segunda-feira, 15 de junho de 2009

Teatro/CRÍTICA

"Festa em família"

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Trágico ajuste de contas


Lionel Fischer


Ao contrário do que ocorre normalmente, a peça "Festa de família", de David Eldrige, é uma adaptação do filme homônimo de Thomas Vinterberg, premiado com a Palma de Ouro em Cannes, em 1998. Ambientado na casa de campo do patriarca de uma abastada família dinamarquesa, o texto gira em torno da comemoração dos 60 anos do dito patriarca, que ali reúne parentes e amigos imaginando, certamente, que sua festa de aniversário transcorreria de forma tranquila e impregnada de felicidade. No entanto, a partir do momento em que vêm à tona revelações tão inesperadas quanto chocantes, o encontro se converte em uma espécie de trágico ajuste de contas.

Eis, em resumo, o enredo de "Festa de família", em cartaz no Teatro III do CCBB. Bruce Gomlevski assina sua primeira direção teatral e também divide o palco com Julia Carrera, Walney Costa, Otto Jr., Risa Landau, Teresa Foumier, Joelson Gusson, Peter Boos, Christovam Netto, Carolina Chalita, Ricardo Damasceno, Leonardo Corajo, Carlos Veiga e Júlia Limp Lima. O presente espetáculo marca o início das atividades de Cia. de Repertório Teatro Esplendor.

Como não assistimimos ao filme, só podemos analisar a peça em si. E ela contém muitos méritos, sem dúvida, dentre eles o de abordar um tema atualíssimo, embora sempre escamoteado - o incesto - e propor um olhar crítico sobre as relações familiares, em geral marcadas pela hipocrisia, recurso que visa impedir que verdades indesejadas venham à tona. Afora isso, o autor cria personagens fortes e diferenciados, quase todos portadores de graves neuroses.

No entanto, acreditamos que o dramaturgo, depois de haver explicitado o tema principal, leva um tempo excessivo para materializar na cena seus desdobramentos e consequências, adiando em demasia as inadiáveis ações que se fariam necessárias após a inusitada revelação.

Quanto ao espetáculo, Bruce Gomlevski impõe à cena uma dinâmica em total sintonia com o texto, que nos parece exigir pausas prolongadas, silêncios constrangedores e eventuais momentos de violência. Cabe ainda registrar a ótima proposta de fazer com que os espectadores, de certa aneira, participem da cena, já que nas mesas do banquete existem lugares disponíveis para a platéia. Tal ideia nos parece bastante pertinente: não só aproximar os espectadores do contexto, mas também deixar implícito que a realidade da cena pode também refletir a realidade dos que assistem ao espetáculo.

Com relação ao numeroso elenco, todos os profissionais que estão em cena exibem performances seguras e convincentes, todos se entregando sem reservas e com total paixão aos complexos e doentios personagens que interpretam. Ainda assim, destacamos as atuações de Bruce Gomlevski (Christian, o que deflagra todos os conflitos), Julia Carrera (Helene, irmã de Christian), Otto Jr. (Michael, irmão de Christian e Helene), Walney Costa (Helge, o patriarca) e Joelson Gusson (Poul).

Na equipe técnica, Maneco Quinderé assina uma iluminação sóbria e expressiva, o mesmo ocorrendo com os figurinos de Flávio Souza. Bel Lobo responde por uma cenografia bastante criativa, com a única ressalva de um pequeno tablado que fica ao centro e torna um tanto confusas algumas cenas fora do banquete. Marcelo Alonso Neves cria uma trilha sonora eficiente, sendo de ótimo nível a tradução de José Almino.

FESTA DE FAMÍLIA - Texto de David Eldrige. Direção de Bruce Gomlevski. Com Bruce Golevski, Julia Carrera e outros. Teatro III do CCBB. Quarta a sexta, 20h. Sábado e domingo, 19h30

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