectadores suburbanos possam pegar o último trem.

Resposta de Shaw:

Alterem horário trens.

Telegrama da atriz americana Cornelia Otis Skiner a Shaw pedindo-lhe o papel principal de "Cândida":

Cornélia - Posso representar "Cândida"?
Shaw - Formidável!
Cornélia - Elogios imerecidos.
Shaw - Referi-me à peça.
Cornélia - Eu também.

Convite - Certo dia o escritor recebeu de uma senhora da sociedade, conhecida esnobe e caçadora de celebridades, um convite assim redigido:

Lady X estará em casa na terça-feira das quatro às seis da tarde.

Shaw devolveu o cartão, tendo acrescentado estas palavras:

Mr. Bernard Shaw também.
__________________________________
Texto extraído do livro "Socialismo para milionários", de George Bernad Shaw. Tradução de Paulo Rónai.

Nenhum comentário:

Postar um comentário